Economia

Enfim, governo vai enquadrar cartões

Ministério da Justiça vence disputa com o Banco Central e leniência com abusos contra consumidores terá fim

postado em 28/04/2010 07:22

A era da livre tarifação no mercado de cartões de crédito está com os dias contados. Pensando no consumidor, o governo decidiu intervir e vai enquadrar as empresas. Abusos como taxas em duplicidade e serviços cobrados indevidamente nas faturas serão coibidos. As operadoras também terão de uniformizar nomenclaturas, o que facilitará a fiscalização. As mudanças, que fazem parte de um pacote anunciado ontem pelo Banco Central e pelo Ministério da Justiça, deverão ajudar a reduzir o volume de queixas registradas nos Procons de todo o país.

Assim como os bancos (1)foram obrigados em 2007, as empresas que comercializam ou administram cartões terão de padronizar suas tarifas, informando aos clientes o que está sendo cobrado. O ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto disse também que, eventualmente, alguns serviços serão oferecidos de graça ou a custos menores. Tudo, no entanto, ainda depende de regulamentação por parte do Conselho Monetário Nacional (CMN), que vai incluir o segmento de cartões em uma resolução que teve como alvo as instituições financeiras. ;O CMN vai fazer como fez com os bancos. Isso implica em dizer quais tarifas podem ser cobradas, quais não podem ser. O ministério recebe inúmeras reclamações. Havia um clamor dos consumidores. Por isso, é fundamental que a pessoa saiba o que está pagando;, explicou Barreto.

BC e Ministério da Justiça duelaram por quase um ano até chegarem a um consenso. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, acabou derrotado na queda de braço. Assumindo argumentos do mercado, Meirelles sempre defendeu a autorregulamentação e via com ressalvas pressões externas por maior fiscalização e controle da atividade. Já o ministério sustentou ao longo do tempo posições exatamente contrárias, propondo ações proativas e rigorosas, que acabaram prevalecendo.

Negociações
Atualmente, existem cerca de 550 milhões de cartões de débito e de crédito ativos no Brasil, com faturamento superior a R$ 50 bilhões anuais. Nos últimos oito anos, 30 milhões de novos consumidores passaram a usufruir das vantagens do ;dinheiro de plástico;. Temendo que o país formasse uma legião de endividados, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou que os órgãos responsáveis encontrassem uma solução negociada com o setor privado, de forma a evitar um colapso. As negociações foram iniciadas e estavam em curso, mas, na avaliação de técnicos do governo, o ritmo não estava adequado. A autorregulamentação encaminhada pelas empresas de cartões foi considerada tímida demais.

Os problemas mais comuns comunicados por clientes aos órgãos de defesa do consumidor contra as empresas de cartões de crédito são: bitarifação (além da anuidade, as empresas cobram outras tarifas), débitos sem a comprovação de que a compra foi feita e informações incompletas ou erradas lançadas pelas companhias. Depois de telefonia, esse é o segmento mais atacado pelos brasileiros.

O governo já concluiu e vai divulgar na próxima semana um relatório completo sobre a indústria de cartões no país. Trata-se de um mapeamento detalhado e atualizado que indica, entre outras coisas, como as pessoas utilizam os serviços e quais as bandeiras mais robustas. Esse trabalho serviu de base para a elaboração de um projeto de lei que será encaminhado ao Congresso Nacional conferindo ao CMN a prerrogativa de definir regras o mercado de cartão de crédito como um todo, o que dará poderes ao conselho de ir além da definição de normas tarifárias. A intenção é aumentar a concorrência e estimular entre os consumidores o hábito de pesquisar e até mesmo de trocar de cartão de crédito ou de banco.

Ricardo Morishita, diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), disse que a ação do governo fortalece ainda mais a relação dos clientes com as empresas. Para ele, só a autorregulamentação não basta. ;Só vejo avanços com essa intervenção clara e precisa garantindo segurança jurídica nesse processo. Ganha o consumidor e ganham as empresas que são sérias;, resumiu. Ontem, o banco Itaúcard S/A foi condenado a indenizar uma cliente de Brasília em R$ 3 mil por ter cancelado o cartão de crédito da associada sem aviso prévio. Ainda cabe recurso.

O outro lado
A Associação Brasileira das Empresas de Cartão de Crédito e Serviços (Abecs) reagiu de forma contundente. Paulo Rogério Caffarelli, presidente da entidade, disse que os integrantes do setor foram pegos de surpresa pelas mudanças propostas pelo BC e pelo ministério. Segundo ele, uma reunião entre empresários e governo estava marcada para hoje, quando seriam tratados assuntos relacionados a tarifas. O encontro, porém, foi desmarcado. A Abecs informou que vai se pronunciar em breve, tão logo tenha detalhes das propostas, e espera que o governo convoque as empresas para dialogar. (Colaborou Vânia Cristino)

Luiz Paulo Barreto, Ministro da Justiça, fala sobre a regulamentação das tarifas de cartões de crédito

1 - Aliança
Bradesco e Banco do Brasil comunicaram ontem a criação de uma nova bandeira de cartões de crédito batizada de Elo. A expectativa dos dois bancos é alcançar 15% do mercado nacional nos próximos cinco anos. A bandeira pretende atrair clientes das classes de menor renda. Dentro da associação que originou a Elo, o Bradesco terá 50,01% de participação na holding e o BB, o restante. O valor de mercado estimado da empresa é de R$ 15 bilhões.

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