Economia

Câmara na Argentina aprova plano para nacionalizar previdência

;

postado em 07/11/2008 10:51
Os deputados argentinos aprovaram, nesta sexta-feira (7/11), a nacionalização da previdência privada argentina, após 14 horas de debates que tinham começado na manhã da véspera. A votação superou expectativas do governo e da oposição e contou com 162 votos a favor, 75 contra e 19 abstenções. O projeto de lei será enviado ao Senado, onde o governo espera que a votação seja realizada no dia 20 próximo. O projeto prevê o fim da previdência privada, criada em 1994, e a transferência dos recursos acumulados neste período para o Anses (a previdência estatal). Estima-se que o caixa estatal receberá das chamadas AFJPs (Administradoras de Fundos de Pensão e de Aposentadorias) um total de US$ 30 bilhões, além da contribuição anual dos que estão ligados a este sistema. Além desses recursos, com o fim da privatização, o governo argentino passará a ter ações em várias empresas privadas, em que recursos das AFJPs tinham sido investidos. Entre as empresas, destacam-se, Alpargatas, do Grupo Loma Negra, com capitais brasileiros, Telecom, Grupo Clarin, e Consultatio, entre outras, como informaram a TV América e a revista Fortuna. Questões O anúncio do plano de nacionalizar a previdência privada foi feito pela presidente Cristina Kirchner há cerca de 20 dias e, num primeiro momento, provocou uma queda histórica do índice Merval da Bolsa de Buenos Aires e uma corrida ao dólar - o que é uma tradição na Argentina, em tempos de instabilidade. O anúncio de Cristina também gerou temor entre as empresas em que o governo passará a ter ações. Segundo um assessor de comunicação de uma delas, seria o "temor de que algum dia queiram estar presente na direção da companhia". Ao mesmo tempo, o governo determinou que recursos das AFJPs (em torno de US$ 550 milhões) aplicados na Bolsa de Valores de São Paulo fossem repatriados até esta semana. As AFJPs apresentaram uma proposta alternativa à do governo, que incluía a redução da cobrança das comissões aos contribuintes, mas esta foi rejeitada pela base governista. "Por que só agora eles querem fazer mudanças nesta previdência? Por que não sugeriram antes? Então, é mais um sinal de que tínhamos razão", disse Cristina, em um discurso esta semana. O debate sobre a previdência social, nesta madrugada, foi marcado por momentos de tensão, com parlamentares de oposição questionando as intenções do governo. "Vamos votar contra porque o governo só está interessado em resolver seus problemas de caixa. E o uso destes recursos não terá como ser controlado", disse o deputado Adrián Pérez, da opositora Coalizão Cívica. Segundo ele, no ano passado, a maioria dos contribuintes destes fundos fez a opção por continuar no sistema privado e não ser transferido para o sistema estatal. "Portanto, por que o governo quer essa nacionalização agora, às pressas? Só confirma que precisa de dinheiro no caixa", insistiu. Defesa dos aposentados Por sua vez, a deputada Patricia Vaca Narvaja, da Frente para a Vitória, defendeu a medida: "Nossa única preocupação é com os aposentados e futuros aposentados. Nós queremos defender os recursos que lhe correspondem. O dinheiro das AFJPs estava aplicado no mercado financeiro e este só vinha perdendo valor com a atual crise financeira internacional", disse. Assim que a votação foi concluída, o líder do governo na Câmara dos Deputados, Agustin Rossi, da Frente para a Vitória, declarou que a previdência privada era "uma das últimas bombas, da década de noventa, que tínhamos que desativar". A "década de noventa", como o governo da presidente Cristina Kirchner costuma afirmar, é uma referência aos dez anos de administração do ex-presidente Carlos Menem (1989-1999), quando ocorreram as privatizações. Mas a aprovação desta madrugada parece não ter diminuído a polêmica. "Pior impossível. O projeto não reconhece nosso direito de propriedade. Nós que contribuímos para ter uma aposentadoria melhor, vamos ganhar menos do que os que estão na previdência estatal", afirmou o jornalista e analista do jornal La Nación, Adrian Ventura. "Além disso, quem garante que estes recursos serão bem aplicados? O projeto prevê a criação de organismos de controle do uso deste dinheiro. Mas na Argentina, estes organismos nunca funcionaram. O governo também vai poder comprar títulos públicos com este dinheiro. Ou seja, fazer aquilo que tinha criticado das AFJPs. Repito, pior impossível." Nas emissoras de rádio e de TV também surgiram vozes contra e a favor da iniciativa do governo. "O governo não tinha o direito de promover uma nacionalização assim, às pressas. Mas a verdade é que nosso dinheiro também não vinha sendo bem aplicado pelas AFJPs", afirmaram na TV América e no Canal 13 de televisão.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação