Correio Braziliense
postado em 11/07/2020 04:16
» Rodrigo Sant’anna
Inspirado pelas experiências cotidianas de toda uma trajetória vivida no Morro do Macaco, Zona Norte do Rio de Janeiro, Rodrigo Sant’anna, 37 anos, imerge no universo do humor com desenvoltura e autenticidade. Para ele, a felicidade existente em atuar em programas de televisão é poder apresentar ao público fragmentos da história pessoal e, assim, quebrar preconceitos existentes sobre as favelas. “Eu tenho orgulho de mostrar a realidade como ela é, sem maquiagens, nua e crua”, defende o artista em entrevista ao Correio.
Com o portfólio artístico recheado de grandes trabalhos na televisão brasileira, como Zorra Total e Escolinha do Professor Raimundo, Rodrigo observou a necessidade de criar algo mais íntimo, motivado por inspirações que fazem parte do ciclo social dele. A ideia, então, foi usufruir dos conhecimentos acerca da comédia e atuação para desenvolver um estilo próprio de humor popular. “A forma mais comum de retratar a comunidade nos filmes brasileiros é apresentando-a pelo viés da violência, das armas, do tráfico. A minha intenção é mostrar as famílias. Mostrar que a rotina de quem vive em uma comunidade é natural, como qualquer outra”, justifica Rodrigo.
Acoplado à atuação de personagem principal, Rodrigo Sant’anna desenvolveu, a história por trás da série Tô de Graça (Multishow), ao lado de Denise Crispun. A série, recentemente, ganhou a quarta temporada. De acordo com ele, para a criação das personagens, não foram minimizados os detalhes considerados essenciais para ilustrar o subúrbio carioca. Toda a cenografia, figurinos e identidade dos intérpretes são um compilado de elementos representativos e que funcionam como ferramenta de inclusão social. “Optei por utilizar vocabulário menos rebuscado. Eu faço questão de respeitar e fazer do humor popular uma fotografia real. Se a mulher quer usar uma blusa curta para se sentir empoderada, vamos colocar uma mulher de blusa curta e empoderada”, declara Rodrigo.
Além de levar, de forma leve, um retrato fiel de comunidades do Rio de Janeiro, Rodrigo tem a intenção de conscientizar parte da população sobre o que é preconceito e, por meio de cenas de comédia, mostrar formas de normalizar situações. “Discriminação não é o pobre falar em um tom alto, é ele não poder falar nesse tom porque será criticado”, diz.
O ator explica, também, que o humor popular não tem espaço suficiente de reconhecimento na cena artística do país. Para ele, produções que englobam o humor com conteúdo puramente brasileiro também merecem premiações importantes. “Quem disse que o humor popular não merece Oscar? Por que não tem relevância? Você não vê premiação de cinema por humor popular. Isso tudo é reflexo de uma tendência que põe tudo que vem de classes inferiores em um lugar menor. É hora de revertermos isso. Humor é humor, vamos agregar e não segmentar”, reflete Rodrigo Sant’Anna.
» Thiago Ventura
De Taboão da Serra, São Paulo, diretamente para a Netflix. O humorista Thiago Ventura ultrapassou fronteiras ao lançar o especial Pokas no serviço de streaming. Conhecido pelo jeito irreverente de falar sobre as vivências da quebrada, Big Big, um dos apelidos de Thiago, cresceu e se tornou referência na comédia.
Se engana quem pensa que, ao escolher trabalhar com stand-up, o único desafio foi arrancar gargalhadas do público. Thiago é formado em administração e tinha uma carreira confiável em um banco. “Pensa no desgosto da minha família”, comenta no vídeo Faculdade, do canal dos 4 Amigos, grupo de comédia em que Thiago faz parte.
Mesmo com uma fonte de renda segura e sendo considerado o futuro da família, Ventura optou pelo sonho, e foi a melhor escolha da vida dele. “A transformação de bancário para comediante foi completamente planejada e tenho orgulho de ter pensado passo a passo para nunca precisar de alguém, ou passar perrengue na caminhada. Fiz o que tinha que fazer e foi essa fita que me faz responder esta entrevista hoje”, relembra em entrevista ao Correio.
A transição não foi de repente: “tenho uma filosofia que é: pensar, anotar, desenvolver e executar. Quando eu descobri a comédia, sabia que não teria como eu viver dessa arte trabalhando em outro lugar. Ou eu me entregava ou não conseguiria, ponto final. Para isso, resolvi economizar cada centavo até conseguir dois anos de contas pagas, e, depois, me entregar à profissão. Lembro que atendia os clientes em uma aba do computador e, na outra, terminava um raciocínio. Era tudo ao mesmo tempo. Uma correria que, de certa forma, me ajudava a não perder o foco. Se eu parasse de fazer, com certeza desanimaria”, explica.
A correria valeu a pena e teve uma grande aliada: a internet. Bingão, mais um dos apelidos de Thiago, foi um dos pioneiros a divulgar os shows no Facebook, o que trouxe grande retorno nos espetáculos. “Mudou tudo. Antes, não tinha ninguém nos shows e um mês depois todos os shows estavam esgotados. Foi um divisor, sem sombra de dúvidas. A internet mudou minha vida”.
A linguagem e forma de se portar nos palcos também foram diferenciais. Ventura vem da periferia e é falando sobre ela que chega ao catálogo do maior serviço de streaming do mundo. “Nesse especial, eu faço piada com a vida na quebrada, deixando claro que ações falam mais do que palavras. Gravar meu terceiro especial de comédia stand-up, como um original Netflix, é, sem dúvidas, uma grande medalha e um feito enorme dentro da minha carreira. Lembro de pessoas rindo da quebrada, não com ela. Hoje, isso mudou e essa é a maior importância”, ressalta.
Com tantas conquistas, é possível dizer que nesse aspecto a periferia venceu. “A quebrada toda vai vencer quando tiver saneamento básico. ‘Que resposta pesada cara você, não é, comediante?’. ‘A quebrada venceu’ significa que mais um de nós conseguiu fazer diferente. Então, partindo desse princípio, sim a quebrada venceu de goleada e é Pokas”, finaliza.
*Estagiários sob supervisão de Igor Silveira
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