Em 1984, Aldir Blanc e Maurício Tapajós se juntaram para lançar o LP duplo que leva o nome dos dois. A parceria musical rendeu 20 músicas, sendo 11 delas compostas pela dupla. O sucesso foi tamanho que o álbum duplo ganhou dois novos formatos: um relançamento em formato de CD com 12 músicas, em 1994, e uma série televisiva este ano.
Imagem vinil é uma produção que personifica crônicas bairristas descritas nas 20 composições do disco Aldir Blanc & Maurício Tapajós (1984). A série, transmitida no canal por assinatura Prime Box Brazil, conta com 10 episódios. Com direção de Frederico Cardoso, a trama gira em torno do bairro da Tijuca (Zona Norte do Rio de Janeiro), local em que Aldir Blanc morou por muito tempo.
“As letras do Aldir — não somente desse belíssimo álbum com Tapajós — são crônicas curtas que contam histórias e nos remetem a situações do cotidiano e outras histórias. Então, as letras nos serviram não só de inspiração, mas como base para as narrativas audiovisuais dos episódios. Além disso, o encarte LP vem com charges, poesias, pinturas, artigos de amigos e parceiros da dupla. Eu e meus sócios somos todos tijucanos e conhecemos bem o bairro onde ambientamos as histórias, portanto, também acrescentaram vivências”, conta o diretor.
O primeiro episódio — Saudades — envolve as faixas Perder um amigo e O bonde. O segundo episódio — Pimenta — traz as mazelas das músicas Querelas do Brasil (tema de abertura) e Entre o torresmo e a moela. “Em todos os episódios, os personagens principais são cantados nas músicas, com duas músicas inspirando cada um dos 10 episódios. Na escrita, a partir da estrutura narrativa desenvolvida por mim, Gustavo Colombo e Vitor Pimentel, conforme as necessidades fomos inserindo personagens que foram dando liga e musculatura para sustentar os 25 minutos de cada episódio, cena a cena”, completa.
A cenografia também recebe destaque ao receber o Estádio do Maracanã e o Bar da Dona Maria, boteco onde Aldir e Maurício escreveram composições, como locais de filmagem. No elenco da série, Guida Vianna e Lionel Fischer são os destaques e se encontram ao lado de Marcello Melo, Maria Clara Guim, Christian Santos, Anderson Quack, Flávio Bauraqui, Vitória Rangel, Júlia Cartier Bresson, Roberto Rodrigues, Felipe Garcia, Waleska Arêas e Arlindo Paixão.
Interpretações
Um dos fatos interessantes da gravação é a distância existente entre as características dos personagem e de quem interpreta, fato comum para atrizes e atores. Guida Vianna, reconhecida atriz brasileira afirmou que não existem semelhanças entre ela e a personagem. Na série, Guida interpretou Betina, uma mulher que cuidava da casa e da família. “Não há nenhuma semelhança entre nós. Saí de casa aos 21 anos já formada na faculdade, trabalhando e dona da minha vida. Casei, separei, criei uma filha sozinha e me sustento com a minha profissão. Tenho minhas opiniões e sou dona da minha própria vida. Mas, o bom do trabalho do ator é isso mesmo, fazer personagens completamente diferentes de nós mesmos”, pontua.
No mesmo sentido, o ator Lionel Fischer nega qualquer semelhança com o policial aposentado Pimenta. O personagem que interpreta na trama teve forte ligação com os órgãos de repressão do regime militar, é alcoólatra, fuma compulsivamente e destrata a esposa. “Não existe nenhuma semelhança entre Pimenta e eu. Tinha 15 anos quando se deu o golpe militar. Meu pai, já falecido, foi um dos fundadores do Partido Socialista Brasileiro. E me recordo de uma noite em que ele, sentindo-se ameaçado, me pediu para ajudá-lo a jogar fora todos os livros, escritos ou documentos que pudessem incriminá-lo. Fizemos isso ao longo de toda uma noite, jogando hipotéticas provas na Lagoa Rodrigo de Freitas. E certamente, como já disse, por não ter nada em comum com o personagem, pude enxergá-lo de uma forma crítica, tentando sempre entender o que leva alguém a desprezar por completo a empatia.”
Compositores
Aldir Blanc morreu em 4 de maio último, após ser contaminado pelo novo coronavírus. Era formado em medicina, mas largou a carreira para se dedicar às composições e ao mundo artístico. Escreveu mais de 600 letras musicais e trabalhou como cronista. Antes de morrer, entretanto, participou de um teaser da série Imagem vinil, em que contou parte da história do lançamento do primeiro disco. O cantor relembra como, junto a Maurício Tapajós, conheceu a pessoa responsável por aprovar a liberação de verbas da Petrobras para atividades culturais, que facilitou a liberação do LP duplo em 1984.
Maurício Tapajós morreu em 1995 e o legado vem sendo repassado pelas músicas e também pelos filhos Lúcio e Márcio, que contaram um pouco sobre o disco lançado na década de 1980. “Musicalmente, ele começou trazendo músicos fantásticos para trabalhar junto, se não me engano foram mais de 80 músicos que tocaram no disco. E as faixas falam de um Brasil e um Rio de Janeiro cheio de mazelas, mas visto com ironia, amor e esperança. Aldir e Maurício transmitem em suas músicas um alto teor político e sarcástico. Quem conheceu os dois sabe como isso era forte neles”, conta Márcio Tapajós.
Lúcio Tapajós também deixou uma contribuição a respeito da produção de Aldir Blanc e Maurício Tapajós. “Um LP independente, duplo, com aquela capa, aquele encarte, aquele nível de textos e ilustrações... Hoje, não existe maisaquilo. Naquele tempo, não se via isso também. Aliás, alguém fez algo parecido?”, questiona.
*Estagiário sob a supervisão de Igor Silveira
Imagem vinil
Canal de TV por assinatura Prime
Box Brazil. Dez episódios de 30 min, com novos episódios nas quintas-feiras, às 21h. Reprises nas segundas-feiras, às 10h30, e sextas-feiras, às 10h. Não recomendado para menores de 14 anos
Aldir Blanc & Maurício Tapajós
De Aldir Blanc e Maurício Tapajós. SACI, 20 faixas.
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