Economia

Governo apura deficit de R$ 7,6 bi em setembro, o maior em 12 anos

postado em 30/10/2009 08:00
Movido por uma disposição cada vez maior de gastar, o governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) registrou deficit de R$ 7,6 bilhões em setembro. Foi o maior rombo em suas contas para este mês desde 1997. O número pegou os analistas de surpresa. A expectativa era de que o buraco nas contas ficasse em R$ 2,7 bilhões. ;Ninguém imaginava um deficit desse tamanho. Isso só fez aumentar a preocupação com a deterioração do ajuste fiscal;, disse o economista sênior do Banco BES Investimento, Flávio Serrano.

Diante desse quadro, o secretário do Tesouro, Arno Augustin, foi obrigado a, pela primeira vez, admitir que o governo será obrigado a descontar parte das despesas do Programa Piloto de Investimentos (PPI) e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de R$ 28,5 bilhões, para cumprir as metas de superávit primário deste ano. No caso do governo central, a meta é de 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) ou de R$ 42,7 bilhões. Mas, no acumulado de janeiro a setembro, a economia para o pagamento de juros da dívida ficou em apenas R$ 18,9 bilhões ou 0,74% do PIB. Ou seja, ainda faltam R$ 23,8 bilhões, saldo que dificilmente será alcançado, devido às despesas extras de fim de ano com o funcionalismo e aposentados.

;Nem o governo central nem o setor público como um todo, que considera União, estados, municípios e estatais, conseguirão cumprir as metas;, afirmou Serrano, lembrando que, para o setor público como um todo, a meta oficial é de 2,5% do PIB. Para ele, com as despesas crescendo na velocidade atual, é difícil acreditar nas promessas do governo. Nos nove primeiros meses do ano, os gastos aumentaram quase R$ 58 bilhões, dos quais R$ 17,5 bilhões com os servidores. Hoje, o BC divulga o resultado geral do setor público. E a expectativa é de deficit próximo de R$ 5,5 bilhões em setembro, o primeiro rombo mensal desde 1998.

Inflação e crescimento
Apesar da deterioração das contas federais, Arno Augustin disse que não há motivos para pânico. ;Esse ano é de crise. E foi preciso tomar atitudes diferentes;, frisou. Ele assegurou ainda que tem conversado com vários analistas e não identificou grandes preocupações. ;Não acredito que alguém veja risco fiscal relevante, pois sequer estamos recorrendo ao Fundo Soberano (que detém cerca de R$ 15 bilhões);, frisou. ;A expectativa é de superávit, e forte, em outubro;, pois o Tesouro receberá R$ 5 bilhões em depósitos judiciais em poder da Caixa Econômica Federal.

Para o secretário, também não há motivo para temores com a inflação, apesar de o BC ter alertado que a gastança do governo o levou a aumentar as projeções para 2010 e 2011. Ele deixou claro que a luta é pelo crescimento sustentado. Foi a busca desse crescimento, segundo ele, que levou o governo a adotar políticas anticíclicas para estimular a atividade em meio à crise, a despeito da queda da arrecadação. Somente a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) resultou em perdas de R$ 7,6 bilhões entre janeiro e setembro.

No mês passado, a maior contribuição para o deficit veio da Previdência, com rombo de R$ 9,17 bilhões por causa da antecipação do 13; salário de aposentados, saldo 76,7% maior do que resultado negativo de agosto. ;O pior dos números do governo é que os gastos com investimentos não aumentam na proporção desejada;, afirmou Flávio Serrano. De janeiro a setembro, os investimentos totais alcançaram R$ 20,5 bilhões, superando em 13% os R$ 18,2 bilhões de igual período de 2008. Na mesma base de comparação, o PPI consumiu R$ 7,2 bilhões.

; BC alerta sobre bolha externa

Ao mesmo tempo em que deixou claro que, a médio prazo, não há necessidade de aumento da taxa básica de juros (Selic), o Banco Central alertou, na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada ontem, sobre os riscos de o mundo estar convivendo com novas bolhas, principalmente de commodities, mercadorias com cotação internacional. Para o economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luís Otávio de Souza Leal, essa foi a grande novidade do documento referente à reunião da semana passada, quando os juros foram mantidos em 8,75% ao ano.

;O BC trouxe para o debate o impacto do mercado externo sobre a inflação do país, pois uma bolha de commodities pode resultar em problemas mais à frente;, afirmou Leal. A seu ver, muito provavelmente, o BC ampliou o leque de seu discurso para tirar o foco principal da demanda doméstica. ;Certamente, com o crescimento que veremos da economia nos próximos meses, aumentaria a pressão por alta dos juros. Mas, com mais uma variável no jogo, e a incerteza quanto aos rumos do mundo, o BC se sentirá mais confortável para adiar o quanto puder o aumento da Selic;, acrescentou.

As ressalvas quanto ao cenário benigno para a inflação feitas pelo Copom, devido, principalmente, à ociosidade ainda grande da indústria, não esfriaram, contudo, as apostas do mercado em uma possível elevação dos juros em 2010. Na visão de Leal, a ata do Copom só adiou a expectativa de alta. ;Em vez de abril, creio que a Selic só será aumentada a partir de julho;, destacou. Na suas contas, é possível que a taxa básica seja ajustada entre 2 e 2,5 pontos percentuais, isto é, para até 11,25% ao ano. ;Agora, se o quadro internacional piorar e se se confirmar um novo tombo da economia, dificilmente o BC subirá os juros.;

Memória
Na avaliação do economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, o fato de o BC ressaltar os perigos vindos de fora foi fundamental para reavivar a memória dos que esqueceram que a crise ainda não chegou ao fim. ;Muitos tendem a esquecer rapidamente os problemas causados pela crise. Mas ninguém garante que a economia mundial se recuperou (mesmo com os Estados Unidos, que mostrou crescimento de 3,3% no terceiro trimestre do ano);, assinalou. De qualquer forma, ele vê a Selic subindo a partir de setembro do ano que vem em até dois pontos. (VN)

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