postado em 23/02/2010 08:49
O governo vai reforçar a política de aumentar as exportações para os países em desenvolvimento, estratégia que começou a ser adotada no início da administração Luís Inácio Lula da Silva. Apesar das críticas de que ela gera pouca renda e de que a atenção ao comércio no Hemisfério Sul é resultado de uma escolha ideológica, o Ministério das Relações Exteriores garante que se trata de uma decisão puramente pragmática. O Itamaraty afirma que o objetivo é abrir espaço para os produtos nacionais nas economias que mais crescem e têm melhores perspectivas no mundo. Garante, porém, que isso não implica o abandono de mercados maiores, como o dos Estados Unidos e da União Europeia.
[SAIBAMAIS]A parcela das vendas para os países emergentes nunca foi tão alta. Ela cresceu ininterruptamente desde 2002, ultrapassou os embarques para as nações ricas em 2006 e chegou ao recorde de 56,14% do total exportado em 2009. Em valores, entretanto, a renda foi de US$ 85,898 bilhões, menor do que os R$ 100,481 bilhões de 2008. A queda se deveu à contração geral das exportações, que passaram de US$ 197,942 bilhões em 2008 para US$ 152,995 bilhões em virtude da diminuição do fluxo comercial global com a crise. No ano, o recuo das remessas de produtos para os mercados emergentes foi de US$ 14,583 bilhões, a metade da marca das economias avançadas (US$ 28,347 bilhões).
Em 2009, a participação dos países ricos na pauta brasileira de exportações foi de 42,15%, a menor da história. Isso se explica tanto pela crise, que deteriorou o poder de compra nesses lugares, como do avanço dos emergentes. "Esses são os países cujas economias mais crescem e é natural que aumentem o peso no comércio brasileiro. É preciso buscar oportunidades nos novos mercados, sem perder de vista os chamados grandes", justifica o diretor do Departamento de Negociações Internacionais do Itamaraty, embaixador Evandro Didonet. Os emergentes devem crescer 6% em 2010 e 6,3% em 2011, enquanto os ricos avançarão apenas 2,1% e 2,4%, segundo as projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Prioridade
Empresários reclamam que o Brasil está se descuidando do relacionamento com os Estados Unidos e União Europeia, principalmente para se concentrar em acordos comerciais com países com baixo poder de compra. Hoje, o governo está negociando preferências tarifárias, em que as taxas de importação são reduzidas para alguns produtos, com o Marrocos e acordos de livre comércio com Jordânia, Turquia e o Conselho de Cooperação do Golfo (Omã, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Qatar, Bahrein e Kuwait). Existem ainda "diálogos exploratórios" com a Coreia do Sul e a Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), formada por 10 países, entre eles Indonésia, Tailândia e Cingapura.
"É um equívoco achar que o governo não tem interesse em fechar acordos com os mercados que contam, para usar as palavras dos empresários. Nós tentamos, mas às vezes as negociações esbarram em algum interesse ou questão técnica. Só se faz acordo com quem quer fazer", afirma Didonet. Numa reunião técnica no mês que vem, o Mercosul tentará relançar o diálogo com a União Europeia, estancado desde 2004 por causa da resistência do setor automotivo argentino e dos agricultores europeus. "Isso é prioridade absoluta." Outro objetivo especial é discutir o livre comércio com o México, país considerado importante por suas estreitas ligações com os Estados Unidos.
O embaixador considera "irrealista" tentar algo com os norte-americanos num momento em que o presidente Barack Obama está mais concentrado em problemas domésticos, como a alta do desemprego e a saúde do setor financeiro. Mas mesmo com os EUA existe uma pauta. "Hoje, os contatos não têm uma base formal sólida. Eles pediram uma elaboração conjunta de regras para definir as áreas de cooperação que não dependam de redução tarifária para facilitar o comércio", revela o diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, ministro Carlos Márcio Cozendey. O trabalho deve terminar em seis meses.
O Brasil vai continuar dando importância aos acordos multilaterais, especialmente à Rodada Doha de liberalização comercial da Organização Mundial do Comércio (OMC). Mas, cansado com a demora e capitaneados por Brasil, Índia, México e Coreia do Sul, um grupo de 22 países emergentes decidiu reduzir as tarifas cobradas em 70% dos produtos comercializados entre si."Acreditamos que o curso da política comercial está certo. Uma eventual mudança depende do que vier a acontecer depois da crise", afirma o ministro.