Economia

Redução do preço da gasolina a partir da exploração do pré-sal não é uma ideia descartada

postado em 03/01/2010 07:50
Dádiva ou maldição? Desde o anúncio das descobertas de megacampos de petróleo na camada pré-sal nas bacias de Campos e Santos, iniciou-se uma fervorosa discussão sobre a aplicação da riqueza - estimada na casa dos trilhões de dólares - que a exploração de petróleo nessas áreas vai gerar, de forma a catapultar o desenvolvimento econômico do Brasil. E também uma disputa ferrenha entre governo, oposição, estados e municípios produtores e não produtores para se apropriar e administrar essa generosa fonte de renda. Se confirmadas as projeções do governo e da Petrobras, o pré-sal será, realmente, um "bilhete premiado" para o Brasil. Mas, se o dinheiro é muito, os desafios para promover o crescimento da economia brasileira de forma sustentável são ainda maiores, pois também são inúmeras as tentações para destinar o dinheiro do pré-sal de forma populista. Como a exploração de petróleo em águas profundas em escala comercial só começará a partir de meados desta década, caberá ao novo governante traçar as diretrizes corretas da destinação dos recursos. E um dos principais apelos populistas é baixar o preço da gasolina, que em algumas cidades, a exemplo de Brasília, chega próximo a R$ 3 o litro. Todas as vezes em que foi questionado sobre o assunto, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, foi taxativo em dizer que o pré-sal não será usado para baratear o preço da gasolina e que, para haver redução do valor do combustível, a saída é reduzir os impostos. A argumentação do ministro é de que o óleo sai do poço por um preço baixo. Ao longo da cadeia é que vai sendo onerado. O fato concreto é que a Petrobras mantém seus custos corrigidos pelo dólar e alinhados aos do mercado internacional sob o argumento de que essa é a única forma de atrair investimentos, incentivar a competição e garantir a ampliação da produção e cumprimento do seu plano de investimentos. Subsídio Especialistas, contudo, alertam que o risco de ceder ao apelo popular e usar os recursos do pré-sal para baixar o preço da gasolina não está totalmente descartado. "Hoje, sem o pré-sal, quando o preço do barril de petróleo sobe, a gente não aumenta o preço da gasolina. Quando cai, também não. No dia que formos grandes produtores, a tentação para subsidiar o preço da gasolina será enorme", ressalta Adriano Pires, coordenador do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). Ele observa que a Petrobras já anunciou a construção de cinco refinarias. "Como fica o etanol nessa história? E as fontes renováveis?", questiona. Na visão dele, o anúncio de novas refinarias traz preocupações sobre a propagação da "maldição do petróleo". Para Pires, o ministro está no papel dele, ao negar o uso do pré-sal para baixar o preço da gasolina. O especialista considera, entretanto, que há um risco imenso de isso ocorrer. Por essa razão, defende a retomada de uma política energética baseada em fontes de energia menos poluentes. "O governo tem que repensar se realmente é interessante construir quatro novas refinarias. Do jeito que a coisa foi anunciada, é realmente preocupante. E a bomba pode estourar para o próximo presidente. O risco de ele (o pré-sal) se tornar uma maldição é muito grande", alerta. David Zylbersztain, ex-diretor geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), reconhece que o preço da gasolina é um inibidor do uso do automóvel, mas é contra a redução de impostos do combustível, pois avalia que a medida afetaria a qualidade de vida da população. A gasolina mais barata aumentaria a frota de carros nas ruas, o que traria mais congestionamentos e poluição. "Baixe o preço da gasolina em São Paulo, para você ver", provoca. Divergência ameaça produção A definição de um modelo de exploração do pré-sal que seja atrativo para trazer investimentos para o mercado brasileiro é a o principal desafio do país, avalia João Carlos de Luca, presidente do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP). "O pré-sal é longo prazo, mas o mais importante vai ser definir o marco regulatório (que está em tramitação no Congresso Nacional)", observa. De Luca estima que a exploração dos campos já descobertos deve ocorrer entre 2012 e 2013, para entrar em escala comercial em 2015. Nas outras áreas, o processo de exploração só deve ocorrer entre 2018 e 2020. Mas, como o ciclo de produção requer investimentos de longo prazo, o que for aprovado agora vai ditar as regras do jogo. A maior preocupação do IBP é com a politização exacerbada que tem sido atribuída ao tema no Congresso. "A discussão ficou política, focada só nos royalties. A parte do mérito e os atores do modelo de partilha ficaram em segundo plano", critica De Luca. O executivo reclama que sugestões enviadas pelo IBP, de aperfeiçoamento nos projetos que tratam do modelo de partilha e da criação da Petro-Sal, não foram contempladas. "A instituição da Petrobras como operadora única, por exemplo, não é boa para a indústria, pois reduz o papel das outras empresas a meros financiadores, nem para a própria companhia, que será obrigada a atuar em todos os campos", sustenta. Postergação Os poderes que estão sendo dados à nova estatal são outro ponto de divergência. "A Petro-Sal não assume risco operacional, nem financeiro. Não tem risco e decide tudo", ataca. As divergências no Congresso são muitas, mas De Luca alerta que, se o modelo demorar a ser aprovado, o Brasil corre o risco de ter uma década perdida. Cada ano de atraso representa postergação do processo de descoberta e produção em águas profundas. Diante de tantas divergências sobre o pré-sal, para David Zylbersztain, ex-diretor geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), o próximo presidente terá que rever as modificações nos projetos, que estão sendo feitas no Congresso. (KM)

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