Macau (China) — O ponto alto dos festejos dos 20 anos da devolução de Macau, ex-colônia portuguesa, à China, aconteceu em fins de dezembro passado, com a presença do presidente Xi Jinping. O líder chinês está na cidade para dar posse ao novo governo do território, que por mais de 400 anos esteve sob a administração de Portugal. Mas o calendário de atividades comemorativas, inaugurado em fevereiro de 2019 com a parada do Ano do Porco chinês, se estenderá por todo o ano de 2020. Uma das mentes por trás das celebrações é Maria Helena de Senna Fernandes, diretora da Secretaria de Turismo de Macau, uma das Regiões Administrativas Especiais da China — a outra é Hong Kong.
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Filha do escritor Henrique de Senna Fernandes (1923-2010), descendente de uma das mais tradicionais famílias sino-portuguesas de Macau, Maria Helena é formada em marketing e está na administração pública há 20 anos. Há 13 anos à frente do departamento de turismo, ela tem implementado ações com o objetivo de diversificar as indústrias criativas do território, tradicionalmente conhecido como a capital do jogo na Ásia. Uma delas foi a criação, há quatro anos, do Festival Internacional de Cinema e Prêmios (IFFAM), parte mais midiática da iniciativa de criação de um polo cinematográfico. Na entrevista a seguir, Maria Helena faz um balanço das conquistas das primeiras duas décadas de transição de Macau, e de como a instabilidade política na vizinha Hong Kong está afetando o turismo local.
Entrevista // Maria Helena de Senna
O que a senhora pode antecipar sobre o calendário de atividades comemorativas do aniversário de 20 anos de transição de Macau?
Na verdade, os festejos começaram no início do ano, em fevereiro com a parada de celebração do Ano do Porco, no calendário chinês. Essas atividades se intensificaram coma proximidade da data de aniversário (20 de dezembro), e continuarão ao longo de 2020. Teremos eventos especiais todos os meses, ligados à cultura, turismo ou esporte. Macau é um lugar pequeno. Você pode vir uma vez e conhecer as ruínas da catedral de São Paulo; na sequência, a parte antiga da cidade, e assim por diante. Temos que criar atrações novas, atividades diferentes, para que os turistas continuem voltando.
Que tipo de avaliação a senhora faz dessas duas décadas de transição?
Como região administrativa especial, gozamos do privilégio de contar com um bom apoio do governo central chinês e, ao mesmo tempo, podermos desenvolver projetos de forma independente, sem interferência direta de Pequim. Temos tirado proveito dessa política administrativa conhecida como “um país, dois sistemas” . Você pode enterder isso melhor com o nosso festival de cinema: podemos trazer pessoas, projetos e exibir filmes com temas que dificilmente conseguiriam exposição na China continental. Isso nos dá muita energia aqui em Macau. Também temos uma mistura muito boa de talentos locais e internacionais, e é isso que nos dá oportunidade de servir como plataforma para diferentes culturas e povos.
Quais seriam as principais conquistas desses 20 anos?
Uau, foram muitas, apesar de nossas dimensões diminutas. Uma das grandes realizações foi o reconhecimento, pela UNESCO, do centro histórico da cidade como patrimônio universal da humanidade, em 2005. Macau também foi reconhecida pelo mesmo órgão da ONU como um importante polo criativo gastronômico, por sua combinação única da culinária portuguesa e chinesa. Nossa principal fonte de renda ainda são os cassinos. Mas é essa receita que tem nos permitido investir em infraestrutura turística, como hotéis, e em outras opções de entretenimento não necessariamente ligadas ao jogo, como casas de espetáculos, parques temáticos e centros de compras. Ano que vem teremos várias atrações chegando, como o show Kung Fu Panda.
Os investimentos em Macau como polo cinematográfico são parte dessa diversificação?
Com certeza. O festival de cinema, criado em 2016, é a parte mais midiática desse esforço. Temos direcionado fundos para companhias e talentos locais a encontrar parceiros e colaboradores no exterior. Também temos criado condições para que projetos locais e estrangeiros usem Macau como locação. O festival tem ajudado muito nesse sentido, como plataforma de encontros e trocas de experiências e olhares.
De que forma a proximidade com Hong Kong tem afetado Macau?
Uma olhada mais atenta nos números indicam um leve queda na queda de visitantes, principalmente estrangeiros, não chineses, a partir de agosto, quando os protestos em Hong Kong se intensificaram. O aeroporto internacional de Hong Kong ainda é o principal ponto de chegada de turistas estrangeiros para Macau — o trajeto de barca entre os dois pontos leva cerca de uma hora. Muita gente que vem a Hong Kong acaba visitando Macau. Muitas conferências e eventos internacionais foram cancelados lá nesse período, o que acaba afetando a gente também. E reconstruir essa confiança do turista demanda um certo tempo, especialmente quando vemos turistas alertando outras pessoas a pensarem duas vezes antes de escolher Hong Kong como destino nesse momento. Muitas excursões entre Macau e Hong Kong foram canceladas.
Como contornar ou amenizar os impactos dessa situação?
Acreditamos que onde há crises há também grandes oportunidades. Os transtornos gerados por nossa dependência de Hong Kong nos deu um empurrão para começarmos a desenvolver novos produtos e atrações combinados com outros destinos na área, além da outra região administrativa especial. Por que não ir a outro lugar na China continental ao invés de Hong Kong? Estamos em contato com setores da indústria local tentando desenvolver novos projetos e parcerias nesse sentido.
Qual o papel do aeroporto internacional de Macau nesses planos?
Ele ainda está capacitado para receber especialmente voos da China e de países da Ásia, como Japão e Coreia. Mas há aeroportos internacionais próximos, na China, que já recebem voos da Europa e outros continentes, com os de Guangzhou e o de Shenzhen, na província de Guangdon. Estamos estudando a possibilidade de criar rotas de turismo entre Macau e esses importantes pontos de entrada na China. O turista pode vir de Shenzhen para cá de barca ou de carro. O percurso entre Guangzhou e Macau, de carro, é de duas horas. Há novas estradas em construção entre Macau e esses pontos importantes e movimentados pontos de entrada, ao norte do território.
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