Economia

Brasil começa pela China comércio com moedas locais

postado em 27/06/2009 16:33

O Brasil inicia os trabalhos para a implementação de moedas locais e a substituição do dólar nas exportações com seu maior parceiro comercial: a China. Hoje, na Basileia, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, se reuniu com o presidente do BC chinês, Zhu Xiaochuan, e decidiram iniciar o processo.

O objetivo do governo é dispensar gradativamente a moeda americana nas relações com a China e, assim, reduzir a volatilidade nas transações. No médio prazo, a esperança do Brasil é de que alguns produtos comecem a ser cotados não mais em dólares, mas em moedas locais.

Já sobre a possibilidade de isso significar uma marginalização do dólar como moeda reserva, Meirelles alerta que não existe uma alternativa viável.

"Acertamos o início dos estudos para a implementação do comércio em moeda local", afirmou Meirelles, que está na Basileia para encontros no Banco de Compensações Internacionais. "Vamos sair gradativamente do dólar como moeda do comércio entre os dois países", afirmou o presidente do BC.

Depois de dois anos de trabalhos, o Brasil conta com o mesmo mecanismo no comércio com a Argentina e pretende implementar o sistema com o Uruguai até setembro deste ano. No comércio com a Argentina, o mecanismo criado pelo Brasil responde por menos de 1% do comércio bilateral. Mas Meirelles aposta que essa taxa vai crescer diante da decisão de implementar também um mecanismo de financiamento em moeda local.

Com a China, que em 2009 se transformou no maior parceiro comercial do Brasil, Meirelles admite que não sabe quanto tempo o processo levará para ser implementado. Mas não acredita que os dois países precisarão de outros dois anos.

A decisão política já foi tomada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em uma recente viagem à China e reconfirmada na primeira reunião de cúpula dos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) há duas semanas.

Tanto o governo da China como da Rússia vem aumentando o tom de críticas contra o dólar e pedindo que alternativas sejam pensadas à moeda americana. Meirelles admite que o único obstáculo hoje é operacional para o uso do real e do yuan no comércio.

Um dos problemas seria a compatibilização dos sistemas de informática. O BC vai enviar uma missão de técnicos para estudar o software chinês. Mas, para Meirelles, o principal ganho do exportador estará na redução da volatilidade.

"O movimento do dólar vem complicando (as transações)", afirmou o presidente do BC. Num momento de incerteza do dólar, o uso da moeda americana adiciona volatilidade no comércio. Meirelles conta que as empresas brasileiras vem se queixando da volatilidade do dólar em relação ao real. "Com o uso de moedas locais, estamos eliminando essa volatilidade e o exportador tem importantes ganhos operacionais", disse.

O presidente do BC lembra que um exportador é obrigado a fechar um contrato de câmbio de real para dólar e depois de dólar para a moeda do país importador. "O exportador ganha em tempo, custo e facilidade operacional, além de sair da volatilidade do dólar", disse.

Cotação
Outro objetivo de mais longo prazo do Brasil é de abrir a possibilidade para que alguns produtos e commodities deixem de ser cotados em dólar e passem a ser cotados em moedas locais. Para isso, porém, o número de acordos como o que o Brasil começa a fechar com a China terá de ser ampliado. "Quanto mais países começarem a usar moedas locais, o processo começa a adquirir massa crítica e produtos podem ser cotados em moedas locais e deixando de ser cotado em dólar", disse Meirelles.

Além da China, Argentina e Uruguai, o Brasil quer acordos com a Rússia e Índia. Especialistas alertam, porém, que esses mesmos países que querem uma nova forma de promover seus comércios estão em uma situação delicada: suas reservas de mais de US$ 2,7 trilhões estão em dólar e uma desvalorização da moeda americana diante de sua substituição pelos Brics significaria a desvalorização das próprias reservas desses países.

Só em maio, as quatro economias compraram US$ 60 bilhões para suas reservas. Meirelles defende que haja uma diferenciação entre a substituição do dólar para o comércio e sua posição como moeda reserva. "Temos de separar o comércio e a questão de reservas", disse. "Para que o dólar deixe de ser usado como moeda reserva, precisa ter outra", afirmou.

Ele coloca dúvidas sobre a capacidade do FMI de transformar os Direitos Especiais de Saque em uma nova referência. "O euro não se confirmou como a grande alternativa ao dólar", disse. Hoje, 26% das reservas mundiais estão em euros. Mas o volume não cresce. "A substituição do dólar não é uma questão trivial. É um processo longo", disse.

Para permitir que o sistema funcione entre China e Brasil, a estratégia adotada será a de garantir que todas as operações comerciais passem pelos BCs. "As operações vão passar pelos dois BCs, que farão os contratos de câmbio entre importador e exportador em moedas locais", disse.

Um crédito ainda seria estabelecido para permitir que os acertos entre os BCs não tenham de ser feitos todos os dias, mas apenas uma vez por mês. Isso somente seria revisto se houvesse um desequilíbrio importante no comércio bilateral. A notícia de um acordo de uso de moedas locais entre os dois países assustou setores no Brasil que já sofrem para concorrer com os produtos chineses.

O temor é de que os produtos chineses ganhem ainda mais competitividade. Meirelles garante que práticas de dumping pelos chineses continuarão a ser impedidos, por meio de elevação de taxas todas as vezes que se descobrir uma irregularidade no comércio.

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