Aposentar-se com renda tem deixado de ser um benefício para os precavidos e, aos poucos, vem se tornando regra no Brasil. Com a formalização do mercado de trabalho, mais pessoas estão contribuindo para a previdência e a quantidade de brasileiros protegidos pela seguridade social chegou ao maior patamar da história: 66,9% da população do país. Entre os idosos, o percentual também é elevado. São 81,78% com cobertura previdenciária ; o maior patamar dos últimos quatro anos.
Na comparação entre homens e mulheres, o sexo masculino está na frente. Essa população, embora menor que a feminina, é a que mais está protegida pela previdência, com 86,6% desse contigente recebendo salário pela seguridade social. Para as mulheres, a estatística é um pouco menor. São 77,87% com renda garantida pela previdência. Em números absolutos, os idosos protegidos crescem a cada ano. Entre 2008 e 2009, 500 mil entraram nesse grupo que vive das transferências feitas pelo governo.
Marcelo Néri, economista-chefe do Centro de Estudos Sociais da FGV, fala sobre o aumento da população resguardada pela previdência social
Para João Ernesto Aragonés Vianna, secretário executivo do Ministério da Previdência Social, o crescimento do país, a partir de 2003, foi o responsável por esse avanço na quantidade de brasileiros protegidos pela seguridade. ;Nos últimos sete anos, revertemos a curva até então decrescente e perversa, que excluiu do sistema previdenciário e do mercado de trabalho formal milhões de brasileiros;, afirma. ;Passamos de uma previdência desacreditada e à beira da privatização para uma de todos os brasileiros.;
Direitos
Joel Ferreira da Silva, 74 anos, experimentou dois brasis bem diferentes, um primeiro em que a seguridade social era algo inimaginável e outro, no qual pôde se aposentar com uma boa renda e viver o restante da vida com dignidade. Garimpeiro por obrigação no sertão da Bahia, teve de seguir a profissão do pai para não morrer de fome ; um trabalho sem carteira assinada e cheio de riscos. ;Não existia direito nenhum, nem para se aposentar. Era uma profissão injusta;, conta Silva. ;Se alguém morresse caindo de um barranco não fazia diferença, não era nada demais;, indigna-se.
Só descobriu o que era previdência depois de atravessar parte do país a pé. Ele e o pai andaram de um garimpo no Piauí até o meio de Goiás em busca de ouro, mas o que encontraram foi uma cidade em construção. ;Meu primeiro emprego com carteira assinada foi em Brasília. Ajudei a construir o Palácio do Planalto;, lembra, orgulhoso. Depois disso, conseguiu trabalho no setor de manutenção da Câmara dos Deputados e passou a ter direito à aposentadoria.
Ainda hoje no Brasil, empregos de alto risco e sem proteção social existem, mas com o desenvolvimento econômico vivido pelo país essa população vem se reduzindo. ;Ainda temos um alto número de trabalhadores desprotegidos. Como mais da metade tem renda acima de um salário mínimo, é possível incluirmos esse contingente no sistema com ações de incentivo à formalização;, diz Aragonés.
Contraponto
O economista-chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), Marcelo Neri, concorda que o crescimento econômico do país e políticas públicas voltadas para a terceira idade foram determinantes para que mais idosos pudessem se beneficiar de uma previdência melhor. Porém, pondera que existe outro motivo para o avanço. ;Um fator que explica essa melhora no presente é o aumento da população idosa no país;, argumenta. Entre 2001 e 2009, segundo a Pnad, a população na terceira idade cresceu 40,5%.
Neri destaca também que o valor dos rendimentos dessa população obteve avanços. Passou de R$ 278 em 1992 para R$ 537 em 2009. Ainda assim, para muitos brasileiros, a aposentadoria não é suficiente. Dos 21,7 milhões de idosos, 6 milhões continuam economicamente ativos, caso dos taxistas José Morais de Matos, 71 anos, e Jonas Antunes, 66. Mesmo depois de conquistarem o direito, nunca deixaram de trabalhar. ;Se paro com o táxi, as coisas apertam lá em casa;, explica Matos. ;Meu orçamento não iria pagar todas as contas;, emenda Antunes.
PALIATIVO À POBREZA
; A falta de emprego e de condições adequadas para sobrevivência tem obrigado o Estado a suprir as necessidades básicas de milhões de brasileiros. De acordo com estudo do Ministério da Previdência Social, com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), caso não houvesse seguridade social no Brasil, 42,2% de toda a população brasileira estaria abaixo da linha da pobreza. Seriam 78,2 milhões de pessoas com rendimentos muito inferiores a um salário mínimo ou mesmo sem renda alguma. Com os pagamentos dos benefícios e assistências, essa situação é minimizada, mas o contigente de miseráveis continua a existir. Hoje, eles são 29,7% de toda a população.