Economia

Com a crise, exploração do petróleo do pré-sal vai demorar mais

;

postado em 04/01/2009 09:24
Os efeitos da crise financeira internacional podem forçar o Brasil a percorrer um caminho mais longo para alcançar a tão almejada autossuficiência em petróleo na próxima década. É claro que os abalos da turbulência mundial na economia brasileira não se comparam nem de longe aos vividos em crises anteriores, quando a dependência do mercado externo era bem maior, mas como qualquer outra empresa, a Petrobras não deve passar ilesa à crise. Em um cenário de preços do barril de petróleo em queda livre, especialistas observam que a estatal terá que mudar de postura e reavaliar projetos para 2009 para poder sustentar os planos de exploração da camada pré-sal. O ;bilhete premiado; ; forma pela qual o presidente Lula tem se referido às descobertas de megacampos de petróleo ; está garantido. Mas é preciso cautela e planejamento para explorar esse tesouro da maneira e no tempo ideais. ;A expectativa é que chegaremos em 2015 numa situação substancial, com exploração de 1 milhão de barris por dia do pré-sal. Até lá, temos que esperar. O Brasil vai emergir com a consolidação de sua autossuficiência e como grande exportador de petróleo;, acredita o geólogo de petróleo Giuseppe Bacoccoli, que trabalhou durante 24 anos na Petrobras e atualmente é pesquisador visitante da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ). Nos últimos anos, o déficit da balança comercial brasileira de petróleo despencou. De 2000 para 2008, por exemplo, as importações do combustível ficaram quase cinco vezes menores, despencando de US$ 14,16 bilhões para US$ 3,03 bilhões, considerando dados até novembro. As projeções de curto e médio prazo também corroboram a autossufuciência e capacidade de exportação de petróleo pelo país. Já em 2010, o Brasil deve atingir a produção de 3,2 milhões de barris por dia, ultrapassando o consumo, estimado em 2,5 milhões de barris diários para aquele ano. Em 2030, a produção será quase o dobro da demanda no país (veja quadro). Está previsto para março o teste de longa duração no campo de petróleo de Tupi, localizado na Bacia de Santos. Mas o mais prudente seria postergar a exploração nessa área e antecipar a do Parque das Baleias, na parte capixaba na Bacia de Campos, segundo Adriano Pires, professor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). ;O pré-sal foi anunciado no fim de 2007, com a descoberta de Tupi, com muita pompa, com preço do petróleo alto, que teve o pico em junho, a US$ 147. Com a crise, o plano de investimentos da Petrobras, assim como de todas as empresas, vai mudar. A crise de crédito no mercado internacional faz com que se tenha menor perspectiva de investimentos na comparação até meados do ano;, diz. ;No Espírito Santo, o potencial de exploração é menor, mas o custo de investimento é mais barato e o desafio tecnológico já foi vencido, o que pode dar um resultado mais imediato. Em Santos, é mais caro e ainda temos um obstáculo tecnológico a vencer;, explica. Há poucos dias, o diretor de Exploração e Produção da Petrobras, Guilherme Estrella, afirmou que está sendo avaliada a antecipação da entrada em operação de poços situados no Espírito Santo, mas não foi informada nenhuma alteração do cronograma de exploração de Tupi. Serão dois poços, com retirada de 20 mil a 30 mil barris por dia. Em 2010, a previsão é de entrada de um módulo de 100 mil barris por dia, que será ampliado para 500 mil a partir de 2015. As incertezas sobre o mercado de petróleo para este e os anos seguintes foram demonstrados pela própria Petrobras, que pela segunda vez no governo Lula começará um ano sem saber quanto irá investir. José Sergio Gabrielli, presidente da estatal, assegurou, porém, que serão superiores a 2008 e que isso não comprometerá o andamento de projetos e nem a estimativa positiva para a produção de 2009. ;A produção de 2009 depende de decisões de cinco anos atrás. A decisão sobre os investimentos de agora só vai impactar projetos em 2014/2015;, afirmou. Segundo o executivo, a produção da empresa cresceu entre 3% e 5% em 2008. A Petrobras ressaltou que o Conselho de Administração reiterou que a política de investimentos da companhia está mantida e que as avaliações existentes sobre os investimentos no pré-sal indicam a viabilidade dos projetos. Ajustes Para Adriano Pires, do CBIE, a Petrobras terá que voltar a planejar a geração de caixa e fazer redução de custos e despesas para 2009, 2010 e 2011. ;Claro que a diretoria não vai falar isso, mas terá que rever investimentos anunciados;, provoca. Pires acredita que os projetos de construção de cinco novas refinarias, e o próprio Centro de Integração do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), serão postergados ou abandonados. Praticamente nenhum investimento deve ser feito fora do Brasil. ;Pelo lado do custo, a Petrobras terá que renegociar com fornecedores, do lápis à plataforma. Não pode sair comprando empresas sem critério. Patrocínios culturais e contratação de terceirizados terão que ser revistos;, observa. Uma vez conquistado o posto de grande exportador, Giuseppe Bacoccoli, da Coppe-UFRJ, descarta a possibilidade de o Brasil fazer parte do rol de países que entraram na rota da maldição do petróleo. Ou seja, economias como Arábia Saudita, Nigéria e Líbano, que se tornaram extremamente dependentes do ;ouro preto; e quando a cotação do barril desaba, vira um caos. ;Não é o caso do Brasil, que é grande exportador de commodities e tem um parque industrial complexo. O petróleo não é o único meio de sobrevivência. Temos campos de urânio, um parque industrial desenvolvido e biomassa;, afirma. Faltam critérios Porém, é unanimidade entre os analistas a necessidade de definição de critérios claros e seguros para uso dos recursos oriundos do pré-sal. ;Esse dinheiro não cai do céu. Não é uma loteria. Essa é uma das causas da maldição. Tem que investir para produzir;, ressalta Bacoccoli. Ele acredita que isso é possível sem mudanças na legislação do petróleo. ;O modelo regulatório é o de menos. Hoje, a Petrobras é bastante séria, tem a ANP (Agência Nacional do Petróleo), que fez 10 anos, e pelo que a gente sabe também gerencia. Sem isso, pareceria arriscado;, diz. Adriano Pires explica que ;o Brasil tem que ter uma política específica, pois o petróleo passou a ter papel importante para o PIB brasileiro, mas sem acabar com o parque industrial. Tem que evitar a aplicação de forma populista e política. A proposta não é como se vai gastar o dinheiro, mas como vai transformar isso em riqueza, como atrair investimentos e superar o desenvolvimento tecnológico;, ressalta. O especialista também é contra mudanças na Lei do Petróleo. ;Como transformar petróleo em riqueza? Tem que achar uma alternativa, como o fundo soberano. Tem que ter cuidado para usar os recursos sem gerar inflação, nem afetar as indústrias instaladas no país;, reforça.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação