Economia

Alta dos alimentos assusta consumidor

Apenas nos três primeiros meses deste ano, preços subiram 4,97%. Famílias estão aproveitando as promoções nos supermercados para estocar produtos em casa. Analistas não veem recuo tão cedo e projetam inflação maior

postado em 31/03/2010 07:00
A dona de casa Vilma Batista compra 36 litros de leite por mês para o filho de quase dois anos e reclama da forte alta no preço do produtoOs preços dos alimentos estão pesando cada vez mais no orçamento das famílias. Somente nos três primeiros meses de 2010, a inflação da comida que vai para a mesa dos brasileiros atingiu 4,97%, segundo o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), superando o centro da meta perseguido pelo Banco Central, de 4,5%, para todo o ano. O pior, no entender dos especialistas, é que não há sinais de trégua à vista. O grupo alimentação continuará sendo um dos principais fatores de pressão inflacionaria. ;As pessoas devem se preparar, pois não haverá alívio tão cedo nos preços da comida. Os sinais atuais são de aceleração;, afirmou o economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles. A lista de produtos alimentícios com preços em alta não para de crescer. E, neste mês, foi engrossada pelo leite. Dos fabricantes para o comércio ; caminho que os analistas chamam de atacado ;, o produto ficou 8,03% mais caro. Do comércio para os consumidores, porém, o reajuste chegou a 10,57%. Quer dizer: o varejo não só repassou todo o seu custo maior como ainda embutiu boa margem de lucro. ;Estamos na época de entressafra e, por isso, o preço só vai avançar. O volume de captação de leite pelos produtores foi reduzido mais cedo neste ano, o que também está pressionando os preços;, explicou André Braz, pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV). Tal redução no ritmo de produção de leite afetou diretamente o bolso da dona de casa Vilma Batista, 28 anos. Com um filho de quase dois anos, que consome 36 litros por mês, precisou mudar a estratégia de compra do produto. ;O leite está muito caro. Quando tem promoção, compro uma quantidade maior para estocar. Quando não tem, vou comprando um pouquinho a cada dia, até achar um supermercado com alguma oferta;, contou. ;Se tivesse a R$ 1,29, seria ótimo, me deixaria muito mais aliviada;, emendou. A caixa de um litro de leite não é encontrada atualmente por menos de R$ 2,20. Safra menor De acordo com Elson Teles, o orçamento de Vilma e do restante dos brasileiros não terá folga. ;Tivemos, neste ano, a alta do álcool e do açúcar em função da quebra de safra da cana na Índia. O Índice de Preços por Atacado de produtos agrícolas (IPA, taxa que faz parte da formação do IGP-M) está subindo muito em função das chuvas, e a alta logo chegará aos consumidores;, disse. Se essa tendência de alta nos produtos do campo se confirmar, mais elevações de preços não tardarão a chegar. As carnes, por exemplo, já começaram a encarecer. O aumento das exportações dos produtos e a redução dos abates de animais reduziram a oferta no mercado interno. Apenas a produção de carne bovina registrou, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), recuou de 2,5% na produção em 2009 frente o ano anterior. Na mesma base de comparação, a da carne de frango caiu 2,4%. Em consequência disso, em alguns açougues, tanto a carne de boi quanto a de aves estão até 20% mais caras do que no ano passado. Diante desse quadro, o pesquisador André Braz sentenciou: ;Os preços dos alimentos continuarão a pressionar a inflação, principalmente, os in natura, mais sensíveis a fatores climáticos. Não são todos os produtos que estão com altas, mas todos os que ficaram mais caros têm peso maior no bolso do consumidor;.
"As pessoas devem se preparar, pois não haverá alívio tão cedo nos preços da comida. Os sinais atuais são de aceleração"
Elson Teles, economista-chefe da Máxima Asset Management




Ouça áudio com o pesquisador André Braz, da Fundação Getulio Vargas


Em disparada Não está fácil para as famílias arcarem com os reajustes da comida Produtos - Alta em março Tomate - 48,54% Laranja-pêra - 14,91% Ovos - 13,05% Açúcar refinado - 9,51% Batata-inglesa - 8,50% Leite in natura - 6,04% Leite longa vida - 6,00% Fonte: IGP-M da FGV


Leite e ovos, os vilões A servidora pública Cláudia Barros diz que já viu a dúzia de ovos a R$ 6Justificativas não faltam para explicar a alta dos alimentos, especialmente para os vilões da vez, o leite e os ovos. Segundo os especialistas, as vacas passam por um momento de ;entressafra;, produzindo menos leite. Já as galinhas estão no período de mudança de penas, também botando menos ovos. Em março, segundo o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), os preços do leite registraram elevação de 6%, enquanto os ovos encareceram 13,05%. Com isso, os valores de iogurtes, bolos, biscoitos e de outros derivados desses dois itens estão em ritmo de alta. Outro fator a jogar os preços para cima é a quaresma, pois é comum a troca da carne vermelha pela proteína de ovos. Além disso, a fabricação de produtos típicos do período, como a colomba pascal e o chocolate, demandam tanto leite quanto ovos. ;Com a demanda maior por esses produtos e a entressafra, é natural que o consumidor encontre preços maiores;, avaliou André Braz, pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV). Para a servidora pública Cláudia Barros, 48 anos, o custo dos ovos está exagerado, principalmente os do tipo caipira. ;No mercado, encontro a dúzia a R$ 6, é um absurdo. Por isso, evito os ovos de granja, prefiro os vendidos em chácara e fazendas. Os preços são melhores e os ovos, mais saudáveis;, argumentou. ;Tanto o ovo quando leite têm subido demais por causa do consumo excessivo. É demanda demais;, ponderou o engenheiro agrônomo Ipérides Leandro Farias, 67anos, que lembrou do aumento do poder aquisitivo do brasileiro e a expansão da classe C no país. ;A mesa dos brasileiros está mais farta, assim como as dispensas;, acrescentou. (VM) Aluguel pode subir 7% O brasileiro que mora de aluguel vai penar, a continuar o atual ritmo de aumento dos preços. Se as projeções dos analistas estiverem corretas, os contratos a serem renovados no início de 2011 deverão ser reajustados em, no mínimo, em 7%. É essa a projeção do mercado para o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) (1)para este ano, usado como referência nas negociações entre locadores e locatários. Mas não é só. Também boa parte das tarifas públicas (energia, transporte urbano e pedágios, por exemplo) acompanha o indicador. Na avaliação dos analistas, o momento é de botar as barbas de molho, pois, mesmo que haja aumento da taxa básica de juros (Selic) em abril, como aposta 100% do mercado, dificilmente a inflação medida pelo IGP-M não vai de desacelerar como o desejado. Os mais pessimistas, por exemplo, não descartam a possibilidade de o índice fechar este ano com alta de até 10%, quadro semelhante ao de 2008, antes do estouro da crise mundial. ;Além da dos alimentos, estamos esperando os reajustes do minério de ferro e do aço. Sendo assim, não há como o IGP-M ficar baixo;, explicou o economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles. Os efeitos desse IGP-M alto vão perdurar até o próximo ano. ;Pode ser preocupante para a inflação de 2011, pois esse índice geralmente reajusta contratos de serviços e de aluguel, que se constituem como custos para as empresas e são repassados para os preços de bens e serviços em um cenário de crescimento econômico;, alertou Pedro Raffy Vartanian, professor de economia da Trevisan Escola de Negócios. (VM) Referência de contratos O IGP-M registra alterações de preços de matérias-primas agrícolas e industriais e de bens e serviços consumidos pelas famílias. É calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV) com base em preços pesquisados entre os dias 21 do mês anterior e 20 do mês de referência. É usado na correção de contratos de aluguel, energia elétrica, TV por assinatura e outros.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação