Jornal Correio Braziliense

Economia

Banco PanAmericano tem R$ 1 bi em créditos podres

Os executivos do PanAmericano promoveram um verdadeiro festival de irregularidades na instituição controlada por Silvio Santos. Segundo técnicos envolvidos na investigação, quanto mais se reviram as contas, mais problemas aparecem, o que tem tirado o sono do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ainda que, publicamente, ele garanta que ;agiu a tempo e a hora; para evitar respingos no sistema financeiro nacional. Há o temor de que mais bancos de menor porte tenham enveredado pelo mesmo caminho do PanAmericano, mostrando uma saúde que realmente não têm.

A última descoberta em relação à instituição de Silvio Santos é que ela emprestava dinheiro sem critério e amarga um índice de calote superior a 12%, quase o dobro do registrado no mercado. No balanço de 30 de junho deste ano, consta R$ 1 bilhão em empréstimos considerados podres ; um dinheiro que foi dado a clientes de altíssimo risco. O objetivo era gerar uma carteira de crédito gigantesca para inflar o patrimônio.

Tanto que, mesmo com a crise financeira que abalou o mundo, a partir de setembro de 2008, o
PanAmericano seguiu a tônica inversa do restante do mercado. Enquanto as instituições menores encolhiam as concessões de empréstimos, a financeira de Silvio Santos ; talvez inspirada pelo bordão do patrão ; ;Quem quer dinheiro?; ; expandiu a liberação de crédito dando capital a quem não podia pagar. ;Esses executivos eram muito criativos, mas para o mal;, lamenta um técnico do sistema financeiro.

Do R$ 1 bilhão dado a consumidores sem perfil adequado, 46,83% estão em atraso há mais de 14 dias ; o equivalente a R$ 470 milhões. O tamanho do buraco, porém, pode ser ainda maior, já que os administradores do banco maquiavam a contabilidade para dar bons resultados ao Grupo Silvio Santos.

Prejuízos
O temor do BC é de que esses créditos podres tenham sido vendidos a outras instituições que agora correm o risco de amargar prejuízo bilionário. Se esses empréstimos arriscados não tiverem sido vendidos à outras instituições, o impacto no sistema financeiro será menor, mas, em contraponto, o PanAmericano pode perder ainda mais valor de mercado ao ser vendido ; o que deve ocorrer rapidamente para que Silvio Santos possa arcar com parte da dívida de R$ 2,5 bilhões que fez com o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) e que impediu a bancarrota de seu braço financeiro. A Caixa Econômica Federal, que tem 49% do capital votante do banco, também trabalha para a venda.

Outra engenharia mirabolante dos executivos do PanAmericano fez o empresário mineiro Adalberto Salgado, de Juiz de Fora (MG), receber incríveis 27% anuais de rentabilidade em uma aplicação de R$ 386 milhões em certificado de depósito bancário (CDB). O resultado obtido pelo empresário ; de quase R$ 120 milhões ao ano ; é praticamente o triplo da remuneração das taxas médias de mercado de 10,75% ao ano. A suspeita é de que a operação era usada como um atalho para que os ex-diretores do banco desviassem dinheiro sem levantar suspeitas. Esse ex-executivos foram intimados pelo BC e deverão ser ouvidos até a sexta-feira.

A corda só estica
Ninguém sabe dizer onde vão parar as fraudes

  • O banco vendia as carteiras de crédito até duas vezes para outras instituições e ainda continuava a contabilizá-las no próprio balanço
para inflar o patrimônio;

  • As autoridades suspeitam que o PanAmericano não fazia os repasses que eram de direito das administradoras de cartões de crédito e maquiavam as faturas de clientes. O esquema teria deixado um rombo de pelo menos R$ 400 milhões;

  • A instituição emitia letras de câmbio que tinham cheques sem fundo já expirados (mais de cinco anos) como garantia. Os títulos serviam para protestar clientes. O estranho era que o protesto sempre ocorria em um cartório no Rio de Janeiro;

  • O PanAmericano pagava 30% de juros a um cliente que aplicava em Certificado de Depósito Bancário (CDB). A remuneração era quase o triplo da média paga pelo mercado. Suspeita-se que o rendimento elevado era uma forma de os executivos desviarem dinheiro do banco. Em um investimento de R$ 400 milhões, o cliente embolsou juros
de R$ 120 milhões;

  • O banco pagava bônus aos executivos sem declarar as quantias para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), contrariando as leis de mercado. Eles ganhavam os benefícios em cima de lucros fictícios;

  • As operações fraudulentas sob investigação do BC podem ter começado há cerca de quatro anos, ou seja, quando o banco vendeu ações em bolsa, em 2007, já estava com o patrimônio inflado artificialmente;

  • A maquiagem contábil no PanAmericano deixou prejuízo de R$ 1,6 bilhão a Silvio Santos, o controlador da instituição. Para evitar uma crise no sistema financeiro, o empresário e apresentador pediu um socorro de R$ 2,5 bilhões ao Fundo Garantidor de Crédito (FGC), o que, a princípio, deixou o PanAmericano com patrimônio positivo de R$ 900 milhões.

Dúvidas persistem
O caos instalado no sistema financeiro pelos executivos do PanAmericano exigem, além de medidas rápidas de contenção de impactos, respostas para a omissão ou cegueira do Banco Central, da Caixa Econômica Federal e das empresas que auditaram as contas do banco. A primeira pergunta ventilada entre os analistas de mercado é como um sistema bancário que sobreviveu à crise de 2008 e era tido como um dos mais seguros do mundo deixou nascer esse monstro?

O Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal estão em busca das justificativas e, dependendo das investigações, serão distribuídos aos envolvidos não somente punições administrativas, mas penais. A Consultoria KPMG e o Banco Fator, que avalizaram as contas da instituição para que a Caixa pagasse
R$ 740 milhões para se tornar sócia de Silvio Santos, estão na lista dos que devem explicação. Também a Deloitte, que auditava o PanAmericano, terá de justificar o porquê de não ter identificado os rombos do banco.

As suspeitas recaem sobre a possibilidade de vista grossa para obter vantagens tanto por parte da Caixa quanto das instituições que fizeram a análise. Mas, até o momento, ninguém foi chamado a depor. O BC também deve justificativas, já que o PanAmericano operava irregularmente há pelo menos quatro anos sem que nenhuma autoridade incomodasse os executivos do banco em suas seguidas fraudes. (VM)