Um encontro improvável, o que juntou a atriz e cantora paranaense Simone Mazer e o grupo carioca Semente, resultou num dos melhores discos lançados neste começo deste ano. Obviamente, contribuiu para isso o conteúdo do projeto: parte da obra de um dos mestres da MPB, o genial compositor Nelson Cavaquinho, recriada com respeito a tradição, mas com um toque de contemporaneidade, para que possa ser apreciada pelas novas gerações.
No álbum Grupo Semente e Simone Mazzer cantam e tocam Nelson Cavaquinho foram reunidos 14 sambas do rico legado do Poeta dos Cabelos cor de Prata, morto em 18 de fevereiro de 1986. São parcerias dele com Jair do Cavaquinho, Amâncio Cardoso, Alcides Caminha, Elcio Soares, Ari Monteiro, Oswaldo Martins e Guilherme de Brito — o mais frequente deles. Entre os que já o gravaram estão Beth Carvalho, Elis Regina, Nara Leão e Paulinho da Viola.
Saiba Mais
Inicialmente, a ideia do Semente era montar um show em homenagem a Nelson e, para isso, resolveu-se chamar Simone Mazzer, que acrescentaria o peso dramático necessário para interpretar as canções melancólicas do sambista. Deu tão certo que ambas as partes decidiram registrar o tributo, com novas leituras de clássicos e músicas menos conhecidas. Com o intuito de fazer uma conexão com os tempos atuais, Nome sagrado, uma ode à mulher, foi escolhida para abrir o CD.
O processo de construção, tanto do repertório, como dos arranjos, teve início em meados de 2018. “Depois de levarmos as canções para para o palco, a gravação foi bem rápida, pois já sabíamos o que queríamos fazer, o trabalho estava maduro”, conta o cavaquinista João Callado, autor dos arranjos com o violonista e guitarrista Bernardo Dantas, companheiro de grupo. Os outros integrantes do Semente são Marcos Esguleba (percussão), Maninho (percussão) e Bruno Barreto (voz e percussão). Bruno divide a interpretação com Mazzer em cinco faixas do disco.
Com 22 anos de atuação, o Semente deu importante contribuição para a redescoberta e revitalização do bairro boêmio da Lapa, ao lado da cantora Teresa Cristina, como residentes do bar homônimo (já extinto), que acabou dando nome ao grupo. “São muitas lembranças boas do Semente, quando vários sambistas começaram a aparecer por lá, para ver o que estava acontecendo e dar canjas”, lembra Bernardo. “Me recordo de ficar impressionado com o mestre Argemiro da Portela, cantando e sambando no pequeno palco daquele bar”, acrescenta.
Prêmio
Entre 2002 e 2010, período em que acompanhava Teresa Cristina, gravou cinco discos com a cantora. Em 2014, já em carreira solo, lançou um CD pela Biscoito Fino, no qual contou com a participação de Diogo Nogueira, Teresa Cristina e Pedro
Miranda (ex-integrante da formação original do grupo). Esse disco o levou a conquistar o Prêmio da Música Brasileira no
ano seguinte, na categoria Melhor Grupo de Samba.
Segundo Callado, a ideia do projeto que celebra Nelson Cavaquinho foi do percussionista Marcos Esguleba, enquanto
todo o grupo se envolveu na escolha do repertório. “Clássicos como A flor e o espinho, Folhas secas, Juízo final, Luz negra,
Palhaço e Rugas, não poderíamos deixar de fora, mas queríamos também mostrar aquelas menos conhecidas, entre
elas Duas horas da manhã, Dona Carola, Enquanto a cidade dorme e Sempre Mangueira”, frisa o cavaquinista.
Para Bernardo, na gravação do CD houve a escolha de um caminho mais simples e tradicional, embora tenham incluído
pela primeira vez uma guitarra no trabalho do Semente, mas com muito cuidado. “Sobre o encontro com a cantora, o
violonista e guitarrista é enfático: “Tudo se desenrolou com muita naturalidade. Trouxemos a voz e a interpretação de
Simone Mazer para o universo do samba. Fizemos um CD bem direto, que nasceu de um show”.
Cavaquinho
CD com 14 faixas. Lançamento da Biscoito Fino. Preço: R$ 36,90.
Entrevista// Simone Mazzer
Você, atriz e cantora com trabalhos elogiados, vê complementaridade entre os dois ofícios?
Sem dúvida. Teatro e música se completam. Mesmo isoladamente, quando estou na música ou no teatro, estou sempre me servindo do que aprendo com ambos.
A experiência que acumulou no Paraná serviu de base para os trabalhos que passou a realizar, já radicada no Rio de Janeiro?
Saí de Londrina em busca de um mercado maior para trabalhar. Trouxe na bagagem tudo o que aprendi no meu início de
carreira, e sim, isso me serve até hoje.
Antes de gravar este CD com o Grupo Semente, o samba já fazia parte de sua vida?
Sempre busquei ouvir de tudo, já que sou uma intérprete, e o samba estava presente. Passei a conviver mais com o samba
depois que me mudei para o Rio.
A aproximação com a obra de Nelson Cavaquinho é recente, ou você já a conhecia bem?
Já conhecia algumas composições, os clássicos. Os estudos se aprofundaram por ocasião do show e da gravação o CD. E que
sorte a minha.
Que samba, entre os 14 do repertório, lhe trouxe mais dificuldade para interpretar? E por que?
Os que canto em dupla com o Bruno, porque existem diferenças de interpretação e ainda as diferenças naturais das vozes masculina e feminina, mas, sobretudo, minha inexperiência no ritmo mesmo. Tempos, contagens, todo um universo diferente do que estou habituada. Isso também foi muito enriquecedor.
Qual deles se emocionou mais ao cantar?
Duas horas da manhã uma música com muitas possibilidades.
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