Uma aliança em defesa da manutenção do conteúdo nacional das produções brasileiras de televisão - que reúne parlamentares, representantes do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT)-, deve barrar, nesta semana, a votação na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara do substitutivo do deputado Jorge Bittar (PT-RJ) ao projeto de lei 29.
O projeto abre o mercado de distribuição de conteúdo na TV por assinatura às empresas de telefonia. A disputa começou quando Bittar, além de relatar a proposta original para regulamentar a participação das teles na TV a cabo, resolveu discutir o conteúdo das programações. Na avaliação de boa parte dos deputados e das emissoras de TV aberta, a começar pela TV Globo, ao propor uma "cota de produção nacional" para as emissoras a cabo Bittar pode, na prática, criar um nicho para confinar produtos sem qualidade, ainda que realizados no País.
"É ingenuidade imaginar que o capital internacional (das teles) vai investir no País para construir, por exemplo, um Projac", diz o secretário-geral do Fórum (FNDC), Celso Schr;der, referindo-se ao centro de produção da Rede Globo, no Rio, que emprega milhares de trabalhadores. "Os projetos das teles vão chegar prontos ou vai haver um rebaixamento de qualidade. É preciso cuidar para que o capital que chegar não seja predador.
Enlatados
Ex-ministro das Comunicações, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) vai votar contra o PL 29. Ele diz que o projeto ficou confuso ao tratar ao mesmo tempo de convergência tecnológica e do conteúdo. "Se não separarem os assuntos, vou votar contra."
Em sua avaliação, o Brasil é hoje "um País de ponta em termos de qualidade do conteúdo" das produções da TV aberta. "Acho péssimo se permitir que empresas de telefonia transmitam pay per view (pacotes pré-pagos) e enlatados", diz o ex-ministro. "Empresa de telefonia faz telefonia e empresa de comunicação faz comunicação "
A proposta de Bittar mantém o limite de 30% para a participação das teles na produção de conteúdo e cria um sistema de cotas na programação da TV paga. O objetivo, segundo o relator, é incentivar a produção nacional e independente. Para Bittar, a entrada das empresas de telefonia no mercado de TV por assinatura poderá, nos próximos anos, ampliar o número de assinantes dos atuais 5,3 milhões para 30 milhões.
"Igreja"
Autor do projeto original, o deputado Paulo Bornhausen (DEM-SC) avalia que a inclusão da discussão sobre conteúdo no projeto de lei é "um complicador porque mistura ideologia com profundos interesses comerciais". Ele continua: "A inclusão de conteúdo tende a gerar uma postergação contínua da votação. Afinal, produção não é o foco dessas empresas (teles)."
Contrário à instituição de cotas de produção nacional, Bornhausen promete apresentar um destaque para a retirada desse artigo, durante a votação do PL 29, prevista para esta semana. "A instituição de cotas vai criar um setor despreocupado com a qualidade ao longo do tempo. Vai virar uma igreja", diz. "O consumidor vai receber um pacote que não comprou."
Para o secretário geral da CUT, Quintino Severo, as cotas de produção nacional previstas no projeto podem ser vistas como uma forma de proteger o mercado. "O Brasil tem boas produtoras, que precisam ser estimuladas", diz. Mas a CUT quer mesmo é que o PL 29 não vá a votação e propõe que seja convocada uma "conferência nacional" sobre o assunto. O centro do debate para a CUT é a manutenção do limite de 49% ao capital estrangeiro no cabo. "O projeto deixa tudo nas mãos do capital externo."
O relator Bittar adverte: "Não vou fazer jogo de nenhum grupo privado isoladamente". Na avaliação dele, a maioria dos grupos envolvidos na discussão está a favor do projeto.