A última crise mundial ainda não foi superada pelos países desenvolvidos e já há quem enxergue um novo abalo surgindo no horizonte, para a próxima década. Segundo o economista suíço Marc Faber, conselheiro e administrador de fundos de investimento, a origem desta vez estará na incapacidade de alguns governos de honrar as dívidas contraídas na época da bonança geral. Com a economia crescendo globalmente, era fácil conseguir compradores para os títulos públicos, o que levou muitos países a aumentar seus endividamentos. Mas agora, com receitas de impostos e de exportações em queda, e com investidores cada vez mais exigentes, várias nações já estariam sentindo as dificuldades para gerir suas dívidas. Essa é a análise deste guru conhecido por seu pessimismo e que mora em Hong Kong desde 1973. ;Basicamente o que está acontecendo é que muita dívida migrou do setor privado para o público nos últimos anos. Além disso, o nível total de endividamento em algumas economias está muito elevado;, explicou em entrevista exclusiva ao Correio Braziliense. São países como Estados Unidos, Inglaterra e os Piigs: Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha (que em inglês se escreve Spain). ;No passado, a crise da dívida soberana se concentrou em países emergentes. Mas a próxima se dará no mundo desenvolvido, especialmente nos países da Europa Ocidental e nos EUA.; E ele cita números: o mercado de crédito americano em relação ao PIB (Produto Interno Bruto, soma de tudo o que é produzido em um país em um período de tempo) cresceu de 250% para 375% nos últimos 10 anos. Faber calcula que as taxas de juros deverão iniciar uma trajetória de aumento em um futuro próximo, já que estão sendo mantidas em níveis extremamente baixos como forma de estimular a economia. ;E quando isso acontecer, as despesas do governo vão subir também;, alertou. Hoje, ele estima que o custo anual dos juros americanos corresponda a 12% das receitas fiscais. Em cinco anos, o economista acredita que essa conta subirá para 35%. ;Isso forçará o governo a cortar despesas, através de um profundo ajuste fiscal, ou a imprimir dinheiro, o que resultará em inflação;, afirmou. Brasil Faber avalia que a economia brasileira está bem equilibrada. ;O Brasil tem agricultura, manufaturados e serviços. Então, encaro de maneira bem positiva a economia brasileira. Apenas acho que o mercado de ações vai ter uma queda agora, depois das altas acumuladas no último ano;, disse. Mas ele alerta que o Brasil será afetado pela crise dos países industrializados, que terão que fazer ajustes em suas economias. ;O setor exportador poderá sofrer com esta nova crise.; Outro país que não está no centro das preocupações de curto prazo do guru dos investidores é a China. ;Existem sinais de bolha em alguns setores da economia chinesa e um certo exagero em seu crescimento econômico;, afirmou Faber. Um setor que ele destaca é o imobiliário. ;Se hoje há prédios de escritórios vazios, dentro de três anos estarão todos cheios. Além disso, a relação dívida/PIB lá é baixa. Por fim, acho que o governo chinês também está preocupado em desacelerar a economia. O crescimento cairá de 10% ao ano para algo entre 5% e 6%, o que é uma boa expansão.; Para ele, motivo de preocupação mesmo são os Estados Unidos. ;Acredito que, nos próximos 10 anos, o deficit fiscal americano será de US$ 1 trilhão por ano. E com um deficit desse nível, qualquer redução terá um impacto muito negativo sobre a economia.; Na opinião dele, não há ambiente político para esse ajuste fiscal e não há espaço para aumento de impostos. ;Por isso, a próxima crise será mais proeminente nos Estados Unidos;, concluiu (leia mais no texto abaixo). Situação explosiva O economista suíço Marc Faber destaca um aspecto que demonstra a fragilidade da economia americana: o volume do passivo futuro a descoberto (dívidas que aparecerão sem garantia de fonte de verbas para pagamento). Na última década, o total de débitos e de passivos nos Estados Unidos atingiu um nível nunca alcançado, com a incorporação ao Estado das empresas de crédito hipotecário Fannie Mae e Freddie Mac, e com o crescimento das despesas com assistência médica (Medicare e Medicaid). Para Faber, trata-se de uma situação insustentável. Ele destaca que o total da dívida pública (federal, estadual e municipal) ; dobrou entre 2000 e 2009. E as despesas crescentes com assistência médica (Medicare e Medicaid) ajudaram a dívida pública a subir de 150% do PIB em 2001 para 600% hoje. Mas nada é tão ruim que não possa piorar, dizem os pessimistas. Faber lembra que a geraçao dos baby boomers (pessoas que nasceram nos EUA entre 1946 e 1964, também chamada a geração do pós-guerra, período em que surgiu uma explosão da taxa de natalidade) estão se aposentando. ;Com isso, o passivo futuro a descoberto nas contas públicas americanas vai se expandir muito rapidamente nos próximos anos.; Para cobrir essas despesas, Faber acredita que o governo americano não hesitará em aumentar ainda mais seu endividamento, até um ponto em que os próprios investidores ficarão inseguros sobre comprar mais papéis. (LV) "Muita dívida migrou do setor privado para o público nos últimos anos. O nível total de endividamento em algumas economias está muito elevado"
"No passado, a crise da dívida se concentrou em países emergentes. Mas a próxima se dará no mundo desenvolvido"
"Existem sinais de bolha em alguns setores da economia chinesa e um certo exagero em seu crescimento econômico" Marc Faber economista, conselheiro e administrador de fundos de investimentos