Marcone Gonçalves
postado em 28/06/2010 07:49
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve entregar ao seu sucessor uma série de indicadores recordes para a atividade econômica, o mercado de trabalho, o consumo e a renda dos brasileiros. Além disso, vai deixar de legado uma bem montada aliança política na qual o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) assumiu uma posição chave nos mistérios que, direta ou indiretamente, afetam os principais setores da economia. Hoje, boa parte da área econômica do governo está nas mãos do partido: do Banco Central, com Henrique Meirelles, aos fundos de pensão de estatais (leia quadro na página 11).De acordo com analistas de mercado e ex-integrantes do governo Lula e do governo Fernando Henrique Cardoso, o apoio do PMDB é fundamental para viabilizar a aprovação das propostas do governo no Congresso, a despeito da histórica associação do partido com o clientelismo e o loteamento de cargos. No entanto, todos alertam que isso não se traduz na capacidade de a agremiação influir na gestão econômica. Para Carlos Thadeu de Freitas, economista da Confederação Nacional do Comércio, a área econômica no governo brasileiro adquiriu autonomia própria. ;O fato do Meirelles ser presidente do BC e filiado ao PMDB é mera coincidência;, assinala.
Presença
Para o economista, que foi diretor do Banco Central, quem manda na economia brasileira é o presidente da República, o único responsável por escolher os nomes que vão ocupar os postos relevantes, aqueles que vão afetar o dia a dia da vida econômica do país, como os integrantes do BC e do Ministério da Fazenda. ;É o presidente que influencia na economia. Nem o PT teve influência partidária. Estamos relativamente imunizados;, destaca.
No entanto, com a confirmação da candidatura a vice na chapa da candidata do PT, Dilma Rousseff, o partido deixou claro que pretende consolidar ainda mais a sua presença e o papel nos rumos futuros da economia, o que pode se traduzir, caso o PT vença as eleições, em uma presença ainda maior nos cargos mais importantes. Isso porque, pela primeira vez, o maior partido do país seguirá praticamente unido em torno de uma candidatura. ;Só na eleição do Tancredo o PMDB esteve tão unido;, destaca o ex-governador do Rio de Janeiro Wellington Moreira Franco, integrante da executiva e coordenador do recém-lançado programa de governo do partido.
Segundo Moreira Franco, o objetivo do PMDB é aproveitar essa unidade inédita que pacificou o partido e montar uma máquina eleitoral poderosa. ;Aí depois é que vamos ver o que fazer;, assinala ele, que também ocupa o posto de vice-presidente da Caixa Econômica Federal. Daí porque, afirma, é nesse momento os pemedebistas não discutem cargos. O partido aposta numa aliança programática e pôs na mesa suas principais propostas econômicas, elaboradas com a participação do presidente do BC, Henrique Meirelles, e do ex-ministro da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger. Todas elas giram em torno da manutenção das políticas que estão em vigor e da defesa do aumento da poupança. ;O nosso esforço agora é para ganhar a eleição, concluir essa etapa política e consolidar as alianças no plano estadual e, depois irmos para a campanha eleitoral com todos os problemas resolvidos. Aí é ganhar a eleição;, destaca.
Loteamento
De acordo com um ex-integrante da cúpula do governo Lula, que preferiu não se identificar, a aliança com o PMDB, e o consequente loteamento de cargos, é muito mais justificável do que outro fenômeno político que os petistas teriam herdado do governo anterior: a privatização dos cargos públicos, para os quais eram nomeados agentes ligados ao mercado. ;É a regra do jogo democrático. Há bons e péssimos quadros em todos os partidos. Para controlá-los é que existem o TCU, a AGU, o Ministério Público;, afirmou.
O economista Carlos Thadeu lamenta o fato de ainda existir o loteamento de cargos públicos em áreas sensíveis como a da infraestrutura e energia, mas argumenta que o país avançou nessa questão. ;Anos atrás havia loteamento generalizado até no Ministério da Fazenda. Isso mudou, embora persistam resquícios em certas estatais e ministérios, que são parte da concessão política que deve ser evitada no futuro;, assinala.
O sociólogo e historiador Marco Antônio Villa vê, nas próximas eleições, a oportunidade de o próximo presidente propor uma coalização política com base programática e romper com a prática do ;é dando que se recebe;. Em seu blog, o professor da Universidade Federal de São Carlos argumenta que os congressistas fisiológicos não ;têm peito; para publicamente enfrentar o presidente eleito por 50 milhões de votos. ;Não é uma ilusão. É necessário dar um basta ao saque organizado do Estado;, escreve.