postado em 28/10/2009 08:10
Consumidores e empresas já estão pagando a conta da especulação movida pelos investidores que apostam na alta da taxa básica de juros (Selic) em 2010. Dados divulgados ontem pelo Banco Central (BC) mostram que, em outubro, até o dia 13, as taxas cobradas em empréstimos e financiamentos deram um salto expressivo, interrompendo um ciclo de baixa que vinha desde janeiro. No geral, os juros médios aumentaram 1,1 ponto percentual, para 36,3% ao ano. Entre as pessoas físicas, especificamente, a alta chegou a 2,4 pontos, para 46% anuais. No caso das empresas, os juros cravaram 26,4% ao ano.Normalmente, os bancos se pautam no mercado futuro de juros para remunerar os investidores dos quais tomam dinheiro (custo de captação) para repassar em forma de empréstimos. O problema é que, diante das perspectivas de a economia crescer 5% ou mais no ano que vem, os investidores estão exigindo taxas maiores, acreditando que a inflação sairá do controle e o BC será obrigado a elevar a Selic em até 3,5 pontos percentuais, dos atuais 8,75% para 12,25% ao ano. Essa aposta persiste apesar de o presidente do BC, Henrique Meirelles, assegurar que não há razões para isso e de garantir ao presidente Lula que a Selic deverá se manter estável em 2010, como informou ontem o Correio.
O BC ressaltou ainda que os bancos aproveitaram a especulação para também ampliar seus ganhos por meio do spread, a diferença entre o que pagam aos investidores e o que cobram dos devedores. Neste mês, o spread médio, que vinha caindo desde o início do ano, avançou 0,7 ponto percentual, para 26,7 pontos, com destaque nas operações com pessoas físicas, com um salto de 1,9 ponto, para 35,3 pontos. Quanto maior for o spread, maior é o lucro de uma instituição financeira.
Inconsistência
O chefe-adjunto do Departamento Econômico do BC, Túlio Maciel, tentou minimizar o movimento de alta dos juros bancários. Segundo ele, além de as apostas de alta das taxas no mercado futuro serem incipientes e inconsistentes (ontem, caíram), a tendência é de barateamento do crédito. Mas não há garantias de que isso ocorrerá. ;Em princípio, todos os indicadores apontam para a redução dos juros às empresas e às pessoas físicas. O cenário atual é benigno. A inadimplência está em baixa, o emprego e a renda vêm crescendo, devido à atividade econômica mais forte, e o volume de crédito está se expandindo. Contudo, não dá para dizer que (a queda dos juros) vai acontecer;, disse.
O gestor de renda fixa da XP Investimentos, Manuel Lamas, mostrou-se mais otimista. Para ele, o que se viu de alta nos juros aos consumidores e ao setor produtivo neste mês foi um ponto fora da curva. ;Não há nada no radar que justifiquem as apostas dos investidores no mercado futuro e o aumento dos juros pelos bancos. Falar em aumento de até 3,5 pontos na Selic no ano que vem é exagerado, excessivo. Mesmo que a economia cresça mais em 2010, não se pode esquecer que esse avanço se dará sobre uma base bastante deprimida;, afirmou.
Para Alexandre Maia, economista-chefe da Gap Asset Management, muito brevemente, os bancos vão se dar conta de que, em um mercado competitivo, não há como elevar os juros. ;Mesmo que a Selic suba um pouco, como está prevendo o mercado, os bancos terão de reduzir seus spreads para não perderem mercado;, assinalou. A seu ver, os riscos com o crédito diminuíram significativamente nos últimos meses e tendem a ficar menores com o crescimento consistente que se projeta para a economia no ano que vem, com aumento da produção, do emprego e da renda.
LULA JÁ SE SENTIU ASSALTADO
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou os juros praticados pelo sistema financeiro. Segundo ele, as taxas cobradas pelos cartões de crédito ;são muito altas;. Sobre os juros do cheque especial, Lula foi ainda mais incisivo: ;Quando eu ganhei o primeiro cheque especial, achei que estava sendo tratado com deferência. No primeiro mês que eu não pude pagar o que eu comprei na data correta, percebi que não era especial coisa nenhuma; eu estava sendo quase sendo assaltado pela quantidade de juros que pagava;.
Memória
Os sinais de setembro
O movimento de subida dos juros bancários começou a se delinear em setembro, apesar de os números globais mostrarem um cenário muito positivo. Duas das modalidades de crédito mais demandadas pelas pessoas físicas, o cheque especial e o empréstimo pessoal, apontaram alta, com as taxas atingindo, respectivamente, 162,7% ao ano (mais 1,7 ponto percentual em relação a agosto) e 44,7% anuais (mais 0,4 ponto). Para as empresas, aumentaram os juros dos descontos de notas promissórias, de 53,1% para 54,9%, e das contas garantidas, espécie de cheque especial empresarial, de 79,5% para 79,6% anuais.
Ontem, entretanto, Túlio Maciel, chefe-adjunto do Departamento Econômico do BC, preferiu ressaltar que a taxa geral média dos empréstimos e financiamentos, de 35,3%, foi a menor desde dezembro de 2007. Já os juros cobrados das pessoas físicas, de 43,6%, foram os mais baixos da série histórica iniciada em julho de 1994, puxados pelos empréstimos consignados, cujas taxas recuaram para 27,1% ao ano; pelos financiamentos de veículos, com encargos de 24,9% anuais (menos 1,3 ponto percentual frente a agosto); e pelo crédito direto ao consumidor (CDC), que ficou três pontos percentuais mais baratos ao cravar 51,4% ao ano. Para as empresas, os juros médios ficaram praticamente estáveis no mês passado, em 26,3% ao ano.(VN)
Crédito mantém crescimento
Taxas de juros mais altas não estão inibindo a demanda por crédito. É o que mostram os números preliminares de outubro (até o dia 13) captados no sistema financeiro pelo Banco Central (BC). A média das concessões diárias de empréstimos e financiamentos aumentou 5,7% em relação ao mesmo período de setembro, sendo que, para os consumidores, as liberações feitas pelos bancos subiram 6,4% e, para as empresas, 5,3%. Quando se olha para os estoques de crédito, o quadro não é muito diferente. No geral, o aumento foi de 1,8%. Para as pessoas físicas houve expansão de 2,3%, e entre as empresas, avanço de 1,3%. ;Tudo indica que essa tendência de crescimento do crédito não vai se reverter;, disse o chefe-adjunto do Departamento Econômico do BC, Túlio Maciel.
O que faz com que os tomadores de crédito não sintam no bolso o peso da atual elevação dos juros é o expressivo alongamento dos prazos de pagamento. Em média, os consumidores estão honrando as compras a prazo e os empréstimos em 506 dias, um tempo recorde. Já as operações das empresas têm prazo médio de 269 dias. Segundo os especialistas, quanto maior for o prazo para a quitação de uma dívida, menor é o valor da prestação. Há lojas, por exemplo, financiando móveis e eletrodomésticos em até 17 vezes no carnê, o que não se via desde o estouro da bolha imobiliária americana.
;O crescimento do crédito é irreversível. Com o emprego em alta e a renda crescendo, tanto as empresas quanto os consumidores vão continuar se endividando. E isso é salutar para o crescimento econômico do Brasil;, afirmou Manuel Lamas, gestor de renda fixa da XP Investimentos. Nas projeções do economista-chefe da Gap Asset Management, Alexandre Maia, o crédito deve crescer 25% em 2010, nível semelhante ao que se via no pré-crise mundial. Neste ano, pelas contas do BC, o aumento do crédito ficará em 16%. Em setembro, especificamente, o crédito subiu 1,5%, totalizando R$ 1,347 trilhão, o correspondente a 45,7% do Produto Interno Bruto (PIB). ;Acreditamos que a relação entre o crédito e o PIB encerrará este ano em 47%;, frisou Túlio Maciel.
Para o economista do BC, esses números mostram que a crise, que, num primeiro momento, provocou a escassez de crédito, ficou para trás. Ele destacou que, além da demanda forte por empréstimos, essa constatação pode ser reforçada pela queda na inadimplência das pessoas físicas pelo terceiro mês consecutivo. O índice de calote cravou 8,2%, retornando aos níveis de janeiro deste ano.