postado em 07/01/2010 07:01
A crise mundial que empurrou o Brasil para a recessão na primeira metade do ano passado não impediu que o país recebesse uma montanha de dólares. Dados consolidados pelo Banco Central mostram que, em 2009, o saldo cambial ficou positivo em US$ 28,7 bilhões, o terceiro melhor resultado anual da série histórica iniciada em 1982. Com isso, o superavit nos sete anos de governo Lula alcançou US$ 178,4 bilhões contra um deficit de US$ 26,3 bilhões nas duas administrações de Fernando Henrique Cardoso, marcadas pelo programa de privatização que atraiu um volume maciço de capital estrangeiro.Em 2008, com o estouro da bolha imobiliária americana, que deixou um rastro de prejuízos mundo afora, o movimento cambial havia sido negativo em US$ 983 milhões - somente nos últimos três meses daquele ano, houve uma fuga de US$ 18,2 bilhões do país. "Felizmente, vimos uma virada rápida no fluxo de recursos. De outubro de 2008 a março do ano passado, as saídas de recursos do Brasil eram enormes. Mas com os bons fundamentos da economia permitindo que o país fosse um dos primeiros a sair da crise, o capital externo voltou com tudo", disse o economista Felipe França, do Banco ABC Brasil.
Para ele, independentemente das diferenças dos fluxos de dólares nos governos FHC e Lula, ambas as administrações são responsáveis pelo fato de o país ser hoje um dos principais polos recebedores de recursos estrangeiros do planeta. "O governo FHC pavimentou o caminho, ao instituir metas de inflação, metas fiscais e o sistema de câmbio flutuante. O governo Lula não só consolidou esse tripé, como o aprofundou, ao mesmo tempo em que constituía reservas internacionais de quase US$ 240 bilhões", acrescentou.
Proveito
Na opinião do economista Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor da Área Externa do Banco Central, com a economia interna arrumada, o Brasil pode tirar proveito do momento excepcional vivido pelo mundo, com o processo mais longo de crescimento dos últimos 30 anos. "O país aumentou as exportações, principalmente para a China, grande consumidora de matérias-primas (commodities). Computou saldos comerciais importantes e recebeu muitos investimentos diretos (para a produção e o emprego) e na bolsa de valores", assinalou.
A partir deste ano, porém, o superavit no fluxo cambial deve diminuir. Primeiro, porque o país tenderá a registrar saldos comerciais cada vez menores por causa do aumento das importações e das remessas de lucros e dividendos, fruto do crescimento econômico mais vigoroso. Segundo, porque, com as economias maduras - Estados Unidos e Europa, principalmente - se recuperando, a tendência é de as taxas de juros subirem por lá, atraindo parte importante do capital que hoje migra para países emergentes como o Brasil. "Mas não vejo problemas. O país receberá dinheiro suficiente para financiar os deficits nas transações correntes com o exterior. Além disso, o BC tem reservas suficientes para evitar grandes oscilações nas taxas de câmbio, como no passado", emendou Freitas.
Tributação simplificada
O governo vai simplificar o drawback, mecanismo que concede isenção de impostos na compra de matérias-primas utilizadas na fabricação de produtos destinados às exportações. Pelas regras atuais, as indústrias só podem adquirir insumos no mercado interno se também fizerem encomendas no exterior, nem que seja no valor de US$ 1. Essa restrição vai acabar. Os exportadores poderão escolher livremente onde buscar os componentes e ainda assim gozar dos benefícios fiscais. Além disso, as normas serão facilitadas para estimular as operações de pequenas e médias empresas. "Estamos continuamente adotando medidas para dar mais competitividade aos produtos brasileiros, que enfrentam dificuldades no mercado por causa do câmbio valorizado", afirmou o secretário de Comércio Exterior, Welber Barral. Segundo ele, pequenas e médias empresas, que são 25% das unidades exportadoras do país e respondem por 8% do total vendido, esbarram na burocracia para usar o drawback. O governo vai editar um decreto unificando as três modalidades existentes e simplificando as operações. (Ricardo Allan)