Economia

Investidor aposta na inflação

Temor de que a gastança do governo inviabilize o controle de preços pelo BC promove uma corrida por papéis corrigidos pelo IPCA

postado em 07/05/2010 07:42
Diante da insistência do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de manter abertas as portas para a gastança dentro do governo, os investidores vêm apostando firme na alta da inflação. Bancos e fundos de investimentos estão abarrotando os cofres com títulos públicos corrigidos pelos índices de preços, convencidos de que somente a alta da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central, que, na semana passada, passou de 8,75% para 9,50% ao ano, não será suficiente para manter a estabilidade da economia. ;É questão de sobrevivência;, disse um operador de uma das maiores instituições brasileiras.

Segundo ele, o país está pagando a fatura do ;custo-Mantega;. ;A impressão que temos, quando olhamos o quadro fiscal do governo, é a de um carro, no qual a Fazenda está pisando no acelerador e o BC, no freio. Uma hora esse carro vai quebrar e o estrago será grande;, afirmou um outro operador. Em meio a esse quadro, a alternativa está sendo a proteção dos papéis emitidos pelo Tesouro corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPCA). A demanda por esses títulos está tão forte, reconheceu o gerente de Relacionamento com os Investidores do Tesouro, André Proite, que a participação deles no total da dívida pública atingiu o recorde de 28% em março, totalizando R$ 431,6 bilhões. Esses papéis são a garantia de ganho real, independentemente do que acontecer na economia.

Na opinião do economista-chefe do Banco Schahin, Sílvio Campos Neto, a desconfiança em relação ao governo está se tornando maior porque a atual crise que atormenta o mundo decorre do descontrole fiscal dos países europeus ; em especial, a Grécia, a Espanha e Portugal. ;Em um cenário de incertezas na área fiscal, é natural que os investidor se defendam. E os papéis indexados à inflação acabam sendo a melhor alternativa;, emendou.

Lambança
Mesmo dentro do Tesouro Nacional, o desconforto é grande, porque é visível a disposição do governo de acelerar os gastos para favorecer a candidatura da petista Dilma Rousseff à Presidência de República. André Proite, não entrou nesse debate. Mas fez questão de ressaltar: ;Quando há um ciclo de aperto monetário, como o que BC começou a empreender agora, é normal que as pessoas comecem a comprar títulos corrigidos pela inflação, que protegem os investidores em um momento em que os índices de preços vêm acima do que se espera;, explicou o técnico do Tesouro.

Apesar das preocupações do mercado, Proite tentou minimizar o assunto: ;Esses títulos têm uma característica muito positiva para a administração da dívida, pois não têm grandes variações ao serem contabilizados;. Seja como for, o fato é que os investidores não escondem o medo de ;uma lambança fiscal; no último ano do governo Lula, deixando uma herança maldita para a próxima administração. Para atender à demanda dos bancos e dos fundos de investimentos, o Tesouro emitiu, entre janeiro e março, uma média de R$ 8,9 bilhões por mês em títulos indexados à inflação, o dobro do registrando em igual período de 2009, de R$ 4,114 bilhões mensais.

Silvio Campos Neto, do Banco Schahin, acredita que essas emissões devem crescer nos próximos meses, já que os gastos do governo têm estimulado ainda mais o consumo interno, pressionando mais a inflação. ;Os estímulos fiscais que foram dados no auge da crise mundial, no fim de 2008, ajudaram a colocar mais lenha na fogueira. Além disso, a qualidade das despesas públicas tem piorado bastante, exigindo mais juros por parte do Banco Central;, frisou. Ele assinalou que, no mercado, há quem diga que o IPCA deste ano deve ultrapassar o teto da meta definido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), de 6,5%. ;Não acredito que seja para tanto, mas não chega a ser impossível;, enfatizou.

Temor de que a gastança do governo inviabilize o controle de preços pelo BC promove uma corrida por papéis corrigidos pelo IPCA

Divergência sobre cortes

É visível a divisão dentro do governo sobre um possível corte de gastos para aplacar as críticas do mercado em relação à rápida deterioração das contas públicas. Apesar de o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, ter dito em depoimento no Congresso que a tesoura já estava preparada para reduzir as despesas, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, afirmou ao Correio que ;desconhecia; medidas nesse sentido.

Não é à toa que a grande maioria dos analistas não acredita mais na promessa do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de o governo cumprir a meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida) neste ano, de 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB). No acumulado entre janeiro e março, o resultado das contas públicas foi o pior para o período desde 2001, mesmo com os recordes de arrecadação. Com esse quadro, os mais pessimistas alertam para os riscos de o Brasil caminhar rapidamente para uma nova crise fiscal. (DB)


Dólar vai a R$ 1,86

Vera Batista

A onda de desconfiança que tomou conta do mundo levou a cotação do dólar a cravar ontem alta de mais de 6%, valorização que, no fim do dia, acabou recuando um pouco, mas não evitou que a moeda americana fosse negociada a R$ 1,860 para venda ( 3,51%) ; o maior preço desde 12 de fevereiro deste ano. Segundo os analistas, o dólar se tornou um dos principais refúgios para os investidores, que temem um desastre financeiro se a Europa não conseguir conter a sangria da Grécia, que já contaminou Portugal e Espanha.

;Depois que a agência Moody;s rebaixou os bancos gregos e fez um alerta quanto às instituições financeiras da Itália e do Reino Unido, aumentaram as incertezas quanto a uma solução rápida para a crise europeia. A Grécia pode ser apenas a ponta do iceberg;, disse Mário Paiva, da Corretora Liquidez. Para ele, a Europa está em frangralhos, a ponto de um fato como as eleições na Inglaterra contribuir para piorar o humor dos mercados. Por isso, ninguém se surpreendeu com a forte desvalorização do euro, que chegou a ser cotado a US$ 1,26, o nível mais baixo desde março de 2009.

Para o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, o nervosismo vai continuar. Segundo ele, muita gente se desfez de euros para comprar franco suíço. Os mais receosos preferiram os papéis do Tesouro dos Estados Unidos. A corrida por esses papéis foi tanta que as taxas de juros caíram para 3,4% ao ano ; em situações de normalidade, elas giram em torno de 5,5% anuais. No entender do especialista, esse movimento também reflete preocupações com o crescimento da China, que está obrigando o governo daquele país a restringir o crédito para conter a inflação. (Colaborou Deco Bancillon)


O número
Disparada

Preço da moeda americana chegou a subir
6,38%
ao longo da quinta-feira

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