postado em 11/08/2009 09:27
A ex-secretária da Receita Federal Lina Vieira está tirando o sossego do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Desde que foi demitida, há um mês, ela tem fustigado publicamente o ex-chefe ao divulgar os "reais motivos" da sua retirada do cargo, que ocupou por pouco mais de 11 meses. Os técnicos fiéis a Lina insinuam que ela caiu por resistir ao uso político do órgão. Segundo a versão deles, o Palácio do Planalto estaria incomodado com a fiscalização a grandes empresas, potenciais financiadoras da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, na corrida à Presidência da República em 2010. O pente fino nos negócios da família do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), também teria descontentado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
[SAIBAMAIS]A demissão se deu no auge da crise levantada pela investigação de uma manobra contábil da Petrobras, que resultou na criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) a ser usada como palco pela oposição. Por mais que Lina cerre o tiroteio contra Mantega, o ministro não tem comprado a briga. A confirmação da dispensa ocorreu só quatro dias após o vazamento da notícia. Ainda assim, Mantega se recusou a dizer os motivos. Sem explicações, comunicou a Lina que precisaria do cargo, nomeou interinamente o secretário-adjunto, Otacílio Cartaxo, e tirou 10 dias de férias. Esperava que o fogo baixasse, mas a secretária defenestrada não deixou o assunto sair das páginas dos jornais. Para fugir ao cerco, o ministro já até afirmou que não tem satisfação a dar sobre o assunto.
Os próprios auditores da Receita cobram uma posição mais firme de Mantega sobre os destinos do órgão. Eles não aceitam que uma estrutura eminentemente técnica, que presta uma função essencial para o funcionamento do Estado, seja jogada de uma hora para a outra no meio de uma crise política. "Não entendo por que o ministro não vem a público se explicar. Isso acabaria com todos os rumores que circulam por aí. Num governo aberto e bem intencionado, não há nada a esconder", reclama um respeitado fiscal. Para ele, mesmo sendo filiado ao PT, Mantega tem a obrigação de preservar a Receita da luta partidária para não atrapalhar os planos eleitorais de Dilma. A ministra, por sinal, teria chamado Lina a seu gabinete no fim do ano passado pedindo a suspenção das investigações contra a família Sarney, o que a ex-secretária disse não ter atendido, conforme entrevista que ela concedeu, no último domingo, à Folha de São Paulo.
Mulher-bomba
No sindicato que representa os auditores, as declarações públicas e as ameaças veladas da ex-secretária são vistas por seus adversários como ataques de "alguém que quer aparecer". Em pleno processo eleitoral, que escolherá o comando da entidade única que auditores-fiscais da Receita e seus colegas da extinta Receita Previdenciária decidiram criar, as reaparições de Lina ajudam a inflamar a guerra interna. As chapas que disputam a hegemonia dentro do Sindifisco, nome da nova entidade, travam um duro debate em torno de bandeiras que durante o "reinado" de Lina eram prioridades.
Mantega estaria apenas aguardando a definição do quadro político interno para anunciar o nome do substituto definitivo da ex-secretária. "Ela resolveu virar uma mulher-bomba. Nunca vi uma pessoa sair atirando tanto", diz um técnico da Receita. Para um outro fiscal, Lina está criando polêmica para tentar "sair por cima", evitando as acusações de ter desarticulado o órgão ao entregar seus principais cargos a sindicalistas sem experiência administrativa. "Durante todo esse tempo, eles fizeram o que quiseram, com a complacência do ministro Mantega. Sob pressão da cúpula que subiu com ela, Lina acabou com o planejamento da fiscalização. Foi o paraíso para quem faz corpo mole", diz.
Segundo uma fonte da Fazenda, a demissão havia sido cogitada já em março, quando se percebeu que a arrecadação não reagiria. Irritado por ser o porta-voz das notícias ruins, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, reclamou do desempenho de Lina. "Não foi uma ou duas vezes que ele se reuniu com o Mantega para se queixar. Ouviu que demiti-la seria assumir publicamente o erro de ter substituído Rachid", afirma. Pela primeira vez desde a recessão de 1990, as receitas caíram oito meses seguidos. A retração no primeiro semestre foi de 7,5%, o que representou R$ 6,3 bilhões a menos.
Colaborou Deco Bancillon
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