Marcone Gonçalves
postado em 11/06/2010 08:33
O governo está vivendo um grande dilema: ao mesmo tempo em comemora o crescimento chinês do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre, de 9% ante o mesmo período de 2009, está reticente quanto à revisão que será obrigado a fazer nas estimativas de receitas com impostos. Nas contas de técnicos especializados no Orçamento da União, somente o aumento da projeção do crescimento econômico, dos atuais 5,2% para 6,5% neste ano, elevará a arrecadação em cerca de R$ 8 bilhões. Caso o resultado final do PIB chegue a 7%, o extra passará de R$ 10 bilhões.Pelo menos por enquanto, a equipe econômica não quer nem tocar no assunto. O grupo liderado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, teme que, ao reconhecer receitas maiores em função do PIB ;espetacular;, o governo tenha que ceder às pressões por aumentos de salários e aposentadorias. Está na mesa do presidente Luís Inácio Lula da Silva, por exemplo, o projeto aprovado no Congresso que concede correção de 7,7% aos beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que ganham acima de um salário mínimo. Várias categorias do funcionalismo público estão em greve pleiteando ganhos nos rendimentos.
A pergunta que se faz no entorno político de Lula é como vetar o reajuste a aposentados ; o que deve ser feito até a próxima segunda-feira ; e continuar negando salários maiores aos servidores ante a elevação da arrecadação? ;Temos uma ótima notícia, mas, por enquanto, não podemos fazer uso dela;, diz um dos assessores mais próximos do presidente. No que depender da equipe econômica, as receitas adicionais devem reforçar o superavit primário, economia para o pagamento de juros da dívida. O objetivo de Mantega é anunciar, mais à frente, um resultado maior do que a meta de 3,3% do PIB, que os investidores não creem que será atingida, tamanha tem sido a gastança com a máquina pública para bombar a candidatura da petista Dilma Rousseff ao Palácio do Planalto.
Na avaliação da equipe econômica, apesar de os reajustes serem eleitoralmente favoráveis à Dilma, em meio à crise de confiança que assola o mundo, por causa do derretimento da Zona do Euro, o melhor a ser feito agora é cumprir o discurso do equilíbrio fiscal. Ou seja, agregar a arrecadação extra originária da revisão do PIB ao contigenciamento de quase R$ 30 bilhões que o governo fez no Orçamento, para rebater as críticas do mercado e ajudar no controle da inflação.
Tesoura
Segundo José Fernando Cosentino Tavares, técnico do Núcleo de Equilíbrio Fiscal da Câmara dos Deputado, o impacto de pelo menos R$ 8 bilhões nas receitas por causa da revisão do PIB leva em conta cálculos do Ministério da Fazenda, que foram apresentados no mês passado durante a segundo revisão orçamentária. Naquela ocasião, o ministério estimava crescimento econômico de 5,2%, com a arrecadação total da Receita Federal atingindo R$ 526,3 bilhões ao longo do ano. Em maio, a Fazenda passou a tesoura nos gastos em R$ 7,5 bilhões.
[SAIBAMAIS]Os consultores legislativos assinalam que foi o próprio governo que projetou crescimento real da receita pública administrada de 0,63% para cada um ponto percentual de acréscimo do PIB. As receitas também crescem com a inflação(1): para cada um ponto percentual de alta no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), as receitas sobem 0,61%. Feitas as contas, os técnicos descobrem uma elevação de 2,2% sobre a previsão do PIB estimado pelo governo, de R$ 3,452 trilhões para R$ 3,530 trilhões. Com isso, o impacto final sobre a arrecadação total deve ficar em 1,4%, que representa os cerca de R$ 8 bilhões.
Segundo os consultores legislativos, a recomposição das receitas por causa do crescimento econômico não obriga os governo a rever todo o Orçamento. Pode-se aproveitar os ganhos extras para aumentar o superavit fiscal. Não há obrigação, sequer, de recompor os gastos que foram cortados no contigenciamento. O diferencial de receita tem que ser incorporado ao Orçamento, mas isso é feito por meio de projeto de lei de crédito adicional que pode determinar quais projetos considera prioritário. O orçamento total da União para 2010 aprovado pelos parlamentares é de R$ 1,86 trilhão, sendo que R$ 1,26 trilhão podem ser efetivamente gastos ; o restante refere-se ao financiamento da dívida pública federal.
1 - Otimismo com o IPCA
O Ministério da Fazenda divulgou ontem o boletim Economia Brasileira em Perspectiva, no qual prevê que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechará este ano ;próximo de 5%;. Tal projeção está mais otimista do que a do mercado financeiro, que trabalha com 5,6%. A Fazenda atribuiu a alta da inflação nos primeiros meses do ano aos alimentos, por causa do excesso de chuvas, às tarifas públicas, aos gastos com educação e aos combustíveis. A meta para o IPCA deste ano perseguida pelo Banco Central é de 4,5%.