postado em 16/11/2010 08:00
Os executivos do PanAmericano promoveram um verdadeiro festival de irregularidades na instituição controlada por Silvio Santos. Segundo técnicos envolvidos na investigação, quanto mais se reviram as contas, mais problemas aparecem, o que tem tirado o sono do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ainda que, publicamente, ele garanta que ;agiu a tempo e a hora; para evitar respingos no sistema financeiro nacional. Há o temor de que mais bancos de menor porte tenham enveredado pelo mesmo caminho do PanAmericano, mostrando uma saúde que realmente não têm.A última descoberta em relação à instituição de Silvio Santos é que ela emprestava dinheiro sem critério e amarga um índice de calote superior a 12%, quase o dobro do registrado no mercado. No balanço de 30 de junho deste ano, consta R$ 1 bilhão em empréstimos considerados podres ; um dinheiro que foi dado a clientes de altíssimo risco. O objetivo era gerar uma carteira de crédito gigantesca para inflar o patrimônio.
Tanto que, mesmo com a crise financeira que abalou o mundo, a partir de setembro de 2008, o
PanAmericano seguiu a tônica inversa do restante do mercado. Enquanto as instituições menores encolhiam as concessões de empréstimos, a financeira de Silvio Santos ; talvez inspirada pelo bordão do patrão ; ;Quem quer dinheiro?; ; expandiu a liberação de crédito dando capital a quem não podia pagar. ;Esses executivos eram muito criativos, mas para o mal;, lamenta um técnico do sistema financeiro.
Do R$ 1 bilhão dado a consumidores sem perfil adequado, 46,83% estão em atraso há mais de 14 dias ; o equivalente a R$ 470 milhões. O tamanho do buraco, porém, pode ser ainda maior, já que os administradores do banco maquiavam a contabilidade para dar bons resultados ao Grupo Silvio Santos.
Prejuízos
O temor do BC é de que esses créditos podres tenham sido vendidos a outras instituições que agora correm o risco de amargar prejuízo bilionário. Se esses empréstimos arriscados não tiverem sido vendidos à outras instituições, o impacto no sistema financeiro será menor, mas, em contraponto, o PanAmericano pode perder ainda mais valor de mercado ao ser vendido ; o que deve ocorrer rapidamente para que Silvio Santos possa arcar com parte da dívida de R$ 2,5 bilhões que fez com o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) e que impediu a bancarrota de seu braço financeiro. A Caixa Econômica Federal, que tem 49% do capital votante do banco, também trabalha para a venda.
Outra engenharia mirabolante dos executivos do PanAmericano fez o empresário mineiro Adalberto Salgado, de Juiz de Fora (MG), receber incríveis 27% anuais de rentabilidade em uma aplicação de R$ 386 milhões em certificado de depósito bancário (CDB). O resultado obtido pelo empresário ; de quase R$ 120 milhões ao ano ; é praticamente o triplo da remuneração das taxas médias de mercado de 10,75% ao ano. A suspeita é de que a operação era usada como um atalho para que os ex-diretores do banco desviassem dinheiro sem levantar suspeitas. Esse ex-executivos foram intimados pelo BC e deverão ser ouvidos até a sexta-feira.
A corda só estica
Ninguém sabe dizer onde vão parar as fraudes
- O banco vendia as carteiras de crédito até duas vezes para outras instituições e ainda continuava a contabilizá-las no próprio balanço
- As autoridades suspeitam que o PanAmericano não fazia os repasses que eram de direito das administradoras de cartões de crédito e maquiavam as faturas de clientes. O esquema teria deixado um rombo de pelo menos R$ 400 milhões;
- A instituição emitia letras de câmbio que tinham cheques sem fundo já expirados (mais de cinco anos) como garantia. Os títulos serviam para protestar clientes. O estranho era que o protesto sempre ocorria em um cartório no Rio de Janeiro;
- O PanAmericano pagava 30% de juros a um cliente que aplicava em Certificado de Depósito Bancário (CDB). A remuneração era quase o triplo da média paga pelo mercado. Suspeita-se que o rendimento elevado era uma forma de os executivos desviarem dinheiro do banco. Em um investimento de R$ 400 milhões, o cliente embolsou juros
- O banco pagava bônus aos executivos sem declarar as quantias para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), contrariando as leis de mercado. Eles ganhavam os benefícios em cima de lucros fictícios;
- As operações fraudulentas sob investigação do BC podem ter começado há cerca de quatro anos, ou seja, quando o banco vendeu ações em bolsa, em 2007, já estava com o patrimônio inflado artificialmente;
- A maquiagem contábil no PanAmericano deixou prejuízo de R$ 1,6 bilhão a Silvio Santos, o controlador da instituição. Para evitar uma crise no sistema financeiro, o empresário e apresentador pediu um socorro de R$ 2,5 bilhões ao Fundo Garantidor de Crédito (FGC), o que, a princípio, deixou o PanAmericano com patrimônio positivo de R$ 900 milhões.
Dúvidas persistem
O caos instalado no sistema financeiro pelos executivos do PanAmericano exigem, além de medidas rápidas de contenção de impactos, respostas para a omissão ou cegueira do Banco Central, da Caixa Econômica Federal e das empresas que auditaram as contas do banco. A primeira pergunta ventilada entre os analistas de mercado é como um sistema bancário que sobreviveu à crise de 2008 e era tido como um dos mais seguros do mundo deixou nascer esse monstro?
O Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal estão em busca das justificativas e, dependendo das investigações, serão distribuídos aos envolvidos não somente punições administrativas, mas penais. A Consultoria KPMG e o Banco Fator, que avalizaram as contas da instituição para que a Caixa pagasse
R$ 740 milhões para se tornar sócia de Silvio Santos, estão na lista dos que devem explicação. Também a Deloitte, que auditava o PanAmericano, terá de justificar o porquê de não ter identificado os rombos do banco.
As suspeitas recaem sobre a possibilidade de vista grossa para obter vantagens tanto por parte da Caixa quanto das instituições que fizeram a análise. Mas, até o momento, ninguém foi chamado a depor. O BC também deve justificativas, já que o PanAmericano operava irregularmente há pelo menos quatro anos sem que nenhuma autoridade incomodasse os executivos do banco em suas seguidas fraudes. (VM)