postado em 30/10/2019 07:00
O diálogo da arte com o tempo presente, com a cidade e com o público. No decorrer desta semana, três exposições abrem as portas na capital federal com obras que dialogam com o contexto físico, o geográfico e o político-social. São esculturas, instalações, vídeos, performances, entre outras linguagens. Em todos os casos, contudo, o visitante é convidado a interagir, a refletir e a questionar vivências, cotidianos, controles. Confira:
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O suave peso modernista
O resultado poético, dinâmico, caótico e intenso do encontro de um artista holandês com a cidade das linhas modernas e dos espaços vazios. Depois de um período de residência artística, André Kruysen apresenta um conjunto de obras tridimensionais, entre esculturas, instalações e um site específico, um trabalho criado de acordo com um espaço determinado, na Galeria Karla Osório. Com abertura marcada para esta quarta-feira (30/10), às 18h30, a exposição conta com o apoio da Embaixada dos Países Baixos no Brasil. ;O André visitou pontos turísticos e buscou entender a cidade modernista (Brasília), o impacto urbanístico e da arquitetura em si;, descreve a curadora Malu Serafim.
O holandês carrega consigo um traço artístico moderno e futurista. Em seus trabalhos, na maioria em gesso e madeira, traz a formalidade da escola modernista com a forma geométrica bem estruturada. Entretanto, apesar de revisitar a tradição arquitetônica e construir uma linguagem que retorna ao espaço, rompendo-o e o reorganizando, Kruysen deixa evidente texturas e fragmentos. ;Ele deixa presente a marca da mão dele, então, tem o silêncio modernista, mas o caos está ali, é uma dicotomia em quase todas as esculturas;, analisa a curadora.
Malu também destaca o domínio do uso da luz pelo artista que, alinhado à configuração das formas, confere movimento às esculturas. ;Isso exige que o espectador esteja em ação, em movimento;, completa. O período de residência também permitiu que o artista anexasse aos corpos híbridos peças antigas de um Fusca, um carro que representa a identidade da cidade e o período em que Brasília nasceu. ;O vazio da cidade chocou muito o André. Então, pensamos a expografia muito a partir disso também. Assim como Brasília, as obras precisam de um espaço visual para serem compreendidas e vistas;, conclui a curadora.
O efêmero registrado
;São ações que geram incômodo, para fazer com que as pessoas tenham outras sensações, outros conceitos, outros significantes das coisas. É mostrar os outros lados do quadrado e não só um plano de visão sobre o mundo;, assim descreve a artista, produtora, performer, fotógrafa e videomaker Natasha de Albuquerque, sobre a exposição Poéticas do absurdo. A mostra será aberta nesta quinta-feira (31/10) na galeria A Pilastra, a partir das 19h, e reúne a produção individual da artista dos últimos 10 anos e funciona como uma espécie de memória dos trabalhos.
;Durante todo esse tempo, pesquisei performances e composições urbanas e elas têm um aspecto efêmero, então a exposição vai materializar e registrar essa produção;, comenta. Natasha se debruça sobre assuntos do cotidiano e, sobretudo, questões contemporâneas e gera trabalhos provocativos e aguçados, no sentido de despertar o público para pensamentos outros, ;corporeidades outras, cotidianos outros;, como gosta de definir a artista. Ao todo, ela apresenta mais de 20 obras, a maioria inédita.
;Vou trabalhando a minha sensação de perplexidade para ver até que ponto as pessoas ficam perplexas também. É interessante que as pessoas venham para tornar esses trabalhos vivências delas. Muitas obras pedem a participação do público, além de a galeria ser um espaço diferente do espaço comum de museu. Aqui é próprio para que o espectador saia do lugar confortável para ter outras vivências;, detalha.
Para Natasha, compreender a arte é também se deixar levar pelas sensações e pelo sentido das coisas. ;Vejo o mundo como um grande absurdo. A sensação de perplexo que meu trabalho gera, das pessoas perderem o chão, isso vai de encontro, principalmente, com o conceito de arte. A maioria das pessoas quer que a arte tenha um sentido muito fechado e, na minha opinião, a arte multiplica e abre os sentidos, e até a falta de sentido faz parte do processo, tanto o processo de criação como o processo de reflexão;, conclui. Na avaliação do curador da exposição, Mateus Lucena, mesmo sendo um apanhado dos 10 anos de produção da artista, a mostra dialoga com o tempo presente, e acontecimentos fizeram com que o corpo de trabalho em exposição ganhasse potência.
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Endurance
Enquanto sir Ernest Henry Shackleton liderou explorações à Antártida, o brasiliense Milton Marques usa a linguagem artística para explorar invenções, maquinários e vídeos. Neste sábado (2/11), depois de alguns anos sem apresentar um trabalho inédito na capital, ele abre a exposição Endurance, na Alfinete Galeria, a partir das 19h. Mesmo tendo usado como inspiração a história de Shackleton, o trabalho de Marques não é sobre o navio do aventureiro britânico. ;Usei a ideia de um quebra-gelo para produzir uma instalação e uma projeção. Meus trabalhos são feitos a partir de máquinas desmontadas, rejeitos de eletrônicos, e acabei batizando esse de Endurance;, detalha o artista.
Brincando com o título e com o que acontece na obra, o artista desenvolve ideias de construção e desconstrução, além do limiar entre os dois conceitos. ;No caso desta obra, há uma repetição infinita de uma ação, mas a cada segundo de funcionamento vemos também o surgimento de formas e sombras que não se repetem;, comenta Marques. Com uma linha minimalista de construção, o artista propõe um questionamento das situações de controle. ;Acho que a obra faz uso de uma realidade que remete as incertezas do nosso tempo. Se isso acontece em um experimento simples e controlado, imagina no mundo real. Vivemos buscando soluções e gerando expectativas para afirmar o que às vezes nem nos representa. Muito fácil adotar referências que não levam a lugar algum;, afirma.
Escultura ama modernismo
; Do artista holandês André Kruysen com curadoria de Malu Serafim. Abertura nesta quarta-feira (30/10) a partir das 18h30 na Galeria Karla Osório. Visitação até 6 de dezembro. De segunda a sexta-feira, das 9h às 18h30, e sábado, das 10h às 14h, com horário agendado.
Poéticas do absurdo
; De Natasha de Albuquerque. Abertura nesta quinta-feira, 31 de outubro, a partir das 19h na Galeria A Pilastra. Visitação até 31 de dezembro. De quinta a sábado, das 15h às 21h, e domingo, das 14h às 18h. Não recomendado para menores de 18 anos.
; Happening Relação erótica com as coisas, amanhã, às 19h. Não recomendado para menores de 18 anos.
; Performance Se eu quiser chocar eu choco, 30 de novembro, a partir das 19h. Não recomendado para menores de 18 anos.
Endurance
; De Milton Marques. Abertura sábado, 2 de novembro, a partir das 19h na Alfinete Galeria.