recital para ariano suassuna nasceu de forma meio inusitada. Pouco antes de morrer, em 2014, o autor de O romance d;A pedra do reino completava um ciclo de aulas-espetáculos cujo encerramento estava programado para ser feito no Teatro Municipal de São Paulo. Suassuna morreu antes de concluir o ciclo, e Antônio Nóbrega, companheiro de Quinteto Armorial por décadas, foi convidado para completar o programa. Ele criou, então, uma espécie de homenagem ao amigo de vida inteira que acabou se transformando em um espetáculo apresentado pelos palcos do Brasil desde então. A Caixa Cultural recebe hoje o Recital, um pequeno show no qual Nóbrega, munido de violão e violino, ensaia um diálogo com Suassuna por meio de verso e prosa.
Com poemas, trechos de livros e restos de conversas travadas com o amigo, Nóbrega criou um roteiro que recupera o universo de Suassuna. ;São poemas que, de alguma maneira, me tocaram e sensibilizaram, que me geraram interesse em cantar e musicar. São narrativas em versos de histórias que, normalmente, têm um caráter dramático poético. E eu contenho uma vocaçãozinha para cantar dramatizando, representando;, admite.
Muitos dos versos do recital foram extraídos da poesia e da prosa de Ariano, mas Nóbrega admite também ter mergulhado na memória para lembrar de conversas inspiradoras. Assim, criou, por exemplo, A donzela guerreira, canção inspirada em Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa. ;Conversávamos muito sobre Guimarães Rosa;, conta. ;Esse quadro de afeto literário, de alguma maneira, me referenciou.; No recital, Nóbrega também quer incluir algumas músicas de Rima, disco recém-lançado e cheio de criações inspiradas pela convivência com Suassuna.
Nóbrega trocou Pernambuco por São Paulo em 1983, o que rareou a convivência com Suassuna, intensa, principalmente, nos anos 1970, durante as temporadas do Quinteto Armorial. No papel de mestre de cerimônias, o escritor introduzia o público ao mundo da cultura popular, contava histórias e comentava. Durante os ensaios, geralmente feitos na casa de Suassuna, artistas de todas as áreas eram convidados a dar opinião. Nóbrega ficava fascinado. ;Eu me alimentava disso. Funcionava, para mim, quase como uma universidade aberta;, lembra. Suassuna pedia que o Brasil olhasse e valorizasse a produção tradicional e popular para, com ela, criar o novo.
Hoje, Nóbrega acredita que o país ainda não entendeu a mensagem do criador de O auto da compadecida. ;Estamos mal;, observa. ;Ariano sucede uma corrente de pensamento na filosofia onde estão Mario de Andrade e Darcy Ribeiro, criadores que, além de referenciarem suas obras e terem no popular uma das vertentes referentes, foram ativistas culturais, ocuparam cargos de gerenciamento cultural, então mantinham um ativismo no sentido de apresentar o Brasil e trazer à tona elementos que normalmente ficam sob o manto de coisa folclórica.;
Serviço
Recital para Ariano Suassuna
Com Antônio Nóbrega. Hoje e amanhã, às 20h, na Caixa Cultural Brasília. Ingressos: R$ 30 e R$ 15 (meia). Não recomendado para menores de 14 anos