postado em 17/08/2009 10:14
O cenário é o mesmo na maioria das usinas de Marabá. Os fornos onde a temperatura chegava a 1.500;C estão desligados. As esteiras que carregavam o carvão permanecem paradas. O rodeio, uma enorme roda onde o ferro-gusa líquido caía para formar os lingotes, não gira há meses. Os pátios por onde circulavam centenas de operários, 24 horas por dia, estão vazios.A "era do ferro" no sul do Pará passa pela maior crise que começou a despontar, há mais de duas décadas.
Das dez produtoras de ferro-gusa (uma etapa fundamental da cadeia de produção do aço) na região, seis estão totalmente paradas, três operam parcialmente, com alguns de seus fornos desligados, e apenas uma funciona normalmente, pela contabilidade do Sindiferpa (Sindicato das Indústrias de Ferro Gusa do Estado do Pará).
A região é a segunda maior do país, com 25% da produção nacional, atrás de Minas Gerais.
"É a maior crise de todos os tempos do setor. Está feio, pior impossível", afirma Jarbas Taveira Fonseca, gerente da unidade da Cikel, uma das que estão completamente paralisadas. A planta foi comprada pelo grupo em agosto do ano passado, quando a indústria vivia no auge de sua história.
Em outubro, explodiu a crise. Em novembro, a empresa foi obrigada a paralisar a fábrica, que hoje tem apenas 28 funcionários, para manutenção, um décimo dos quase 300 que trabalhavam nos tempos áureos.
Os dados de exportação e produção traduzem em números a agonia do setor. De cerca de 9.000 funcionários que fizeram a produção chegar a 1,8 milhão de toneladas em 2008, quando o ritmo era de força total, restaram 3.000. No primeiro semestre deste ano, a produção despencou para somente 300 mil toneladas, um terço da do ano passado. Para completar, o preço da tonelada caiu de US$ 600 para menos de US$ 300. A indústria não resistiu à dureza da crise.
Nas usinas paralisadas, a reclamação é sempre a mesma. "Está feia a coisa aqui. Estou só eu aqui", diz Cícera Fontenele, assistente administrativa da Sidenorte, a primeira produtora de ferro-gusa a parar, ainda em outubro. "De 180 pessoas, ficaram 20." Muitos dos trabalhadores que perderam o emprego vieram de fora, de Estados como Minas Gerais, Maranhão e Ceará, e começam a fazer o caminho de volta, relatam os empregados do setor.
Futuro incerto
Enquanto alguns setores da economia já veem sinais de retomada e recuperam a confiança, para os produtores de ferro-gusa do Pará o futuro é nebuloso. "Infelizmente, já estamos em julho, mas não temos perspectivas boas. São só sinais, por enquanto [as empresas] preferem manter tudo paralisado", afirma Ana Cláudia Pingarilho, secretária-executiva do Sindiferpa. Quando melhorar, o tempo terá retrocedido mais de 20 anos. "Vão retomar do início, como se estivessem começando tudo de novo. Só que precisa de comprador, e ainda não tem", completa Pingarilho.
O ferro-gusa é o resultado de uma mistura de carvão, minério de ferro e calcário num alto-forno. O produto final, uma pequena bolota de base chata e que pesa uns dois quilos, é usado para produzir aço. Quase toda a produção do Pará era exportada. A indústria da região vendia basicamente para os Estados Unidos, onde a crise econômica e financeira começou e teve um de seus impactos mais agudos. Agora, começa a buscar outros mercados, como a América Latina, mas os resultados ainda são tímidos.
A retomada, dizem os envolvidos com o setor, deve começar mesmo somente no ano que vem. "Não fala isso não, que aí é longe demais", diz em tom de apreensão o operário de manutenção Elon Castro, da minoria que continua empregada.