A Petrobras poderá disputar áreas do pré-sal com outras empresas, mesmo na condição de única operadora destes blocos. A Comissão Interministerial que debate mudanças no marco regulatório do petróleo tem como ideia conceder à Petrobras participação em todos os blocos do pré-sal. O porcentual apresentado até o momento como garantia à estatal está em torno de 10%, mas ainda não há consenso sobre a fatia. Segundo uma fonte da empresa, há interesse em disputar até mesmo a integralidade de uma área.
No entendimento do advogado Benedicto Porto Neto, mestre em Direito Administrativo da PUC-SP e especialista em licitações públicas, a Lei das Licitações, de número 8.666, pode ser a brecha que o governo precisa para balizar sua intenção. Segundo ele, mesmo não tendo o maior volume de ações da Petrobras, como seu controlador, o governo pode firmar com a empresa contrato direto sem a necessidade de licitação. "Se a União decidir explorar suas reservas por meio da Petrobras, isso dispensa a licitação." O tema é polêmico. Para o ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP), David Zylberstajn, a entrega de parte das áreas à Petrobras sem licitação seria inconstitucional. "Não vejo como uma lei pode privilegiar uma empresa de capital aberto, majoritariamente privado, em detrimento de outras iguais a ela." Segundo ele, apesar de a União estar no capital votante, estará privilegiando "os gringos que têm maior participação na empresa"
De acordo com uma fonte que acompanha as discussões da Comissão, a oferta do governo à Petrobras é um meio de evitar que a empresa fique de fora numa eventual disputa direta com outros investidores. Porém, se a estatal desejar, poderá entrar na disputa, o que parece ser a intenção da companhia. "A Petrobras não quer esmola e nem está sem caixa para entrar na disputa em leilões, como dizem alguns. Vamos disputar sim e pra valer", diz uma fonte da própria estatal.
Recomendação
A defesa da proposta, na empresa e na Comissão Interministerial, é baseada no fato de que a garantia à Petrobras não estaria sendo determinada por uma eventual dificuldade na obtenção de recursos para exploração de todas as área, mas sim como forma de assegurar o desenvolvimento de uma indústria nacional do setor. "A Petrobras vai continuar no jogo por ser um instrumento de promoção do desenvolvimento industrial do país", diz a fonte da estatal, lembrando que a empresa estaria mais comprometida com as metas de conteúdo nacional dos projetos do que outros grupos estrangeiros.
Segundo fontes próximas à Comissão Interministerial, a sugestão de dar à Petrobras a operação das áreas estratégicas foi uma recomendação expressa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "O presidente temia que a Petrobras fosse alienada do processo de desenvolvimento de futuras áreas do pré-sal", comentou uma destas fontes, completando que, apesar de já começar a disputa pelas áreas com porcentual de participação garantido, a Petrobras não terá nenhuma outro privilégio. Ex-presidente da estatal e hoje consultor do setor, Armando Guedes reage de maneira favorável à intenção do governo de tornar a companhia a operadora do pré-sal. "É uma forma de compensar a Petrobras pelos investimentos feitos em pesquisa para chegar às descobertas de hoje", comentou, completando que há pelo menos 30 anos a companhia pesquisa a possibilidade de reservas no pré-sal.
Para ele, a intenção do governo também foi uma espécie de blindagem da companhia. "A empresa corria o risco de ficar de fora dessa disputa, porque diante do tamanho do seu plano de investimentos para os próximos cinco anos, não teria condições de disputar novas áreas. Agora ela tem uma participação garantida, em troca de sua experiência na área." Ainda de acordo com fontes próximas à Comissão, na concorrência, em vez do pagamento de bônus mais elevados para arrematar uma área, um dos critérios básicos que norteou os leilões da ANP até agora, os candidatos a uma determinada área terão de oferecer à nova estatal (que está em processo de criação pelo governo) uma participação nos lucros.