Diversão e Arte

Apoio necessário

Criado há 20 anos, o FAC se consolida como importante e principal instrumento de fomento cultural no DF

Correio Braziliense
postado em 12/01/2020 04:07
Manifestação da classe artística, em maio de 2019, contra o cancelamento do FAC

O Fundo de Apoio à Cultura do DF (FAC), institucionalizado pela Lei Complementar nº 267 de 15 de dezembro de 1999, foi criado com o propósito de apoiar, facilitar, promover, difundir e fomentar projetos e atividade culturais. No decorrer dos 20 anos de existência, se tornou o principal mecanismo de incentivo do DF.

De acordo com a Frente Unificada da Cultura do DF, contabilizados os principais mecanismos — FAC, Lei de Incentivo Fiscal (LIC), Lei Rouanet e emendas locais —, o fundo é responsável por cerca de 75% dos projetos executados no DF. Em 2018, das 725 propostas aprovadas, 550 eram do FAC. Desde que surgiu, contudo, o fundo, que começou movimentando uma média de R$ 4 milhões, sempre foi alvo de interesses econômicos do poder Executivo.

Para garantir a implementação dos recursos e a regularidade dos editais, agentes culturais brasilienses se mobilizaram, em 2017, para aprovar a Lei Orgânica da Cultura. Entre outras normativas, a LOC estabelece a destinação mínima de 0,3% da receita corrente líquida do orçamento distrital ao incentivo de projetos realizados por agente culturais da cidade. “Hoje, chegamos a um valor médio de R$ 60 milhões. Um recurso vultoso para quem olha para o quadro de despesa. Mas com o passar dos anos, aprimoramos o formato da sociedade civil usar esse recurso. Esse tempo que o dinheiro fica parado envolve uma característica do fundo ligada aos prazos e aos editais, uma mistura de elementos de licitação com concurso”, explica o maestro Rênio Quintas, que faz parte da Frente Unificada da Cultura do DF.

Ao se consolidar como principal ferramenta de fomento, o FAC aprimorou e democratizou o acesso tanto em relação aos artistas quanto em relação ao público. “Qualquer cidadão, tendo dois anos de residência, uma relação com a sua cidade, e tendo atuação no campo cultural permanente, pode solicitar recursos”, detalha Quintas. Por envolver um recurso público, é exigida uma contrapartida para o uso da verba.

Quando viabiliza diversas atividades culturais, o FAC oferece para a cidade uma vida cultural para além dos equipamentos públicos. “Como são, em sua maioria, projetos pequenos, isso pulveriza e chega aos rincões onde o Estado não pode ir, então vemos teatros de rua e iniciativas onde antes não haveria opção artística. A população passa a ter acesso à arte e à cultura e cria uma sinergia com a sociedade civil. Esse é o objetivo do processo artístico, está vinculado a uma ideia de desenvolvimento humano da sociedade. O artístico vai a reboque”, comenta o maestro.


Economia

O acesso aos recursos também impacta diretamente no mercado econômico brasiliense. O fazer artístico ganha capilaridade e envolve áreas de alimentação, transporte, gráfica, lojas de tecido, segurança, serralheria, marcenaria, entre outros. “Todo o dinheiro que se recebe se gasta aqui. Gera-se emprego e renda de verdade. A cultura tem uma interface com todas as áreas, tanto artísticas, quanto econômicas”, avalia Quintas. “Não é viver de FAC. Alguém faz alguma objeção a alguém que constrói prédios? Ele constrói e vai embora para a próxima obra. A política de Estado tem que ter um olhar mais macro e criar condições para desenvolver trabalhos artísticos e para que os artistas recebam com dignidade”, acrescenta.

Dentro da abrangência de influência do fomento existe ainda um lado imaterial difícil de ser mensurado. “Revela uma carência do Estado de entender o fazer cultural”, explica o maestro.

Para o professor do doutorado em direito e políticas públicas do Uniceub Frederico Barbosa, esse tipo de financiamento apoia e produz a diversidade cultural e os bens simbólicos a serem oferecidos à população e, principalmente, proporciona em grandes centros urbanos uma maior participação da arte e da cultura no mercado de trabalho. Também é papel do poder público responder a demandas de equidade de oportunidades. “Seja na forma de orçamento direito ou de incentivo fiscal, é preciso manter a possibilidade de acesso a formas de financiamento e fomento, complementares aos recursos que os agentes acessam pela via dos mercados”, afirma.

Contudo, para produzir um efeito multiplicador na área cultural e áreas conexas, o sociólogo explica que é preciso um sistema de financiamento forte e bem consolidado. “Na minha avaliação, isso significa um fundo com regras claras, consolidadas, com maneira contínua e rotineira, cumulativa e incremental. É importante que as políticas despertem a confiança dos artistas e da sociedade no que o Estado faz”, esclarece.

Ao institucionalizar o fomento cultural como política pública, é fundamental a estabilidade no montante dos recursos. “Para que os atores do campo cultural saibam o que vai acontecer e que eles conheçam as regras. Assim, eventualmente, em crise fiscal, os recursos podem diminuir, mas devemos saber e reconhecer os limites e os argumentos para que isso aconteça”, completa. Barbosa pontua ainda que tudo parte de uma vontade política e de uma discussão clara com os atores.

Polêmicas

No início da gestão de Ibaneis Rocha (MDB), a classe artística se mobilizou contra a decisão do então secretário de Cultura e Economia Criativa Adão Cândido de, primeiramente, suspender dois editais do fundo, os FACs Áreas Culturais e Audiovisual, ambos de 2018, e depois de oficializar o cancelamento de apenas o Áreas Culturais, cujo investimento era de R$ 25 milhões. A justificativa era que parte do recurso custearia a reforma do Teatro Nacional Claudio Santoro. Com a decisão, 269 projetos foram cancelados imediatamente e cerca de 30 mil empregos, diretos e indiretos, interrompidos.

Os trabalhadores da cultura seguem sem uma definição a respeito do assunto. Na última quarta-feira, a Frente Unificada da Cultura esteve com o novo responsável pela pasta, Bartolomeu Rodrigues, e entregou uma carta de demandas da categoria. Em entrevista ao Correio, o secretário disse que aguarda o desenrolar jurídico do caso. “Ocorre que o FAC do ano passado foi cancelado e há controvérsias quando a gente fala no campo jurídico, mas pelo menos ele está judicializado, o fato é esse. Está sobre o crivo do Tribunal de Contas do DF. Uma vez tendo o posicionamento do tribunal, nós vamos executar esse FAC”. Rodrigues comentou ainda que deseja, até fevereiro, lançar os editais deste ano.
 
 
 
 


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