postado em 11/07/2010 08:21
Enquanto o Brasil espera a Copa de 2014, os times nacionais tentam sobreviver em meio às dívidas que crescem, na média, 11,6% ao ano. A bola de neve já soma R$ 3,1 bilhões e estampa a má gestão do futebol nacional. A cifra é devida pelos 26 clubes de maior destaque no país, a maioria deles especialista em dar dribles na Previdência, nos trabalhadores e atletas, na Receita Federal e nos governos estaduais. Se o débito fosse executado, fecharia as portas de muitos clubes ou os derrubaria para as categorias amadoras do esporte. Do outro lado do campo, sem contra-ataques rápidos, as receitas dos times avançam lentamente, ao ritmo de 6,8% ao ano.O cenário levantado pela consultoria Crowe Horwath RCS e pelo site português Futebol Finance é pouco animador. ;Endividamento crescer mais do que os resultados é mortal para qualquer empresa. É uma coisa que leva a um desastre;, sentencia o presidente da Consultoria LatinLink, Ruy Coutinho. ;É altamente preocupante. Contraria toda a técnica de boa gestão, a não ser que tenha um grande esquema de subsídio e ajuda governamental;, acrescenta. O governo tentou ajudar. Parcelou os débitos que lhes eram devidos e criou a loteria Timemania, para injetar receita nas agremiações. Mas a iniciativa não foi suficiente para conter a sangria do futebol brasileiro.
Segundo a Crowe Horwath, de 20 times avaliados, apenas três apresentaram superavit (gastos menores do que a arrecadação) em 2009: Atlético Paranaense, Corinthians e São Paulo. O restante registrou deficits milionários. Os maiores estão no Santos (R$44,9 milhões), Palmeiras (R$ 41,2 milhões) e Flamengo (R$ 31 milhões).
Torcida
Para tentar minimizar os problemas financeiros(1), os clubes se voltaram para os torcedores e para a fidelização deles. O Internacional, de Porto Alegre (RS), é um dos que atua mais fortemente nesse sentido. Até 2004, tinha pouco mais de 30 mil sócios-torcedores. Atualmente, somam mais de 100 mil associados. Ainda assim, entre 2008 e 2009, viu suas dívidas crescerem 5%, chegando a R$ 147,5 milhões. ;Uma conta dessas assusta. O que me tranquiliza é que nossa dívida é de médio prazo e temos a segunda maior arrecadação do Brasil;, afirma o torcedor do Inter Sandro Massena, administrador por profissão e associado do clube desde o segundo dia de vida. ;Nasci em 19 de dezembro de 1976. No dia seguinte, meu pai fez a minha carteirinha.;
O São Paulo também é uma das equipes que está investindo no torcedor. A partir de uma forte diretoria de marketing, passou a fidelizar e renovar o plantel de associados com o batismo tricolor. O pai leva a criança ao Morumbi onde ocorre uma cerimônia de iniciação no clube. Os pequenos ganham brindes e um certificado. Tudo ao custo R$ 120. Ações como essa colocaram o time no topo do ranking de arrecadação. Em 2009, foram R$ 160,4 milhões.
Gestão
A realidade do clube paulista, porém, não é a mesma do restante do país. As quatro principais bandeiras cariocas são as mais endividadas (veja quadro). O Fluminense tem o maior débito a pagar. Deve R$ 329,2 milhões e arrecadou, no ano passado, apenas R$ 61,2 milhões. ;Esse tipo de problema atrapalha a produtividade, porque é preciso dedicar boa parte dos recursos para liquidar essas dívidas ou para diminuir o estoque delas;, explica Coutinho. A queda de produção à qual ele se refere é o exemplo do Vasco da Gama. Atolado em contas, a equipe caiu para a série B em 2008 e, hoje, soma a segunda maior dívida do Brasil: R$ 327,4 milhões.
;O problema é que na presidência dos times não existem executivos remunerados. São todos torcedores apaixonados ou pessoas com algum interesse;, lamenta Amir Somoggi, um dos responsáveis pelo levantamento da Crowe Horwath e especialista em marketing e gestão de clubes. Para ele, as administrações das equipes até que têm começado a se profissionalizar, mas somente no segundo escalão da cartolagem. A presidência ainda fica para os políticos, torcedores e outros interessados. ;Esses times podem até passar por extrema dificuldade financeira, mas não chegam a quebrar. O que pode ocorrer é os credores bloquearem suas receitas;, afirma.
O resultado não poderia ser diferente. O esporte que é a paixão nacional transformou-se em vítima do fluxo de caixa e ficou praticamente impedido de formar boas equipes.
1 - Venda de passes
As receitas dos times brasileiros com a venda de atletas estão em queda. Enquanto, em 2007, representavam 37% do que entrava no cofre dos clubes, em 2009, tal participação caiu para 19%. Em igual período, as cotas de tevê subiram de 23% para 28%. De todas as agremiações, apenas cinco têm ganhos anuais acima de R$ 100 milhões: São Paulo, Corinthians, Palmeiras, Internacional e Flamengo.