Diversão e Arte

Alexandre Carlo: emblema da Natiruts decifra a cena brasiliense

Alexandre Carlo, líder da banda Natiruts, fala ao Correio sobre a forte ligação dele com a cidade, os princípios do grupo, a cena cultural da capital, além do período de pandemia

Correio Braziliense
postado em 17/07/2020 09:52
Alexandre Carlo: imantado pela positividade

A construção do cenário do reggae music em Brasília se deve muito ao grupo Nativus, criado na capital federal em meados de 1990. Posteriormente, renomeada Natiruts, desenvolveu-se com a proposta de, por meio da música, levar paz e mensagens positivas para o público. Em homenagem à banda que tanto significa para a cultura de Brasília, esta edição do Conversas Candangas é com Alexandre Carlo, vocalista do Natiruts. 

Como foi o processo de formação da banda?
Ao contrário do que se pensa, nós, da formação inicial, não nos conhecíamos antes da banda. O processo de criação começou por volta de 1993 quando eu tive a intenção de colocar em prática minha ideia de formar uma banda de reggae nos moldes da minha maior referência Bob Marley & The Wailers. Nesse momento, eu ainda não conhecia nenhum dos futuros integrantes que formariam o Nativus. Os dois primeiros que conheci foram Luís e Bruno no time de futebol da UnB. Numa das comemorações que ocorriam depois dos jogos, conheci Juninho, o futuro baterista. Nos tornamos grandes amigos e Juninho foi o primeiro a abraçar a ideia das canções. Músicas como Presente de um beija-flor e Liberdade pra dentro da cabeça já existiam naquele momento. Isso em 1994. Em 1995, convidei Bruno e Luís para completar os postos de percussão e baixo e fizemos os primeiros ensaios juntos. Em 1996, tivemos a presença de André Carneiro na guitarra e fizemos alguns shows com o nome Nativus e o símbolo da banda, ambos criados por mim em 1994. Em abril de 1996, tivemos a entrada de Izabella e, logo, depois do Kiko Peres, substituindo André. Com a consolidação de todas as funções que eu gostaria para a banda, inclusive a da presença feminina, considero ali a fundação da ideia inicial. E vejo todos como peças fundamentais para isso.

Naquela época, o reggae não era um estilo tão comum no repertório de artistas brasilienses. Como era, naquela época, a forma encontrada para divulgar a banda?
Apesar de gostar de rock e ter Renato Russo como um dos compositores que mais admiro na música brasileira, eu não me sentia culturalmente representado por esse movimento. Vi no reggae essa representatividade que achava necessária para mim e para a cultura do DF, que jamais foi só de rock. A forma de divulgação foi a clássica da época: dar um jeito de gravar uma fita-demo e distribuir pela cidade. O diferencial da nossa fita eram Presente de um Beija-flor e Liberdade pra dentro da cabeça. Numa época em que não existiam YouTube ou Facebook, e as pessoas não tinham a mínima ideia visual e estética de como seriam os integrantes. O poder dessas duas canções foi fundamental para o início do sucesso fenomenal. Fora isso, houve um fato interessante. O fenômeno Nativus foi tão gigante, inesperado e inexplicável para Brasília, a capital do rock, que surgiram teorias para entender aquilo tudo. Uma delas foi a que o sucesso da banda veio por intermédio de um patrocínio vindo da família de Izabella.

A sua trajetória em Brasília é extensa. Até os 26 anos, era morador do Cruzeiro. Qual memória lhe conecta mais com a cidade?
As boas são a conexão com a natureza que a cidade proporciona. A ausência de construções muito altas, a exuberância da fauna e da flora do cerrado, além da beleza do céu de Brasília, sem dúvida, foram inspiração para todas as canções que compus para o disco Nativus.

Como você analisa as mudanças e as oportunidades para quem quer viver da cultura em Brasília?
Brasília tem um potencial artístico incrível. Na minha visão, o fato de ter uma formação cultural que pode ser vista como um resumo do Brasil, contribui muito para o surgimento de projetos originais, como Raimundos, Renato Mattos, GOG, Viela17, Ellen Oléria, Tribo da Periferia e tantos outros. No entanto, ainda tem uma dificuldade de entender a cultura como fator formador de cidadania e educação. Ainda é comum vermos músicos sendo impedidos de trabalhar mesmo antes das 22h por políticas arbitrárias, injustas e com viés ideológico e religioso. O que, obviamente, não é correto.

Qual é a influência e o impacto que o Natiruts têm para os artistas e para o público da cidade?
Qualquer manifestação cultural da cidade que ganhe relevância além das suas fronteiras se torna referência de vitória, de que é possível vencer as dificuldades e realizar sonhos. Felizmente, Brasília tem muitos desses representantes, o que torna a importância da cidade coerente com a função de capital federal do Brasil.
 

Saiba Mais

 

Como é a proposta de vocês em relação a ser uma banda inclusiva, que luta por direitos?
A Natiruts veio para mostrar um lado que sempre fez parte da cultura de Brasília, mas era desconhecida pelo grande público no Brasil. Esse lado zen/existencialista que nosso céu e nosso cerrado nos lembra todos os dias. Por isso, não é visto por nós como algo caricato ou alienatório como em outros centros urbanos mais densos.

Durante a pandemia, a banda estava com algum projeto em aberto? Como tiveram que se adaptar ao novo cenário da cultura?
Estávamos em turnê. Em 2019, gravamos um DVD, em Buenos Aires, onde reunimos 16 mil pessoas no Luna Park, casa mais tradicional de Buenos Aires. Mas o lançamento desse trabalho estava programado para o final deste ano. Será em formato de filme. Teremos show, documentário, clipes inéditos, história da banda até aqui, tudo reunido num mesmo pacote.

*Estagiária sob supervisão de Igor Silveira

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