Diversão e Arte

A alma que flutua

Companhia Alaya Dança celebra 30 anos com performance que combina exposição e coreografias inspiradas na produção do grupo

postado em 05/10/2019 04:15
Imagens da trajetória do Alaya, com registros de ensaios e espetáculos, fazem parte da performance


Quando Lenora Lobo chegou em Brasília, em 1986, era mais procurada por atores do que por bailarinos. Com formação em dança e arquitetura, a piauiense de Floriano começava a desenvolver um método próprio de preparo que servia tanto ao mundo das cênicas, quanto ao do movimento. Nos anos 1990, ingressou passou a dar aulas na Universidade de Brasília (UnB) e começou a aprimorar o método em duas vertentes: a da formação acadêmica e a da experiência de palco.

Assim nascia o Alaya Dança, uma das companhias contemporâneas mais antigas da cidade, cujas três décadas de existência são celebradas a partir de amanhã com a performance Imagens poéticas, exposição performance ; Alaya Dança 30 anos. A intervenção ocupa o Centro de Dança até 13 de outubro e traz uma mistura de exposição com atuação performática.

Além de fotografias, o público poderá conhecer a trajetória do Alaya por meio de figurinos, cenários e vídeos, mas também terá uma amostra da produção ao vivo da companhia. Para tocar a direção cênica e coreográfica da performance, Lenora convidou Andrea Horta. Um grupo de nove bailarinos revisitou seis produções criadas ao longo dos últimos 30 anos para buscar inspiração. Daí nasceram as performances que o público vai encontrar pelas salas, corredores e jardins do Centro de Dança. ;Convidei a Andrea porque a maioria das obras eram minhas e eu queria deixá-los livres para criarem o que quisessem a partir do que viam da obra. Se estivesse na direção, poderia induzir o que já existe, então a Andrea ocupou esse lugar. É uma coreógrafa muito sensível e talentosa;, explica Lenora, que assina a direção artística do projeto como um todo.

Poema

As coreógrafas elencaram seis espetáculos ; Esquinas, Matracar, Primata terra, ...E sonha Lobato, Máscaras, Água ; para que os dançarinos assistissem e se inspirassem. A partir dos registros, Andrea escreveu um poema que guiou o trabalho da companhia. Os versos falam do encantamento pela cultura popular, material que sempre motivou Lenora. ;O Alaya tem uma coisa muito colorida, festeira, alegre, leve. E o nome Alaya quer dizer sublime. Tem várias traduções e, no árabe, tem a ver com alma;, explica Andrea. ;E a companhia trabalha também com essa mistura de profano com o sagrado, com uma ideia de evolução do corpo que vem desde o lagarto, que evolui, se torna ser humano, na posição ereta, e vem essa visão de que cria asas e voa. Esse ser humano que pode, daqui a pouco, estar levitando. É essa a ideia do roteiro.;

Durante as performances, Andrea também decidiu utilizar as trilhas sonoras dos espetáculos realizados pela companhia e, em uma delas, o dançarino João Negreiros, morto em 2012 e nome emblemático do Alaya, recita um trecho de um mito sobre as nascentes das águas. ;Seres lagartos que criam asas, alcançam o voo, eternamente apaixonados pelas águas da lua;, diz o áudio com a voz de Negreiros. ;No final, o roteiro foi todo organizado e está bem atual, porque a questão maior ambiental, hoje, é a água. É muito poético;, garante Andrea.



Método

Lenora Lobo criou o Alaya Dança no final da década de 1980 e início dos anos 1990 para implantar um método próprio, o teatro do movimento, que acabou por gerar dois livros e tornar a coreógrafa uma referência. Especializada em dança no Laban Center, de Londres, ela decidiu combinar o método inglês com outro desenvolvido pelo brasileiro Klauss Vianna, de quem foi assistente. Dessa combinação veio a multilinguagem que hoje está por toda parte na produção do Alaya. ;Meu background é todo em dança, mas desde o início sempre tive ligação com as artes plásticas, com as cênicas, assim como com a música. E sempre tive essa vontade de diversificar a linguagem da dança;, conta. No método criado por Lenora e descrito nos livros Teatro do movimento ; Um método para o intérprete-criador e A arte da composição, em parceria com Cássia Navas, ator e dançarino ficam instrumentalizados para criar suas próprias danças. ;É um método que se opõe, não a treinar, mas dá condições do bailarino-ator escolher seu caminho com autocrítica, investigação e consciência corporal;, pontua.

Da década de 1990 para cá, o Alaya Dança realizou 12 espetáculos, sendo nove com direção de Lenora e os outros dirigidos por convidados. A quantidade de integrantes da companhia variou, ao longo dos anos, entre seis e 12, uma oscilação resultante da disponibilidade dos dançarinos e da existência de apoio e patrocínio para projetos específicos.

Como o Alaya não tem uma ajuda financeira constante, Lenora criou o núcleo de pesquisa, responsável pela disseminação do teatro do movimento e por sete edições das mostras de intérpretes criadores, durante as quais convida criadores do país inteiro. Imagens poéticas, exposição performance ; Alaya Dança 30 anos foi contemplado no edital de manutenção do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) com um total de R$ 240 mil para ser aplicado em dois anos.

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