postado em 07/05/2010 07:49
São Paulo ; Os funcionários públicos da prefeitura de São Paulo voltaram a ficar escravos do Banco do Brasil (BB) quando se fala em crédito consignado. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fez com que 149 mil trabalhadores recorram somente ao banco federal quando precisarem de dinheiro com desconto no contracheque. Segundo o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), ao obrigar o servidor a fazer empréstimos somente num banco, ocorrem dois fatores prejudiciais à economia: falta de concorrência, que puxa os preços e as taxas de juros para cima, e abuso do poder econômico.No ano passado, os servidores municipais paulistanos recebiam o salário pelo Banco Itaú e podiam fazer o consignado no banco que quisessem. Pela tabela do Banco Central, 34 instituições financeiras oferecem crédito pessoal com taxas mais atraentes do que BB, que cobra, em média, 2,40% ao mês. A menor taxa (1,66% ao mês) é oferecida pelo Banco Intercap, que opera em São Paulo. Mas, por decisão judicial, os servidores estão impedidos de recorrer a ele na hora do aperto. ;O acordo feito entre a prefeitura e o Banco do Brasil é abusivo;, diz Ione Amorim, economista do Idec.
Desde que o BB passou a operar a folha de pagamento paulistana, o sindicato dos servidores e a prefeitura travam uma batalha judicial. Os funcionários entraram na Justiça de São Paulo para derrubar a cláusula que amarra os empréstimos consignados a um único banco. Uma liminar quebrou o monopólio do BB, mas a instituição e a prefeitura derrubaram a decisão no STJ. Agora, os funcionários vão recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). ;Ninguém pode obrigar o consumidor a fazer empréstimo consignado num único banco. É como se me obrigassem a beber sempre a mesma marca de cerveja só porque sou funcionário do fabricante;, compara o advogado Antônio Maria Monfitaro.
Ao escolher o BB para processar a folha de pagamento de servidores ativos, inativos, pensionistas da administração direta, autarquias e fundações, a prefeitura levou em conta apenas o dinheiro que receberia da instituição financeira. Segundo um relatório técnico da Secretaria de Finanças ao qual o Correio teve acesso, o banco repassou aos cofres municipais R$ 726 milhões. O Banco Itaú, que era encarregado de pagar os servidores, havia repassado R$ 510 milhões para prestar o mesmo serviço.
Fortuna
Quando esse tipo de contrato é fechado, a instituição financeira lucra uma verdadeira fortuna, pois ganha de uma só vez milhares de correntistas. Com informações do cliente, fica mais fácil oferecer produtos. Para a presidenta do sindicato dos servidores de São Paulo (Sindsep), Irene Batista de Paulo, o contrato que a prefeitura assinou com o BB prejudicou os servidores, que acabaram presos a dívidas com juros mensais mais altos.
Na época em que dava expediente no Ministério da Fazenda, em 2003, o economista Bernard Appy foi consultado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para dar a sua opinião sobre a medida provisória que dispõe sobre o desconto de prestação em folha de pagamento. No quinto item de um documento assinado por Appy e encaminhado a Lula, ele diz o seguinte: ;A segurança proporcionada a esse tipo de operação deverá garantir um grande interesse na sua realização por parte das instituições financeiras, induzindo forte competição entre elas, melhorando as condições oferecias aos trabalhadores;.
Defesa do acordo
A prefeitura paulistana alegou que o prefeito Gilberto Kassab (DEM) determinou que os recursos repassados pelo Banco do Brasil (BB) serão investidos em obras de expansão do metrô. Na mensagem, diz ainda que ;os servidores municipais continuam tendo total liberdade de escolha na contratação de empréstimos, uma vez que o servidor não está impedido de contratar crédito pessoal com outras instituições financeiras que por ventura venham a oferecê-lo (SIC) condições mais vantajosas que aquelas ofertadas pelo BB;. O empréstimo sugerido não é o vinculado ao contracheque. Como há risco de inadimplência, tem juros mais altos.
O BB se defendeu em nota alegando que a exclusividade nas operações de crédito consignado não atenta contra a livre concorrência bancária e que se trata de prática comum de mercado. Diz ainda que, embora seja líder no segmento, detém ;apenas; 34,4% de participação nesse mercado. O banco afirma também que cabe ao empregador escolher a instituição que administra a folha de pagamento e tem exclusividade no consignado. Segundo a diretoria do banco, o monopólio traz ganho para o empregador, como a redução dos custos de gerir a folha, bem como amplia seu poder de negociação junto às instituições. O Idec não concorda com esses argumentos. (UC)