Correio Braziliense
postado em 18/05/2020 06:01
Costuma-se dizer que o Brasil é um país sem memória. Que a história e as pessoas que fizeram parte dela são muitas vezes esquecidas. Com a intenção de enaltecer 42 personalidades que se destacaram em diferentes âmbitos, do cinema a arquitetura, da religião a política, surge a obra Brasileiros, organizada pelo escritor e advogado José Roberto de Castro Neves, publicada pela Editora Nova Fronteira.
“Eu até faço uma brincadeira na introdução do livro, com uma pergunta retórica: por que a gente não enaltece nossos heróis? Em muitos países se criam mitologias em tornos das pessoas. Mas, aqui, nós tratamos nossa história de forma ruim. Ou a gente critica, ou a gente esquece. Pessoas que fizeram grandes feitos são pouco faladas”, comenta o autor da obra. Para ele, o livro é uma forma de resgatar o passado para ensinar futuras gerações. “Acho que a história permite que a gente aprenda muito para conseguir construir uma sociedade mais esclarecida, conhecendo os erros, enaltecendo os grandes feitos. Isso também cria um pertencimento importante”, completa.
Nas mais de 400 páginas, o livro traz a história de 42 brasileiros pelo ponto de vista de admiradores, pessoas com quem eles conviveram ou até da própria família. Cada convidado pôde escrever ao seu modo. Por isso, não há um padrão em cada texto. O leitor passeia por diferentes formatos. “Essa liberdade (na escrita) acaba dando um certo refresco. Você pode ler um texto com uma sensibilidade maior, depois encontrar algo diferente. São olhares diferentes, mas de muita admiração e sem ser uma leitura polianesca, porque a gente compreende que toda pessoa tem seus pecados”, comenta José Roberto de Castro Neves.
A escolha pelos 42 nomes foi por meio da própria história e com o objetivo de contemplar uma grande diversidade de áreas e de pessoas. Entre os descritos nomes como o arquiteto, Oscar Niemeyer, a antropóloga Ruth Cardoso, o presidente Getúlio Vargas, a religiosa Santa Dulce, o ator Oscarito, o cineasta Glauber Rocha, o escritor Machado de Assis, o engenheiro Marechal Rondon, a médica Zilda Arns, o cantor Cazuza e o jornalista Vladimir Herzog.
Cada uma das personalidades teve a história narrada por pessoas ligadas a eles. O autor destaca a presença de textos, por exemplo, de Renato Aragão sobre Oscarito, de Fernanda Montenegro sobre Santa Dulce, e de Cacá Diegues sobre Glauber Rocha. O livro tem ainda colaboração de pessoas como Ancelmo Gois (Luiz Gonzaga), Fernando Henrique Carodos (Tancredo Neves), Luís Roberto Barroso (Rui Barbosa), Mary Del Priore (Barão de Guaraciaba), Nelson Motta (Vinicius de Moraes), Paulo Ricardo (Cazuza) e Pedro Bial (Marechal Rondon). O próprio organizador também fez o seu em homenagem ao jurista Sobral Pinto.
De certa forma, parte da história de Brasília é retratada em Brasileiros no capítulo sobre Oscar Niemeyer escrito pelo colega de profissão Jaime Lerner. “Na verdade, foi um barato, porque Jaime, por si só, é um grande urbanista e tem uma história fantástica. Então, ele falar de Oscar Niemeyer é ter dois ícones, duas grandes figuras. O texto ficou lindo, você tem a dimensão da genialidade desse cara. Olha quantos brasileiros incríveis são exemplos para gerações. São pessoas corajosas que enfrentaram questões relevantes e tiveram desafios na vida”, afirma.
SERVIÇO
Brasileiros
Organização de José Roberto de Castro Neves. Editora Nova Fronteira, 448 páginas. Preço médio: R$ 69,90.
Confira trecho do texto sobre Oscar Niemeyer cedido pela editora
Jaime Lerner
[...]Na fotografia das cidades em filmes e novelas é que percebemos o quanto as suas obras trouxeram identidade aos lugares. Em São Paulo, o Edifício Copan. Em Curitiba, o Museu Oscar Niemeyer. Em Belo Horizonte, a Pampulha. Em Niterói, o Museu de Arte Contemporânea. Em Brasília, Brasília toda.
Se é no ofício da arquitetura que reside e resiste o último dos generalistas, aquele que projeta as mais diferentes escalas e objetos, Niemeyer é a sua personificação. Arquiteto, escultor, filósofo e escritor, foram mais de seiscentos projetos construídos, outras dezenas (ou centenas!) projetados. Sonhos edificados.
Em 1988 tornou-se o primeiro brasileiro a receber o prêmio máximo da arquitetura internacional, o Pritzker, apelidado de Nobel da arquitetura, honraria concedida àqueles arquitetos que apresentaram em sua obra contribuições para a humanidade, combinando talento, visão e comprometimento com o futuro.
Foi depois de Oscar que a arquitetura brasileira teve seu mentor, tornando-a profissão, passando a ser estudada nas universidades, projetando a “nossa forma” para o mundo.
Chico Buarque tão belamente descreveu que sempre sonhou em morar em uma casa de Oscar, então decidiu fazer arquitetura; por fim abandonou o ofício e decidiu ser aprendiz de Tom Jobim. Relatando sua relação com a obra do arquiteto, disse: “Quando a minha música sai boa, penso que parece música do Tom Jobim, música do Tom na minha cabeça é a casa do Oscar.”
A vida toda, Oscar foi uma luz pensante no panorama da arte brasileira. Coerente, amigo, generoso. Uma das suas frases mais clássicas era que a vida era um sopro, e que devíamos usufruí-la ao máximo. Fui entender mais claramente o significado disso em uma das visitas que fiz ao seu escritório. Era fim da tarde, ele me convida para uma aula de filosofia. A palestra se inicia e vejo um jovem assistindo à aula com fervor. Imagine, Oscar Niemeyer, aos 99 anos, assistindo embevecido aos novos conhecimentos sobre filosofia!
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