Economia

Ministério Público investiga fraude na "bolsa-anzol"

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postado em 29/08/2008 09:29
O que deveria ser o milagre da multiplicação dos peixes no Brasil virou o milagre de uma fraude: o da multiplicação de benefícios sociais. Hoje, oficialmente, a pesca artesanal representa pelo menos 60% da produção de pescado do país. Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT), chegaria a 90% o universo de pescadores que se apresentam nessa categoria. Mas o número não passaria de camuflagem para uma realidade bem diferente: a grande maioria, na verdade, está a serviço da indústria pesqueira. E o motivo da manobra é simples: livrar as empresas do setor dos encargos trabalhistas e obter de forma irregular o recebimento da ;bolsa-anzol;. Os procuradores que apuram o caso afirmam que um volume muito alto dos recursos são pagos de forma fraudulenta. Entre 2002 e 2008, o montante gasto com o seguro cresceu 10 vezes. Hoje são 350 mil pescadores que representam uma conta de cerca de R$ 642 milhões por ano. O seguro-defeso, batizado a contragosto do governo de ;bolsa-anzol;, corresponde a um salário mínimo pago aos pescadores artesanais no período de quatro meses de reprodução dos peixes, quando a pesca é proibida. Uma força-tarefa de procuradores do trabalho foi criada para regularizar a situação. ;Infelizmente, acreditamos que a fraude pode chegar a 90% do que é pago hoje;, destaca o vice-coordenador do grupo, o procurador do Trabalho, Ronaldo Curado Fleury. Ele é coordenador Nacional de Trabalho Portuário e Aquaviário da Procuradoria Geral do Trabalho. Grupos de empresários do setor pesqueiro mantêm relações de trabalho com milhares de pescadores informalmente, sem carteira assinada. A empresa, dessa forma, fica isenta dos encargos trabalhistas, mas paga um salário ao pescador que, ao mesmo tempo, fica desimpedido para receber o auxílio do governo federal. O Ministério Público quer impedir a burla às leis trabalhistas e assim, de quebra, coibir o pagamento irregular da ;bolsa-anzol;. Os procuradores estão realizando vistorias em diversos estados. No Pará, quatro empresas foram consideradas irregulares. Há casos de firmas com mais de 20 barcos que não fornecem qualquer cobertura legal aos trabalhadores que lhe prestam serviço. Estão na mira empresários de Fortaleza, Sergipe e Rio Grande do Norte. Fleury explica que o Ministério Público do Trabalho está regularizando a situação com a assinatura de Termos de Ajuste de Conduta (TAC) em que as empresas se comprometem a formalizar a relação de trabalho com os pescadores. Assim, eles terão de sair do cadastro da ;bolsa-anzol;. Cerca de 30 TACs já foram assinados. O Ministério do Trabalho, que é responsável pelo pagamento dos benefícios, já detectou outras irregularidades no cadastro, como a inclusão do nome de pessoas que nunca entraram num barco nem manusearam uma rede de pesca. Corte O Ministério da Pesca apóia a ação dos procuradores e afirma que também vem criando mecanismos para melhorar o controle do cadastro dos pescadores credenciados a receber o benefício. O órgão reconhece que há distorções e que podem ocorrer algumas irregularidades, mas que o universo da fraude não seria em tão larga escala como o Ministério Público aponta. ;Se isso ocorre, não é com a anuência do governo. Estamos, pelo contrário, cortando benefícios. Com o recadastramento que fizemos, somente no último ano, caiu de 26 mil para 11 mil o número de pescadores de lagosta com direito a receber o seguro;, esclarece o secretário-executivo interino do Ministério da Pesca, Karim Bacha. O secretário avalia como equivocadas as críticas ao órgão por gastar muito com seguro-defeso e não conseguir aumentar a produção pesqueira. Hoje é de 1 milhão de toneladas de pescado por ano. Em plena semana do peixe, o órgão comemora com os supermercados aumento de 100% nas vendas comparado ao mesmo período do ano passado. ;Não podemos ter uma visão simplista da coisa. O ministério gasta muito com pescador e não aumenta a produção. Ora, esses pescadores já existiam há anos, estavam abandonados pelo Estado. O governo Lula legalizou a situação deles, garantiu o cumprimento do direito que eles têm como trabalhadores. O aumento do pagamento do benefício é um avanço social;, argumenta Bacha. Com a recente tentativa de transformar a Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca em Ministério da Pesca, o assunto ficou ainda mais espinhoso. Nos últimos cinco anos, a então secretaria consumiu R$ 1,3 bilhão em recursos de custeio e investimento, mas pouco conseguiu elevar a produção brasileira. O país ocupa a 20ª posição no ranking mundial dos produtores de pesca, atrás de países como Chile e Peru. Segundo Bacha, a produção pesqueira é maior do que o número oficial. ;As pesquisas estatísticas não são abrangentes. Acreditamos que nossa produção real chegue a 1, 3 milhão toneladas por ano;, aposta. O Ministério da Pesca volta a ser secretaria, já que o governo federal anunciou a decisão, ontem à noite, de retirar a medida provisória que promovia o órgão para abrir espaço para o envio das MPs que reajustam os servidores públicos. ;É uma questão de forma e não de mérito. O setor precisa da atenção de um ministério. Se não for por medida provisória, será por projeto de lei com pedido de urgência;, comentou Bacha. Deve ser enviado ao Congresso um projeto de lei, com pedido de votação urgente, elevando a secretaria a ministério novamente.

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