Correio Braziliense
postado em 12/02/2020 04:29
Cala-te, boca
Quem diz o que quer sofre o que não quer. O ministro da Economia serve de exemplo. Paulo Guedes chamou os servidores públicos de parasitas. Englobou gregos e troianos: os professores, que educam as crianças; os médicos, que salvam vidas; os próprios assessores, que o ajudam na árdua tarefa de recolocar o país nos trilhos do desenvolvimento.
A resposta veio rápida. Categorias preparam contra-ataque. Entre as medidas anunciadas, ações judiciais e manifestações de rua. “Foi uma gafe”, disse a turma do abafa. A palavra suscitou perplexidade. Desrespeitar trabalhadores é gafe? Qual o significado da criatura? E a origem?
Vocábulos ligados à etiqueta em geral vêm do francês. Nos convites, aparece RSVP. Na língua de Victor Hugo, as quatro letrinhas querem dizer répondez s´il vous plaît. Na nossa, favor confirmar a presença. Gafe também vem de lá. Significa ação ou palavra desastrada, indiscrição involuntária. Em bom português: mancada.
Um lá, outro cá
A gafe ensina uma lição gramatical. Contra–ataque pede hífen pela mesma razão que anti–imperialismo, super–região, micro–ondas, sub–bloco & cia. O encontro de letras iguais dá curto-circuito. Pra evitar acidentes, convoca-se o tracinho. Com ele, fica um lá e outro cá.
Sem privilégio
“Ex-capitão do Bope próximo dos Bolsonaro morre após confronto com a polícia na Bahia”, escreveu o jornal de segunda. Cochilou. Esqueceu que nome próprio tem plural. Na dúvida, basta lembrar Os Maias, clássico da literatura portuguesa: os Marotas, os Silvas, os Mouras, os Castros, os Bolsonaros.
Santa Bárbara!
O que é certo no Brasil? As chuvas. Mas, apesar da certeza, sai ano, entra ano, as águas nos pegam desprevenidos. Há pouco, foi a vez de Minas Gerais. Agora, do Rio e de São Paulo. Com as tempestades, duas palavras voltam às manchetes. Uma: enxurrada. A outra: enchente. Pinta, então, a pergunta: por que uma se grafa com x e a outra com ch?
A questão procede. É que, depois de en-, o x pede passagem: enxada, enxofre, enxoval, enxugar, enxergar, enxaqueca, enxurrada. E por aí vai.
Enchente joga em outro time. Faz parte da equipe que mantém a família acima de tudo. Derivada de cheio, conserva o ch: cheio, encher, enchente.
Vale lembrar
Na pronúncia, as duas letrinhas do en- formam ditongo (ein). Por isso, a regra se amplia. Depois de ditongo, o x ganha banda de música e tapete vermelho: coisa, caixa, baixa, faixa, ameixa, deixar, feixe, gueixa, paixão, caixão, peixe, queixa, Teixeira.
Sem rumo
“Chegam hoje em Anápolis os aviões com brasileiros repatriados da China”, escreveu o site do jornal. Ops! Tropeçou na língua. Bateu sem piedade na regência do verbo. Aviões chegam a algum lugar: Chegam hoje a Anápolis os aviões com brasileiros repatriados da China. O navio chegou a Santos. O presidente chegou a Brasília. A repórter chega ao gabinete do ministro.
Por enquanto
O juiz rejeitou a denúncia contra Glenn Greenwald no caso das interceptações telefônicas de autoridades. Entre elas, do então juiz Sérgio Moro. Mas a decisão não é definitiva. Na sentença, Sua Excelência disse que o faz “por ora”. Leitores perguntaram se não seria “por hora”.
Não. As duas soam do mesmo jeitinho, mas têm significados diferentes:
Por ora = por agora: Gosta de mudar de emprego. Por ora, trabalha na construção civil.
Por hora = a cada 60 minutos: A velocidade da via é de 60km por hora.
Erramos
Na nota “Que preguiça”, publicada na edição de domingo, ocorreu um erro. Onde se lê cinematográfico, leia-se cinematógrafo.
Leitor pergunta
O suicídio tem destaque com o elevado número de pessoas que, em desespero, tomam essa decisão. Cabe uma indagação: a pessoa suicidou ou se se suicidou?
Uriel Villas Boas, S.Paulo
Acredite. Não existe o verbo suicidar. Só existe suicidar-se. O dicionário, que sabe tudo, só registra a forma pronominal (suicidar-se). Por isso, diga, sem medo de errar: A pessoa se suicidou.
Recado
“Quem não lê, mal fala, mal ouve, mal vê.”
Monteiro Lobato
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