postado em 20/06/2009 08:21
Produtor experiente e dono de uma das granjas mais modernas do Distrito Federal, Evando Limongi não bateu palmas para o casamento bilionário celebrado no mês passado entre Sadia e Perdigão. O surgimento da Brasil Foods (BRF) - gigante mundial em comida industrializada - virou motivo de apreensão para ele e outros avicultores integrados do DF. Com a fusão, os empresários locais que atuam nesse ramo temem pelo futuro da atividade e cogitam até mesmo fundar uma integradora independente caso as negociações não avancem.
Prevendo dores de cabeça em vez de lucros, os cerca de 160 proprietários de granjas que trabalham em regime de integração e atendem à Sadia têm se reunido com frequência para discutir os impactos da megaparceria. 'Somos muito mal remunerados pelo tanto que a gente faz. O pessoal está com medo do que poderá vir por aí', diz Limongi, que tem dois galpões lotados de aves - aproximadamente 50 mil frangos - no Núcleo Rural Alexandre Gusmão.
[SAIBAMAIS] No DF, não há nenhuma unidade da Perdigão instalada, apenas uma fábrica da Sadia. Maior exportadora local, ela emprega 2.450 pessoas, tem capacidade para abater 250 mil frangos por dia e de produzir 120 toneladas de salsicha. A empresa beneficia frangos inteiros, cortes e miúdos. Os alimentos são comercializados no mercado interno e exportados, sendo que parte da produção embarca para o Oriente Médio, Rússia, Hong Kong, Argentina, Japão e Venezuela. As vendas da fábrica de Samambaia ao exterior representaram 72% das exportações brasilienses no ano passado (US$ 119,3 milhões).
Juntamente com os grãos, a avicultura desempenha um papel fundamental para o agronegócio do DF e Entorno. Pelos postos de trabalho, faturamento anual e tecnologia aplicada ao processo produtivo, o segmento é reconhecido como uma das principais engrenagens da economia rural da região. Tanta incerteza e pessimismo, advertem os produtores, podem interferir nos negócios e inibir novos saltos.
Na integração, o produtor entra com a terra, investe na construção dos galpões e contrata os funcionários. A empresa que adquire a matéria-prima repassa os pintinhos, presta assessoria técnica, monitora a criação e fornece a ração e outros insumos a custos compartilhados. O modelo é considerado um dos mais funcionais pelo agronegócio, mas é criticado pelos produtores.
Golias X Davi
A BRF ainda aguarda sinal verde do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para nascer oficialmente, mas já ostenta números grandiosos: receita líquida de R$ 22 bilhões, 42 indústrias, quase 120 mil funcionários e presença em 110 países. A multinacional será líder de vendas de congelados e resfriados de bovinos, suínos e aves, além de massas, pizzas, margarinas, lácteos, vegetais congelados, óleos e fast food. Tanto gigantismo preocupa os produtores do DF. 'Acho essa fusão assustadora porque pode virar um cartel', completa Limongi.
O Sindicato dos Avicultores do DF (Sindiaves) vem reunindo forças para pressionar os administradores da Sadia e da nova empresa de alimentos. A entidade adverte que houve queda acentuada das receitas dos avicultores nos últimos anos e que o cenário de médio prazo não é nada animador. 'O integrado é tratado como empregado e isso ele não é. O empresário fez investimentos e precisa ser mais bem remunerado', explica Luiz Gonzaga Lopes, presidente do sindicato.
Promessa de estabilidade
Mesmo com a criação da Brasil Foods (BRF), nada muda para os produtores de aves que mantêm contratos com a Sadia. Pelo menos essa é a promessa feita pela empresa aos integrados do Distrito Federal e de outras regiões do país. De acordo com a companhia, a fábrica de Samambaia não passará por qualquer mudança: por enquanto, funcionários estão mantidos e a produção, de pé.
Com a fusão, 68% da BRF ficará nas mãos da Perdigão e outros 32%, nas da Sadia. Em processos corporativos desse porte as companhias envolvidas, em geral, conservam em ;banho-maria; as pressões que recebem dos fornecedores. Se a receita do produtor não condiz com o investimento realizados ou com as expectativas que o negócio reservava antes da primeira ave ser entregue, as chances de uma renegociação de preços neste momento, como desejam os avicultores do DF, são reduzidas.