postado em 13/06/2010 07:23
Enquanto o mundo rico patina ao sabor de deficits gigantescos, desemprego em alta e pacotes de ajustes radicais, as nações em desenvolvimento, entre elas o Brasil, já dão como certos saltos robustos do Produto Interno Bruto (PIB) ao fim de 2010. Trata-se de uma inversão de papéis. Diferentemente de outras épocas, serão as subpotências e os países de economia média os responsáveis por turbinar o crescimento global. Regiões como Japão, Estados Unidos e União Europeia, de tão fragilizadas, flertam com o risco de amargarem estagnações que podem durar anos a fio.O desempenho pífio das economias mais tradicionais será compensado, em parte, pelo fôlego dos que não figuram no seleto grupo dos ricos. O equilíbrio só não será maior porque o comércio internacional ainda não flui como antes do estouro da bolha imobiliária americana em 2008, comprometendo a performance das commodities(1) ; itens primários produzidos em larga escala e cotados em bolsa. Como quase todos os que estão ampliando o Produto Interno Bruto (PIB) neste momento dependem da compra e da venda desses artigos, os ganhos não serão completos.
Dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) indicam que a economia global levantou-se da recessão antes do que se previa, mas as finanças públicas acabaram vitimadas devido a esforços intensos dos governos em fazer girar o consumo e a atividade industrial internos. Na Europa, onde países como Portugal, Espanha, Hungria e Grécia cortaram na própria carne e aumentaram impostos para compensar parte da explosão de suas dívidas, os prognósticos são incertos. Há quem aposte em um longo período de trevas, regado a buracos no Orçamento e a deflações.
Peso morto
Francisco Barone, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape) da Fundação Getulio Vargas (FGV), explica que, em tese, os países em desenvolvimento estão crescendo mais porque a mola mestra conta com melhor pressão. O especialista não crê em uma década perdida para aqueles que estão em dificuldades, mas adverte: ;É muito mais difícil colocar nos trilhos um desses países que estão mal do que uma economia em desenvolvimento;. Por enquanto, alerta, carregar os ricos nos ombros tem sido relativamente fácil para os não ricos. ;Mas se ocorrer outra crise sistêmica como a de 2008 os países em desenvolvimento não vão poder carregar o peso morto em que se transformaram os ricos. A estabilidade econômica mundial é feita hoje por nós;, completa.
A taxa de expansão global prevista para este ano é foco de controvérsias. Algo como 4,2% está no radar do FMI, enquanto o Banco Mundial (Bird) projeta ganho entre 2,9% e 3,3%. A imprecisão dos organismos internacionais passa pela crise europeia, mas também pelo fato de a comunidade especializada simplesmente não saber o que vai acontecer com o Japão e os Estados Unidos. O primeiro, mergulhado em duas décadas de problemas fiscais e monetários, não dá sinais de que se erguerá tão cedo. O segundo, apesar de deter uma economia mais flexível, também não tem apresentado resultados robustos em áreas sensíveis como, por exemplo, o mercado de trabalho. Enquanto isso, países como México, Argentina e Brasil devem crescer entre 4% e 7%. Índia e China, por sua vez, crescerão entre 8% e 10%.
Lentidão
Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, diz que quanto mais rígida é a economia, mais difícil será para que ela deixe a crise. Pior para o Japão e a Europa. ;O que os ricos precisam fazer é um belíssimo ajuste fiscal. Parte deles até fez isso no passado. A diferença agora é a força. No atual quadro, a tendência é de esses países crescerem menos e de alguns continuarem estagnados. O Japão, por exemplo, está virando uma grande Argentina, onde há política econômica mal conduzida, o que acabou virando um caso político mal conduzido;, justifica.
A expectativa é de que o conserto custará caro e levará bem mais tempo. Ao contrário do aperto realizado nos anos 1980 e 1990 na América Latina, os europeus que agora tentam juntar os cacos e caminhar rumo a um processo de crescimento sustentado têm sérios obstáculos pela frente.
Cristiano Souza, economista do Banco Santander, afirma que o acerto fiscal, pela profundidade e extensão, será emblemático. ;Vai demorar mais do que demorou entre os emergentes. Como gerar crescimento rápido suficiente para resolver o problema fiscal? Será difícil para muitas economias europeias conseguir competitividade;, prevê. ;Há ainda uma expectativa de deflação em alguns países ricos e isso é pior do que inflação, porque as pessoas postergam consumo;, finaliza.
1 - Jogo imprevisível
Uma parte dos analistas acredita que os países emergentes terão dificuldade de sustentar seu próprio crescimento e o do mundo em patamares tão altos porque lidam com problemas crônicos de infraestrutura. Há ainda a questão das commodities, que oscilam aos ventos da enorme volatilidade causada pela recente crise europeia, e jogam incertezas sobre as nações que pretendem guiar a expansão global.