postado em 12/11/2008 08:29
As suspeitas de irregularidades no concurso do Senado estão ficando mais fortes. Primeiro foram as reclamações duras e intensas dos candidatos quanto à organização no último domingo, quando os candidatos foram avaliados. Agora, as provas são questionadas por ferir o critério de ineditismo e, por conseqüência, atingir a credibilidade da seleção.
A prova aplicada para o cargo de analista legislativo ; engenharia mecânica apresentou 20% das 41 perguntas de conhecimento específico iguais às aplicadas nos concursos da Eletronorte e do Centro de Pesquisa de Energia Elétrica (Cepel), realizados em 2006 e 2005, respectivamente. O Núcleo de Computação Eletrônica (NCE/UFRJ) foi responsável pela elaboração das provas que avaliaram os conhecimentos de engenheiros mecânicos. O Correio levou as nove questões ;suspeitas; para que os professores de física do Colégio Marista, Daniel Peters Gusmão e Petrus Barros analisassem. Oito foram consideradas iguais. ;Não há só semelhança, a maioria é tão igual que os desenhos usados e a ordem das respostas se mantêm os mesmos;, diz Petrus.
;Quem tiver feito essas provas antes conseguiria responder de novo e com muito mais rapidez;, avaliou Gusmão. Eles observaram que a igualdade entre os enunciados não ignorou nem as letras usadas para representar as grandezas. ;A FGV não mudou nem as letras, a cópia está idêntica;, comentaram. Mesmo assim, os professores de física elogiaram a profundidade e a abordagem usadas. ;Estão bem diversificadas e capazes de selecionar bem os candidatos;, ponderou Daniel.
Entre a prova do Cepel e do Senado uma diferença é perceptível: o tipo de avaliação, ou seja, enquanto o teste aplicado no último domingo oferece múltiplas escolhas, o candidato do centro de pesquisa teve que demonstrar o cálculo, pois a prova era discursiva. ;Ainda que tenha que descrever os cálculos, a resposta será a mesma que é pedida para a avaliação do Senado;, descreveu Barros.
A questão 49 da prova do órgão legislativo é muito semelhante à pergunta 11 aplicada no Cepel, em 2005, porém, os professores observaram que a abordagem foi diferente. ;No Senado foi usado um exemplo de elevador, e no Cepel dos fios de alta tensão. A resposta final pode até ser a mesma, poderiam ter usado isso como exemplo em vez de copiar como fizeram;, sugeriu Petrus.
O professor de engenharia César de Oliveira Frade discorda dos professores Daniel e Petrus. ;As questões são muito parecidas mesmo, mas o enfoque da resposta é outro;, diz. ;Concordo que houve uma cópia, mas da forma como foi feita a pergunta há ineditismo. Existem vários exemplos desses, onde a pessoa troca a vírgula de lugar, coloca um aposto e a questão se repete;, esclarece. Frade acrescenta que somente duas instituição fazem provas inéditas. ;Na verdade, as instituições que efetivamente fazem provas são Esaf e Cespe ;, conclui.
Contrato
O advogado José Sena, que é especializado em concursos públicos, afirmou que esse tipo de ocorrência pode resultar em anulação. ;As organizadoras são contratadas para elaborar o concurso como um todo, inclusive com questões novas.; Ele explica que o princípio do mérito também é ferido. ;Se é possível favorecer um grupo de candidatos, aqueles que já fizeram as provas que têm as mesmas questões, então não há seleção isonômica;, esclarece Sena.
Em outras ocasiões, segundo o advogado, a alta incidência de questões idênticas levou o Ministério Público Federal a pedir anulação de todas as provas de mais de um concurso. ;Isso já aconteceu no Rio Grande do Sul, com o concurso do Grupo Hospitalar Conceição (elaborado pela Fundação Universidade-Empresa de Tecnologia e Ciências), e em Recife, na Companhia Hidroelétrica do São Francisco;, comenta.
O cargo de analista legislativo, com especialidade em engenharia mecânica, tem só uma vaga e foi disputado por 171 candidatos. Ao todo, o concurso do Senado teve 42.970 inscritos que fizeram prova no último domingo em seis capitais e em Brasília. Desde então, candidatos de várias cidades reclamaram da organização precária da Fundação Getúlio Vargas e da falta de fiscalização durante as provas. Entretanto, nenhuma denúncia chegou a ser protocolada oficialmente no Ministério Público Federal no DF até a tarde de ontem.