Economia

Crédito mais caro e difícil

Aperto do BC deverá ser seguido por bancos e lojistas. Expectativa é de que a oferta de financiamentos caia à metade e os juros do consignado cheguem ao teto

postado em 27/07/2008 08:27
Os brasileiros que, nos últimos três anos, se empanturraram de crédito podem se preparar para botar o pé no freio. Além de reduzirem em até 50% a oferta de dinheiro para empréstimos e financiamentos, os bancos vão aumentar ainda mais as taxas de juros, seguindo o movimento de aperto monetário conduzido pelo Banco Central. ;Não tem jeito. Neste último trimestre e nos primeiros seis meses de 2009, teremos um mercado de crédito mais seletivo e mais caro;, diz André Malucelli, diretor-executivo do Paraná Banco, especializado em empréstimos com desconto em folha. Esse movimento começou a se evidenciar a partir do início de maio, quando o mercado sentiu efetivamente o baque do primeiro aumento da taxa básica (Selic), realizado em 16 de abril. Desde então, os juros começaram a apontar para cima e a inadimplência, a crescer. ;O mercado teve que se reorganizar para se adaptar ao novo cenário, que passou a combinar dinheiro mais caro, inflação em alta e crise externa;, conta Malucelli. Mas foi neste mês, quando todos se deram conta de que o arrocho monetário será maior do que o esperado, que os bancos decidiram endurecer de vez as regras para a concessão de crédito. ;Nos empréstimos consignados, veremos as taxas encostando nos limites máximos dos juros permitidos para cobrança;, avisa. Na média, acrescenta o diretor do Paraná Banco, o mercado vinha trabalhando com taxas mensais de 1,9%. Agora, no caso dos servidores públicos federais e dos aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), os juros baterão no teto de 2,5% ao mês fixado pelo governo. No caso dos funcionários de estados e municípios, o caminho será o mesmo, com exceção dos servidores de algumas prefeituras, como a do Rio de Janeiro, em que a taxa limite é de 2% mensais. Mas independentemente dos juros maiores, acredita Malucelli, os bancos e as lojas vão preferir ficar com parte do dinheiro aplicada em títulos públicos, cujos rendimentos estão em 13% ao ano, com riscos mínimos, e devem bater em 14,75% até dezembro. ;Por isso, a menor oferta de recursos;, ressalta. Desaceleração Na avaliação de José Renato Borba, consultor-técnico da vice-presidência de Pessoas Físicas da Caixa Econômica Federal, a desaceleração do crédito será inevitável, diante do compromisso do Banco Central com o combate à inflação. Ele conta que, mesmo com os juros tendo subido a partir de abril, a procura por crédito direto ao consumidor (CDC), usado especialmente para a compra de bens duráveis (eletrodomésticos, por exemplo), e pelo crédito pessoal foi menor do que a verificada em 2007. Em média, neste ano, as liberações de empréstimos e financiamentos a pessoas físicas estão avançando a um ritmo entre 1,4% e 1,5% ao mês, ante os 2% e 2,2% mensais computados no ano passado. Para José Luiz Rodrigues, sócio-diretor da Consultoria JL Rodrigues, a tendência é de que o ritmo de crescimento do crédito despenque à metade do verificado na média dos últimos três anos, ou seja, de 30% para 15%. ;Há muito receio em emprestar dinheiro, principalmente entre os bancos de menor porte e entre as tradicionais financeiras;, afirma. ;Esse receio está baseado na possibilidade de a inadimplência disparar. A inflação aumentou muito e tirou o poder de compra dos mais pobres, justamente os que vinham tomando mais crédito. Entre as financeiras, que atendem o público de baixa renda, há instituições lidando com índice de calote de até 20%;, destaca. O resultado: as taxas de juros para empréstimo pessoal nesse segmento saltaram para inacreditáveis 15% ao mês ou 435% ao ano. Taxas semelhantes estão sendo cobradas pelos bancos no cheque especial e pelas administradoras de cartões de crédito. ;Hoje, mesmo um cliente considerado de alto nível, dificilmente paga juros menores do que 6% ao mês no cheque especial;, diz Rodrigues. Diretor do Banco Fator, Valdery Albuquerque ressalta que são os devedores contumazes os que mais sofrerão com o aumento dos juros, pois o sistema financeiro e as lojas cobrarão cada vez mais caro para a rolagem dos débitos. Ele destaca ainda que as famílias que entraram em financiamentos imobiliários corrigidos por taxas de juros e índices de preços também sofrerão para pagar o que devem. ;Há contratos atualizados pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM), que, nos últimos 12 meses, subiu 14%. A esse percentual, estão sendo adicionados mais 12% de juros ao ano;, exemplifica. Restrição a veículos As vendas de automóveis, que têm assegurado desempenho recorde ao varejo brasileiro, não ficarão imunes em relação ao aperto monetário, ampliado na última quarta-feira quando o Banco Central elevou a taxa básica de juros (Selic) em 0,75 ponto percentual, para 13% ao ano. ;Os setores que trabalham com bens duráveis, como o de veículos, são os que mais sentirão o aumento dos juros;, afirma Marcelo Carvalho, diretor do Grupo PaulOOctávio, dono de concessionárias no Distrito Federal. ;São operações mais afetadas por decisões de curto prazo na política econômica;, acrescenta. Para Newton Rosa, economista-chefe da Sul América Investimentos, a restrição maior ao crédito será saudável para o país, pois ajudará a acomodar o consumo e a reduzir as pressões sobre os preços. ;É por isso que o BC está elevando os juros;, afirma. Na opinião de Paulo Rogério Caffarelli, diretor de Novos Negócios do Banco do Brasil, há um amplo espaço para o crédito crescer no Brasil, principalmente o voltado para a compra da casa própria, cujo saldo representa menos de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Segundo o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, Carlos Thadeu de Freitas Gomes, o fôlego menor do crédito derrubará o crescimento da economia para taxas entre 3% e 4% no próximo ano.

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