Vera Batista
postado em 02/06/2010 09:03
Se os investidores realizam uma verdadeira corrida ao ouro, os que usam o metal precioso como ornamento não ficam atrás. Hoje, o Brasil é o 10; maior mercado comprador de joias do mundo ; posição que é mantida graças aos 30 milhões de brasileiros alçados à classe média nos últimos anos. Tamanha força econômica tem impulsionado a joalheria nacional e apenas em 2009 o segmento de peças em ouro faturou US$ 1,3 bilhão. Somente nos primeiros cinco meses deste ano, a demanda por esses produtos já avançou cerca de 20% frente a igual período do ano passado.Os dados são parte de um levantamento do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos (IBGM), obtido com exclusividade pelo Correio. Comparado às nações que mais demandam joias, a bandeira verde e amarela está à frente até mesmo da poderosa economia alemã, o sustentáculo da comunidade europeia. ;Desde 2000, a Europa vem em um processo de declínio no consumo desses produtos, principalmente os feitos de ouro. Com a crise, essa procura na Itália caiu 65,5% até o ano passado. Quase quebrou o mercado joalheiro por lá;, contou o presidente do IBGM, Hécliton Santini Henriques.
No Brasil, o tombo também foi expressivo, de 40,3%, entre 2007 e 2009. Ainda assim, o mercado vendeu 30,9 toneladas no ano passado. Para esse ano, a expectativa é de se aproximar dos 50 mil quilos. O cenário de expansão de renda e de fartura de crédito vivido pelos brasileiros nos últimos anos deve garantir esse volume de vendas e a ida dos consumidores às lojas. A dona de casa Isabella Cristina Souza, 23 anos, é uma das que não perde a oportunidade de adquirir uma peça. ;Se eu pudesse, só usaria ouro branco. Normalmente, gosto de pulseiras e de brincos;, disse Isabella. A última aquisição, porém, foi por necessidade. Perdeu a aliança quando arrumava a casa e depois de muita procura correu para uma loja. ;Não podia ficar sem. Significa muito para mim e para o meu marido. Quem sabe no Dia dos Namorados ele não me presenteia com uma ainda mais bonita?;, brincou.
As grandes joalherias nacionais e internacionais, assim como Isabella, não interpretam o ouro como uma commodity talhada para proteção diante das incertezas globais. Essas lojas tentam se manter fiéis ao cliente, longe da pressão dos investidores. ;Ou seja, atitude completamente diferente da intenção declarada do especulador, de auferir lucro com o ouro cotado nas bolsas de valores;, argumentou Christian Hallot, embaixador da marca H. Stern no Brasil. Ele explicou que a relação do comprador com a joia é afetiva e não monetária. ;Temos a capacidade de encantar mesmo em momentos de crise. Respeitamos o cliente e não pensamos apenas no curto prazo;, avaliou.
Preço
Com os bancos centrais aumentando suas posições em ouro (veja quadro) e os investidores aplicando no metal para se proteger das oscilações do mercado de capitais, as mineradoras tem corrido contra o tempo para atender a toda essa demanda. Os preços, por outro lado, dispararam. Apenas neste ano, o grama do ouro acumulou alta de 16% na BM. Os clientes das joalherias também sentiram o impacto. De acordo com a inflação oficial, as joias subiram 6,6% somente no primeiro quadrimestre de 2010.
;Por enquanto, mesmo com a disparada do ouro, os preços não subiram muito para os clientes. As joalherias têm usado subterfúgios para evitar uma grande alta;, explicou Hécliton Santini, do IBGM. ;Temos apostado em designs diferenciados, com mais espaços abertos. São joias mais leves, com mais ouro misturado a outros metais e muitas pedras. No fim das contas, temos um produto bonito, valorizado, não tão caro e que ainda atrai os consumidores;, concluiu.
Conservador
Acompanhando as vendas da Vivara, Bruna Rosso, gerente de Marketing da rede, percebeu que no auge do estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos, quando todos previam que o mundo ia desabar junto com Wall Street (região onde fica o mercado financeiro norte-americano), o brasileiro segurou o dinheiro no bolso. Até mesmo os artigos democráticos, que todas as camadas da população compram, como as alianças, tiveram pouca saída. A classe C, estreante no mercado de consumo devido aos programas sociais do governo, evitou se endividar.
Em função de preocupações com o emprego e pela queda da massa salarial, as compras de presentes para ocasiões festivas, como nascimento, gravidez, noivados, também registraram queda. Situação que se repetiu em todos os países. Segundo dados da IBGM e da consultoria em metais preciosos GFMS Gold Survey, enquanto o preço do ouro subiu 39,82% entre 2007 e 2009, a fabricação de joias no mundo caiu 25,74%.
Porém, no fim do ano passado, essa procura se normalizou. Já em 2010, no período do Dia das Mães foi registrado aumento de aproximadamente 15% em relação ao ano anterior. ;É importante destacar que as mulheres começaram a consumir mais. A valorizar o seu bem-estar. Elas trabalham, têm bons salários e estão usando e abusando da liberdade de escolha;, frisou Bruna. ;Uma joia é para sempre e pode ser admirada a qualquer momento;, lembrou Hallot.
A despeito dos números negativos nos últimos anos, as flutuações do preço do ouro não interfiram em alguns setores, abençoados pelo capital, onde até as crises econômicas, financeiras, soberanas, de confiança ; não importa a nomenclatura ; demoram a chegar. São negócios que lidam estreitamente com o conceito de valor, com a vaidade e com o excitado mundo do alto luxo. ;A nossa sensação é de que as pessoas não se percebem gastando apenas em um artigo considerado supérfluo. Estão investindo, digamos assim, de outra maneira: em algo que as deixa felizes;, afirmou Bruna Russo.
Para o embaixador da marca H. Stern, é exatamente nessas situações de crise que o cliente fica mais exigente. Compra menos quantidade e mais qualidade. ;A H. Stern vende muito mais que o preço do dinheiro pode comprar. A felicidade é maior que tudo;, finalizou.