Vera Batista
postado em 13/07/2010 07:32
O Goldman Sachs, um dos maiores bancos dos Estados Unidos, vive um período de inferno astral. Depois do pior golpe em sua reputação, com a acusação da Securities and Exchange Commission (SEC, o órgão regulador do mercado de capitais nos EUA) de fraudar investimentos atrelados a hipotecas de alto risco e acarretar prejuízos de mais de US$ 1 bilhão a seus clientes, a instituição passou a ser investigada pela Polícia Federal brasileira. A suspeita é de uso de informação privilegiada (inside information) em negócios com ações das empresas de papel e celulose Ripasa, Suzano e Votorantim. É um longo processo, que começou em 2004. Dez executivos das companhias já foram responsabilizados e condenados a pagar multas de R$ 50 mil a R$ 1 milhão.Alguns envolvidos assinaram termos de compromisso com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que fiscaliza o mercado acionário do país, para ressarcir perdas impostas a investidores. Apesar dessa brecha aberta pela CVM para encerrar os processos, o Goldman Sachs se recusou a um acordo mediante o pagamento de multa. Alegou ter feito apenas ;assessoria informal para definir a modelagem da negociação com ações e contatar possíveis investidores;. Como determina a lei, a CVM encaminhou o processo relativo ao gigante norte-americano ao Ministério Público, que pediu à PF a abertura de inquérito. A assessoria da PF informou que a Divisão de Repressão a Crimes Financeiros ainda não concluiu o parecer sobre o caso.
Procurado pelo Correio, o Goldman Sachs não quis se manifestar sobre o assunto. Nem seu advogado, José Roberto de Camargo Opice, do escritório Machado Meyer. Fontes próximas garantiram, porém, que o banco tem colaborado com as autoridades e mantém um rígido sistema de Chinese Wall, prática que evitaria o conflito de interesses dos bancos com os de seus clientes. Essas mesmas fontes afirmaram ainda que não existe justificativa para a investigação da Polícia Federal. A CVM, por força de lei, não pode comentar processos até que uma decisão definitiva se torne pública.
Lucro alto
O suposto envolvimento do Goldman Sachs em uso de informação privilegiada para ampliar seus lucros em detrimento dos investidores começou a ser delineado no inquérito administrativo aberto pela CVM em novembro de 2004. Técnicos da autarquia constataram movimentos atípicos nos preços e nos volumes de ações da Ripasa na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Questionada à época, a Ripasa, em comunicado ao mercado, informou que a procura repentina por seus papéis e a alta das cotações decorriam ;de análises e alternativas que antecipavam o crescimento futuro da companhia;.
Menos de 20 dias depois, em meio a especulações na mídia sobre a venda do controle acionário da Ripasa, os papéis perderam valor e só voltaram a subir quando, em 10 de novembro de 2004, após o término do pregão, foi publicado fato relevante informando a aquisição do controle da Ripasa pela Suzano e a Votorantim. A CVM constatou que, de outubro a novembro de 2004, o Ibovespa, índice mais negociado na bolsa paulista, registrou valorização de 5,68%, enquanto as ações da Ripasa apresentaram alta de 11,55%. Esse movimento teria sido puxado por operações comandadas por pessoas e instituições que teriam se beneficiado de informações privilegiadas sobre a venda da empresa.
Com esse artifício, ganharam muito dinheiro os acionistas da ZDZ Participações e Administração, então controladora da Ripasa, Antônio Elias Zogbi Neto, Cláudio Zarzur, Márcio Roberto Zarzur e Tony Omar Zarzur, que deixaram de divulgar o fato relevante sobre a operação de venda para a Suzano e a Votorantim. Também lucraram Romeu Alberti Sobrinho, diretor de Relações com Investidores da Ripasa, e executivos da Suzano e da Votorantim. Em outubro de 2009, o colegiado da CVM analisou as propostas de termo de compromisso feitas pelos envolvidos. Para encerrar as investigações, a autarquia fixou multas, de acordo com as responsabilidades, entre R$ 50 mil e R$ 1 milhão.