Diversão e Arte

Domingos Oliveira tem renascimento artístico das obras

"Vai ter muito Domingos Oliveira, por anos, ainda", conta Priscilla Rozenbaum, em entrevista ao Correio: filme inédito tem exibição na tevê

Correio Braziliense
postado em 02/05/2020 07:36
O diretor Domingos Oliveira: %u201CO amor é uma selvageria e um efeito colateral do sexo

 
Espectadora atenta e integrante por quase 40 anos do universo dramatúrgico de Domingos Oliveira, a atriz Priscilla Rozenbaum, viúva do artista (morto ano passado), só tem elogios para a escrita do marido. "Sabe que eu dizia pra ele: 'Até teu e-mail é uma obra-prima! (risos). Prezo muito a obra do Domingos; vejo ele como um gênio", comenta a atriz que, atualmente, pode ser vista na série Todas as mulheres do mundo (pelo GloboPlay).
 
A estreia da série praticamente coincide com as vésperas da exibição de uma das derradeiras obras de Domingos: o longa Aconteceu na quarta-feira (hoje e amanhã, no canal Curta!, coprodutor da fita). Julio Bressane (autor de clássicos do cinema nacional como Matou a família e foi ao cinema), depois de assistir ao longa, deu o veredito: o melhor filme de Domingos. "Ele adorava mostrar os filmes para os colegas; ficava analisando a reação deles vendo. Eu dizia que ele ia tirar todo o público latente das salas de cinema (risos)", brinca Priscilla.
 

Saiba Mais

 
 
Na concepção dela, o longa é sobre um casal que se ama tanto quanto se odeia. O roteiro vem de uma peça, O duplo, em que, a contragosto, um psicanalista intermedeia desavenças do casal. "O amor da vida dela vai embora, mas ele fica, ao mesmo tempo: se duplica, por amor. Gosto de me descolar de mim, fazendo personagens muito diferentes. No filme Carreiras, fiz uma cocainômana, ligadassa e famosérrima. No novo filme, a minha personagem tem o ego bem inflado", avalia Rozenbaum.
 
Priscilla Rozenbaum, viúva do dramaturgo, traz um baú repleto de memórias e emoções 
 
Priscilla esclarece que não se trata de uma revisão -- a atual exibição de Todas as mulheres do mundo, mas de uma homenagem. "Tem a poesia e a humanidade do Domingos na adaptação, mas guarda a obra dos outros envolvidos (os roteiristas Jorge Furtado e Janaína Fischer), em 12 episódios", explica. Para ela, que testemunhou o trabalho artesanal do marido, fica a alegria de ver Confissões de mulheres de 50, igualmente, transformada em série de dez episódios para o Canal Brasil, também em 2020.
 
No projeto, Clarice Niskier, Caca Mourthé, Dedina Bernardelli e Priscilla, a exemplo do que fizeram no longa Feminices e na peça Confissões de mulheres de 30, confraternizam num restaurante carioca, para tratar de boemia, filosofias de vida, enquanto botam a vida em ordem, nunca dispensando amor e sexo.

Liquidificador filosófico

Num mix de sete obras de Domingos, Todas as mulheres, pelo que Priscilla analisa, não tinha nenhuma obrigação de se ser igual ao original. Autoria, entretanto, sempre fez parte da originalidade do marido. "O Domingos diz que todas as pessoas inteligentes se plagiam (risos). E é curioso isso: quando ele estava pesquisando tema para uma peça, às vezes, estreava um filme de Woody Allen (ao qual sempre foi comparado). É como se a arte estivesse no ar", observa Priscilla.
 
Além de beber de Ingmar Bergman, o exímio cineasta sueco que dissecava comportamentos humanos, Priscilla conta que Domingos, inesperadamente, amava filmes americanos de aventura. "Mas, para inspirações, ele sempre citava Jean-Luc Godard, pelo emprego do corte descontínuo; François Truffaut, hábil em colocar música clássica em cenas rotineiras; John Cassavetes, pela experimentação e Charles Chaplin, com quem aprendeu o que é o amor. Mas o Domingos dizia que a realidade nem sempre é um lugar bom, porém o único em que se pode comer um bife com batata frita", diverte-se. 
 
Ainda na base do bom humor, Priscilla arrisca uma perspectiva de Domingos para os tempos de pandemia. "Ele diria: 'Não acredito nisso: vou fazer um sarau, promover um cabaré pra ficar junto de todas as pessoas que se amam', acho", diz. Seletivo por natureza, Domingos dizia que só trabalhava nas horas vagas, conta a eterna companheira. "Primeiro, ele dizia vinham família e amigos -- só que tinha muitas horas vagas", observa ela, que, ao lado de Maria Mariana (filha do dramaturgo), gerencia o espólio do produtivo cineasta.

Ainda que sentindo os efeitos do Mal de Parkinson, Domingos nunca deixou de ir ao set dos filmes que fosse. "Nem ninguém dirigiu nada por ele, assim como ele nunca deixou alguém editar um filme por ele. Fazia muito, aqui em casa mesmo", comenta.
 
Priscilla garante ter tudo, com muitos textos inéditos no intacto computador do marido. "A morte dele foi muito dolorida para mim. Ainda não tive cabeça de mexer nas coisas. Precisei me alienar um pouco. Tenho medo de me emocionar demais com a exibição da série; chorar demais. Mas, a gente vai ter muito Domingos, por anos ainda. Há a peça Ultimato, um livro de crônicas; Delírio, uma coletânea de poesias inéditas e há o diário dele, perfeito para se entender o Domingos: é uma obra-prima!", conclui.
 
 
 
 
 

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags