Correio Braziliense
postado em 15/03/2020 04:17
“A gente tem que sonhar, senão as coisas não acontecem. A vida é um sopro!”
Oscar Niemeyer
Um assunto muito importante
Mês de fevereiro, depois do carnaval.O movimento na cidade começa aos poucos a se acentuar, devido à volta das pessoas de suas férias de fim de ano, descanso de carnaval e volta às aulas.
O trânsito, portanto, passa a se intensificar, a cada dia que passa, mostrando aos brasilienses que o cuidado e a atenção precisarão ser maiores.
Num dia desses, voltando a pé de meu treino matinal na academia, já de longe comecei a observar uma senhora que, diferente dos outros apressados pedestres, tentava atravessar a primeira pista da EPDB, no sentido Gilberto Salomão, ponte Costa e Silva, com extrema dificuldade, pois usava um par de muletas canadenses, daquelas que se apoiam nos braços, acima dos cotovelos.
Não tirei mais os olhos daquela senhora. Diminuí minha marcha, sempre atenta. Com alívio observei que ela conseguiu atravessar a primeira pista, quase que flutuando sobre o asfalto, tal a velocidade que empreendeu com aquelas muletas, num intervalo curto e perigoso entre os carros que “voavam” tão afobados naquela pista molhada, pois há pouco havia chovido.
E eu de olho nela, esquecida do ritmo adequado a uma saudável caminhada. Atenta e já aflita, vigiando a travessia daquela senhora de muletas, no meio do capim (onde deveria ser grama) alto e molhado, naquele imenso canteiro central, entre folhas mortas, terra, buracos e sabe-se lá o que mais!
Finalmente, cansada, ela chega ao meio-fio do lado de baixo do canteiro central, bem em frente ao ponto de ônibus. Para. Espera, espera e espera. Na pista, como num autódromo, os carros passam às pressas e seus motoristas sequer percebem que, à beira do meio-fio, há uma deficiente física solitária e tensa, a se equilibrar em suas muletas, cujas borrachas de apoio estavam sujas de barro.
Tomei, então, a decisão mais importante dos últimos tempos. Respirei fundo, já indignada e morrendo de pena daquela senhora. Esperei um hiato maior entre um carro e outro e, imbuída de muita coragem, parti toda empinada para o meio da pista, braço esquerdo levantado, bem alto, e o direito com aquele movimento de sobe e desce, de quem está mandando os carros pararem, diante do espanto e olhos arregalados da senhora de muletas. Ao mesmo tempo eu olhava firme para ela e dizia que ficasse calma e me esperasse, porque eu iria buscá-la. Uma cena que jamais vou me esquecer!
O primeiro carro, do Corpo Diplomático, parou. Comecei a rezar para que os de trás estivessem atentos e parassem também, diante daquela situação inusitada, com “uma louca” de malha de ginástica fechando aquele trânsito, com o mesmo gestual dos fiscais do Detran. Tive medo de causar um grande engavetamento entre os mais desatentos.
Todos parados (ufa!), ainda com o braço esquerdo levantado, bem no meio da pista, me dirigi à senhora, estendi-lhe a mão direita e propus que atravessasse comigo. Afobada e tensa, ela começou a correr, calada, incrédula talvez, com aquelas muletas, até que eu pedi que ficasse calma, pois estava segura. Ao chegarmos e só depois que ela subiu na calçada, “liberei” o trânsito com um largo sorriso de agradecimento e aquele gesto conhecido, flexionando o braço direito “tipo” pode passar.
Lembrei-me, então, de quando eu era Fadinha, aos 10 anos de idade, postulante ao posto de futura Bandeirante. Tínhamos um cumprimento, com os dedos médio e indicador juntos e dizíamos, uma para as outras: “FAS — Fada ajuda sempre!” Devíamos praticar uma boa ação todos os dias.
Já avó, tive uma bela oportunidade de praticar os ensinamentos de meus tempos de criança. E senti uma sensação de plenitude indescritível, ao praticar a minha boa ação naquele dia.
Por isso, senhor governador e administradores regionais, volto aqui, mais uma vez, em 17 anos, pedir que todos voltem sua atenção e pensamento para esses pedestres que, neste autódromo chamado Brasília, ficam como aquela senhora, ainda que sem usar muletas. Uma dificuldade para atravessar as pistas de rolamento, pois são sequer vistos ou sentidos pelos motoristas em seus bólidos apressados.
Entre pontos de ônibus, saídas de colégios e órgãos públicos (na L2 por exemplo) em que as travessias não só são perigosas, mas atravancam o trânsito com semáforos que se fecham a todo momento, façam passagens subterrâneas decentes, iluminadas e seguras. Campanhas educativas e intermitentes convencerão os pedestres a usá-las, evitando acidentes e problemas para atravessar as pistas.
Nos canteiros centrais, façam calçadas com o padrão exigido, justamente onde as pessoas pisoteiam todos os dias e mostram por onde elas precisam passar, ou seja, onde estão feitas as trilhas que facilitam a descoberta do melhor lugar para atravessar.
Se ostentamos o título de cidade com a melhor qualidade de vida, que tal nos aproveitarmos disso e possibilitar tamanho conforto e segurança para todos os brasilienses? O trânsito ficará mais livre, fluirá melhor e os pedestres atravessarão as pistas em segurança e com mais rapidez. Todos em harmonia e segurança total.
Um sonho que, se concretizado, deixará nossa cidade sexagenária com o título de cidade que mais cuida e respeita os seus pedestres. E motoristas também.
Grandes e graves problemas de trânsito serão eliminados, num piscar de olhos. Mergulha Brasília!
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