postado em 10/08/2008 20:52
Ao chamar de "caótico" o atendimento ao público, a nova secretária da Receita Federal do Brasil, Lina Maria Vieira, expôs apenas um ponto de tensão interna no órgão. Com 28 mil servidores, 573 unidades em todo o País, a Receita vive hoje um momento de intranqüilidade que ganhou visibilidade com a troca de comando, no fim de julho.
A criação da Super-Receita, que unificou a Receita Federal com a Secretaria de Receita Previdenciária, criou uma crise de identidade que, um ano depois da fusão, ainda não foi resolvida. Um dos problemas é que os servidores não se sentem funcionários da mesma empresa.
Além da insatisfação dos servidores que vieram da Previdência Social - motivo que agravou o atendimento aos contribuintes -, os auditores fiscais ameaçam retomar a greve em retaliação ao descumprimento do acordo salarial fechado com o governo no fim de junho. A categoria, que ficou em greve mais de 50 dias este ano, argumenta que o governo até agora não cumpriu a promessa de editar uma medida provisória (MP) com o reajuste salarial e um plano de reestruturação e promoção da carreira. O corte no ponto dos dias parados é outro foco de tensão.
"Se o problema não se resolver, podemos voltar com a greve", disse o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco), Pedro Delarue. Segundo ele, os auditores vão realizar protesto com paralisações em todo o País.
A crítica da secretária não surpreendeu os auditores. "Ela expõe um segredo de polichinelo. Todo mundo estava sabendo", disse Delarue. Lina Vieira atribuiu os problemas no atendimento à má condução do processo de criação da Super-Receita. A declaração foi feita em um seminário interno da Receita na tentativa de aliviar o estresse nas relações entre os funcionários dos dois órgãos e a insatisfação com a forma como ex-secretário Jorge Rachid conduzia o processo.
Privilégio
Para muitos servidores, Rachid sempre priorizou as áreas de arrecadação, fiscalização e política tributária, em detrimento dos setores que atuam na ponta. Também há uma percepção de que o órgão perdeu força nas discussões sobre políticas tributárias, como desonerações de impostos e reforma tributária.
Embora tivesse a intenção de fazer um discurso de aproximação, Lina acabou sendo surpreendida com a repercussão de sua fala - sem saber que havia jornalistas no auditório.
A troca de comando também criou um clima de expectativa com as mudanças internas. Depois de 13 anos com o mesmo grupo no comando, é aguardada uma ampla mudança em todas as áreas. Esse processo não deverá ser feito rapidamente para não trazer problemas de descontinuidade.
Para resolver os conflitos de competência que surgiram com a fusão, os servidores reivindicam uma proposta de lei orgânica para regular o funcionamento do órgão e das carreiras. Segundo o presidente da Federação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Fenafisp), Lupércio Montenegro, essa é um das prioridades na lista de pleitos, além da MP do reajuste salarial e da negociação dos dias parados.
A falta de pessoal nos Centro de Atendimento ao Contribuinte (CACs) será agravada com o retorno dos servidores que vieram da Previdência após a fusão para o seu órgão de origem. Dos 5 mil funcionários transferidos, 2,5 mil já optaram por retornar ao INSS porque não tiveram equiparação salarial com os servidores da Receita.
"São atribuições iguais e não deveriam ter diferença de salários", disse a vice-presidente da Associação dos Servidores da Receita Previdenciária (Unaslaf), Valdete Rolin. A escassez de pessoal prejudicou uma das principais vantagens da fusão: o atendimento com hora marcada pela internet, que deveria acabar com as filas nas unidades. Mas, com a falta de pessoal e de treinamento, o contribuinte enfrenta uma fila virtual, sem conseguir senha para o agendamento.