Correio Braziliense
postado em 24/01/2020 04:45
Concorrente a melhor filme, há dois anos, o longa em torno da Segunda Guerra Dunkirk dificilmente se tornará esquecido: houve emprego de uma magnitude na escala visual que ofuscou, pelo foco no preciosismo, vertentes importantes para um longa, entre as quais, a apresentação de dilemas e personagens mais palpáveis. Por pouco, 1917 — a mais nova investida em cinema do diretor Sam Mendes — não se entrincheirou no mesmo modelo, ao investir no retrato da Primeira Guerra. Exibido no quesito técnico (em que alcançou seis das 10 indicações ao Oscar 2020), o filme que teve roteiro de Krysty Wilson-Cairns e Sam Mendes, ao menos soube cercar um enredo envolvente para o espectador. Pesa em muito o ideal (mútuo) da salvação de vidas e mesmo o resgate de corpos que dimensiona o companheirismo entre os personagens.
Simplória, mas crível, a história apresenta a seguinte trilha: dois soldados britânicos devem interromper um avanço de ataque, ao norte da França. Os meios de comunicação, antes, precários; agora inexistem. A mensagem carregada pela dupla poderá evitar a morte de um contingente estimado em 1.600 homens. O tempo é cronometrado, para os supostos heróis, os jovens Blake (Dean-Charles Chapman) e Schofield (George MacKay), que há três anos vivem em campo minado. Blake, com um irmão em notório risco, papel reservado a Richard Madden (Rocketman), abraça uma escala pessoal para execução das ordens superiores.
Sob a engenhosa capacidade do diretor de fotografia Roger Deakins, que traz no currículo 15 indicações ao Oscar (com direito à elaboração de clássicos com pessimistas atmosferas cravadas em 1984 e Foi apenas um sonho), Sam Mendes levanta uma mensagem pacificadora, em que, pelo foco diligente, acaba ignorando o rosto do inimigo. Num dos momentos mais idílicos do longa, um homem canta, sob rigoroso silêncio de soldados, trecho de The wayfaring stranger, que emplaca uma letra embevecida pelo alijamento de elementos como “labuta, doença e perigo”. Episódico, 1917 elabora, a conta-gotas, as cenas em que aparecerão os medalhões do filme, num time (de personagens experientes) que inclui Colin Firth, Mark Strong e Benedict Cumberbatch. Há um deles que comparecerá para ressaltar o risco da manutenção de esperança em meio ao caos.
Sacrifícios e a exaustão do vagar entre palcos de guerra, beirando a fronteira entre inimigos e aliados, são inquestionavelmente registrados no longa de Sam Mendes. A solidez (à qual o público está acostumado) dos aspectos espetaculares da guerra não vem à tona. Mendes explicita a urgência dos riscos — com reforço de um simulacro de plano-sequência, que enriquece a experiência imersiva —, mas se encanta pelo traiçoeiro recurso. A dada altura, o filme acomoda a linguagem do videogame. Em meio a valas de cavalos mortos, de cadáveres dignos de filme de terror, e de muitas pontuações sombrias, Schofield e Blake ficam como à deriva, quase como se subissem numa esteira em direção à iminência do ataque dos compatriotas, desorientados quanto à estratégica retirada dos inimigos.
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