Correio Braziliense
postado em 09/01/2020 04:17
Numa contagem, por alto, as notáveis mulheres descritas no clássico texto de Louisa May Alcott — já com três versões para cinema, todas derivadas de trama literária publicada em 1868 (sob o título Mulherzinhas) — seriam quatro. Mas, na telona, com o novo filme de Greta Gerwig, Adoráveis mulheres, o peso das personagens centrais, que compõem um grupo liderado por Jo (a ótima Saoirse Ronan), há multiplicação de visibilidade para um bem conduzido grupo de atrizes. Para além das figuras que rondam a protagonista Jo, as irmãs Meg (Emma Watson), Amy (Florence Pugh) e Beth (Eliza Scanlen) convivem ainda com Mãezinha (uma personagem agregadora, a cargo de Laura Dern) e Tia March (a afiada Meryl Streep). O longa traceja a vida sentimental e prática de todas essas mulheres.
Imprimir felicidade, diante das dificuldades da vida pessoal e da conjuntura de um país como os Estados Unidos ainda em recuperação pelos estragos da Guerra de Secessão, foi uma proposta de Louisa May Alcott, ao escrever o livro. No cinema, as personagens aparecem agitadas, curtem prazeres como o da dança (com muita expressão física e cênica), e, claro, independem de homens, para o alcance de plenitude. Juntas, as moças prezam a sororidade, debatem valores como nobreza e altivez e dispensam elogios masculinos.
Num mundo que explora riqueza de detalhes, como o dos efeitos de uma donzela torcer um tornozelo, o luxo do uso de carruagens e os vistosos vestidos de festa, algumas das figuras objetivam o “próprio caminho no mundo”, desviando do corriqueiro (à época) atalho dos casamentos de conveniência. Diretora à frente de Lady Bird: A hora de voar (um dos filmes mais valorizados por crítica e público, em 2017), Greta Gerwig teve êxito em alternar conquistas e representar o espírito comunitário das irmãs, que empreendem gestos nobres, mas, igualmente, sabem inflamar a rivalidade entre si. Aspirante a escritora, Jo fará muito para desviar dos destinos apregoados pelo futuro editor dela, que acredita que um bom romance deve trazer, ao final, uma heroína protagonista “morta ou casada”.
Numa pensão novaiorquina, Jo terá contato com uma realidade muito diversificada em relação ao de sua criação interiorana. Na cidade grande, ficará envaidecida pelos galanteios de figuras como a do professor Friedrich Bhaer (o astro do cinema francês Louis Garrel). Pouco a pouco, ela vai acumulando as experiências, como testemunha, do destino das irmãs. Nada moderada, Amy vai peitar alguns desafetos, com rompantes (elencando defeitos de homens “preguiçosos, falhos e vaidosos”); Meg sofrerá os efeitos de ver suas origens nunca à altura dos circuitos sociais que almeja, e Beth, de espírito sonhador e interessada na música, verá “a maré baixando”, dada a naturalidade com a qual protagoniza a falta de ânimo ocasionada por doença terminal.
A gênese
Com muita alternância temporal, o enredo de Adoráveis mulheres descreve bem mais do que a espera de uma família (feminina) dependente do retorno de um arrimo de família (papel de Bob Odenkirk); mas é ele, o pai, quem conta, em carta (por estar envolvido nos conflitos bélicos dos EUA), da expectativa de seu retorno, a fim de reencontrar as “adoráveis mulheres” do título. Sem explorar componentes de sexo na trama, a produção não negligencia a participação dos personagens masculinos. Ator consagrado por Me chame pelo seu nome, Timothée Chalamet interpreta Laurie, um provocativo rapazote, que flana entre o quarteto de moças. Isolados, em um mundo à parte, Laurie e Jo embarcam em lúdicos jogos teatrais, encenando um ensaio para a passagem à vida adulta.
A produção foi rodada (de fato) na cidade natal da autora Louisa May Alcott, em Concord (Massachusetts) e inclui um retrocesso temporal de sete anos na trama, fundamental para o desenvolvimento do filme. É do miolo deste período — ainda bem antes das rejeições amorosas prontas a movimentarem muitas ramificações do longa criado por Greta Gerwig — no qual serão instituídas novas oportunidades de vida para as personagens femininas, que os desafios vão mobilizar e modificar a realidade das personagens donas de um magnetismo universal.
Caridosas, mesmo cientes das próprias limitações financeiras, as moças da família prometem perseverar e mudar o mundo, numa escalada bastante significativa. Vale a lembrança de que, entre outros feitos, Mulherzinhas alcançou a oitava posição, entre os melhores livros norte-americanos, em votação da influente entidade The Great American Read.
Outras estreias
Retrato de uma jovem em chamas
Filme de enorme impacto na crítica, traz a assinatura da francesa Céline Sciamma (autora ainda do roteiro, premiado como o melhor no Festival de Cannes). Indicado ao Globo de Ouro e ao Bafta (de melhor produção estrangeira), o filme traz a história de duas mulheres que lutam contra convenções sociais impostas no século 18. Marianne, uma artista, se aproximará da inexperiente e sufocada Héloïse, prestes a se casar por mera convenção. As estrelas da fita são Adèle Haenel e Noémie Merlant.
Kursk: A última missão
Retrato de um drama da vida real ocorrido em 2000 com um submarino da marinha russa. No mar de Barent, um grande grupo de homens fica à deriva enquanto familiares atuam a favor do resgate, entre politicagem e tramoias internacionais. Sob a direção de Thomas Vinterberg, os atores centrais são Colin Firth, Léa Seydoux e Matthias Schoenaerts.
Ameaça profunda
Para além do oxigênio limitado, em meio à ação no fundo do mar, um grupo de pesquisadores marinhos encara outra calamidade vinda das profundezas: a existência de uma imensa criatura sobrenatural. A direção é de William Eubank, e, no elenco, destaque para Kristen Stewart (As panteras).
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