Diversão e Arte

Exposições em cartaz na cidade relacionam expressões e espaços públicos

Saiba mais sobre 'Arte para uma cidade sensível' e 'Teoria dos conjuntos'

ROBERTA PINHEIRO
Roberta Pinheiro
postado em 27/10/2019 06:02
Fotos do carioca Bruno Veiga em cartaz na Caixa Cultural até 15 de dezembro
A obra de arte se relaciona com o público de uma maneira que extrapola, muitas vezes, a racionalidade. Contudo, mesmo atuando pelas percepções e sensações, as expressões artísticas também são políticas e revelam questões sociais e individuais; perfis coletivos e peculiaridades individuais; e se relacionam, direta ou indiretamente, com o espaço que ocupam. ;A nossa sensibilidade é construída socialmente e politicamente e a arte atua nessa produção da sensibilidade urbana. Não são lugares só de passagem, de relações de pertencimento, de questões políticas e sociais, é simbólica;, afirma a curadora e artista Brígida Campbell.

Depois de uma pesquisa de doutorado que investiga a arte nos espaços públicos, Brígida apresenta em Brasília, no Centro Cultural TCU, um recorte de trabalhos de artistas e coletivos na exposição Arte para uma cidade sensível. Nome também de uma publicação sobre o assunto feita pela curadora. Da mesma forma, o fotógrafo carioca Bruno Veiga evidencia, em meio a padrões arquitetônicos do subúrbio de Budapeste, ocupações e expressões da individualidade humana na mostra Teoria dos conjuntos, em cartaz na Caixa Cultural.

[SAIBAMAIS]Entre fotografias, vídeos, cartazes e instalações, Brígida selecionou um conjunto rico e diverso da produção artística contemporânea com nomes reconhecidos, inclusive, em premiações. Berna Reale, Grupo Empreza, Opavivará, Paulo Nazareth, Breno Silva e Louise Ganz e Ronald Duarte são alguns dos integrantes da exposição. ;Comecei a questionar como a arte faz parte do fluxo da cidade e vai atuando nesses espaços simbólicos e nas diferentes realidades do Brasil. Como em cada cidade, como os artistas estão pensando e reagindo de maneiras distintas;, detalha. São obras de Belém, São Paulo, Belo Horizonte, Goiânia, Salvador e Brasília, por exemplo, representada pela poesia urbana do Coletivo Transverso.

A partir da estética e da proposta artística de cada um, os trabalhos dialogam com o contexto dos espaços que ocupam e reverberam, de algum modo, ali. ;Mais do que só fazer o trabalho no espaço público, como uma escultura que foi colocada em uma praça, por exemplo, é pensar ações que aconteçam pelo espaço e para o espaço, que englobem as dimensões de vivência na cidade, os modos de vida e as culturas urbanas. É pensar a cidade de uma maneira bem ampla;, diferencia a curadora. Analisando as obras expostas, é possível perceber como cada um entende, percebe e, principalmente, imprime sob um filme de fotografia, um vídeo ou uma instalação o ambiente.

Para exemplificar, ela cita o trabalho Cozinhas temporárias, feito por Louise Ganz e Ines Linke, a dupla Thislandyourland, a partir do mapeamento de comidas de quintal. A proposta coloca em debate o acesso à terra e aos meios de produção e distribuição dos alimentos, tanto no contexto urbano quanto rural. ;É um trabalho simples, mas que fala da vida em comunidade, da dependência ao sistema de distribuição de comida. Uma ação poética e simples, mas que traz várias questões sobre como vivemos na cidade e como o artista pode, por meio do seu trabalho, provocar essas discussões;, conclui.

Teoria dos conjuntos

[FOTO1]

A relação do carioca Bruno Veiga com a rua, os contextos urbanos e a vida que cruza semáforos é longa. Tudo começou em 1984 quando atuou como fotojornalista para jornais como O Globo e Jornal do Brasil. Ao transpor as lentes para um viés mais artístico, anos depois, Veiga não perdeu o exercício de olhar a realidade. ;Não é a forma como estou fotografando, mas o que estou fotografando, observando. Como repórter, fotógrafo, a gente entra na casa das pessoas muitas vezes por semana, isso é uma sorte. Nunca me desvinculei nem quero me desvincular da fotografia documental, do fotojornalismo, me formou, sou fruto disso. Então, saio andando, buscando o que fotografar. Tenho apenas uma vaga ideia de algum tema que me interessa;, conta.

Depois de percorrer os subúrbios da capital carioca, revelando nas imagens a religiosidade, o colorido e a singularidade de casas desconhecidas pelo público, Veiga dedicou-se a descobrir, entre tantos padrões, a delicadeza da vida humana. O fotógrafo estava em Budapeste, na Hungria, e encontrou na periferia da cidade conjuntos habitacionais populares construídos em meados do século 20. ;A partir dali, me chamou a atenção naqueles prédios enormes, naquela proposta de arquitetura padronizada, muito árida, a expressão da diferença, da individualidade, da identidade. Coisas que são características humanas e necessidades que temos de mostrar quem somos;, relembra.

Em cada clique, é como se o fotógrafo congelasse o retrato de uma família ou de uma pessoa. A relação com a natureza, os objetos de decoração, as fotografias ao lado das xícaras. Mesmo quando retrata as portarias, Veiga mostra a relação daquelas pessoas com ambientes até então padronizados. Tem vida em cada foto. ;As pessoas pensam que a expressão artística é um privilégio dos artistas. Os artistas apenas fazem disso uma profissão. Expressar o que você sente, o que você gosta, a sua hierarquia de valores éticos ou estéticos é inerente de todo ser humano;, afirma.

Com curadoria de Eder Chiodetto, a exposição Teoria dos conjuntos apresenta 32 fotos, sendo alguns múltiplos, montadas em formatos e suportes variados. Para Veiga, além da manifestação individual, ao trazer para uma galeria de arte as expressões encontradas em um subúrbio, ele reconhece os valores estéticos ali presentes. ;Não é que todas as casas da periferia são iguais, mas existem características que se reproduzem em função de educação, de possibilidades econômicas. Perceber isso é importante, é sutil, é muito delicado;, pontua. Por fim, ele destaca que alguns olhares podem parecer banais, sobretudo, para aqueles em busca da luz perfeita e da fotografia incrível. ;Depois de algum tempo, você começa a cansar disso e passa a buscar a essência das coisas. Quer desconstruir, limpar a coisa acrobática da foto. Faz muito sentido no conjunto;, finaliza.

Arte para uma cidade sensível
Curadoria de Brígida Campbell. No Centro Cultural TCU. Visitação até 14 de dezembro. De segunda à sexta, das 9h às 19h, e sábados, das 10h às 18h. Entrada gratuita.

Teoria dos conjuntos
Do fotógrafo Bruno Veiga com curadoria de Eder Chiodetto. Na Caixa Cultural. Visitação até 15 de dezembro. De terça a domingo, das 9h às 21h. Entrada gratuita.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação