postado em 24/11/2010 08:00
Superando as expectativas mais pessimistas do mercado, a inflação neste fim de ano dá sinais de que pode fugir do controle e assusta a presidente eleita, Dilma Rousseff. Prévias divulgadas ontem mostram que o repique de preços em novembro atingiu em cheio classes de consumo vitais para as famílias, o que obrigou bancos e consultorias a revisarem para cima cenários referentes aos próximos meses de dezembro, janeiro e fevereiro. O salto além do esperado pelos analistas joga por terra o discurso de que 2010 está imune a qualquer aperto monetário. É praticamente certo que, já na reunião de 7 e 8 de dezembro, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central terá que aumentar a taxa básica de juros (Selic). A aposta é de alta de pelo menos 0,5 ponto percentual. A taxa básica está em 10,75%. Alimentos e bebidas exerceram forte influência sobre a prévia da inflação oficial medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15). O resultado foi uma taxa de 0,86% ; bem acima dos cálculos dos operadores, que esperavam algo entre 0,66% e 0,77%. No segundo pelotão de itens que registraram elevações acima da média estão vestuário e despesas pessoais. Em outubro, o IPCA-15 ficou em 0,62%. No acumulado do ano, o IPCA-15 está em 5,07% e em 12 meses, em 5,47%.
O Índice de Preços ao Consumidor ; Semanal (IPC-S), medido pela Fundação Getulio Vargas (FGV), também subiu influenciado por comida e artigos têxteis. A taxa referente à quadrissemana encerrada no último dia 22 ficou em 0,85%, acima do indicador passado, que fechou em 0,72%. Transportes e habitação seguiram a mesma tendência de ganho e encerraram o período em alta.
A inflação apurada até agora em novembro assustou os especialistas. ;Este fim de ano vem surpreendendo e esse dado prévio de novembro fez com que alterássemos nossa previsão de IPCA para 2010 de 5,3% para 5,6%;, disse Gian Barbosa, economista da Tendências Consultoria. O centro da meta de inflação para o ano definida pelo BC é 4,5% ; com tolerância de dois pontos percentuais para cima ou para baixo. O Boletim Focus, pesquisa semanal da autoridade monetária com cerca de 100 instituições financeiras, revelou no início da semana que a perspectiva do mercado é que a inflação alcance 5,58% até dezembro. O prognóstico para 2011 é de 5,15%.
Incertezas
Tomando como referência o atual contexto inflacionário e as expectativas futuras, praticamente nenhum analista acredita em melhorias imediatas do cenário. ;Para os próximos meses, não devemos esperar grandes alívios de curto prazo para os índices de preços ao consumidor, bastante influenciados por alimentação, mas também por núcleos em patamares mais elevados. Dessa forma, nossa expectativa para o IPCA em 2010 se encontra em 5,80%;, destacou o relatório de avaliação divulgado ontem pelo Bradesco e assinado pelo diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do banco, Octavio de Barros.
Para o HSBC, que também analisou o resultado da prévia inflacionária, não há elementos que indiquem que o BC elevará os juros imediatamente. O banco ressaltou, no entanto, que a dinâmica da alta de preços deverá, no mínimo, forçar uma alteração do tom da ata da próxima reunião do Comitê de Política Monetária, que tem tudo para ;revelar uma mudança na retórica;, adotando um teor mais belicoso. Já o Santander destacou que o Banco Central precisa estar atento e preocupado com o impacto do choque dos preços atuais sobre a inflação futura.
Cenário explosivo
O ajuste da Selic tem como pano de fundo pressões provocadas pelo forte consumo doméstico e o avanço dos gastos públicos. Essa combinação tem impulsionado ainda mais a demanda e, por tabela, os preços. Os Índices Gerais de Preços (IGPs), que corrigem contratos de aluguéis, mensalidades escolares e tarifas públicas, dispararam desde o início de novembro e são vistos como ;iscas; inflacionárias para 2011.
TESOURO JÁ PAGA A CONTA
Na esteira das projeções cada vez mais negativas para a inflação em 2010 e em 2011, os principais contratos de juros de longo prazo negociados na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM) encerraram o dia de ontem em alta. Títulos com vencimento em janeiro de 2012 fecharam com taxa de 11,83% (contra 11,77% da véspera). A subida dos juros futuros indica que os investidores apostam em uma tendência de elevação da taxa Selic.
Com as expectativas apontando para índices próximos ou iguais ao teto da meta inflacionária estipulada pelo Banco Central (6,5%), o mercado futuro antecipa um possível aumento da Selic na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de dezembro próximo ou, no máximo, no primeiro trimestre de 2011, quando Dilma Rousseff já estará empossada e o BC estará sob o comando de Alexandre Tombini. As apostas são de uma alta total entre 1,5 e 2 pontos percentuais nos juros ao longo do ano que vem, o que empurrará a Selic dos atuais 10,75% ao ano para até 12,75%.
Sucessão
Não é apenas no mercado futuro que os investidores estão prevendo um novo arrocho monetário para conter as expectativas inflacionárias. Bancos e corretoras que compram títulos públicos estão exigindo taxas maiores para financiar a dívida federal. Nas Notas do Tesouro Nacional série B (NTNs-B), com vencimento em 15 de agosto de 2012, o mercado está embutindo projeção de inflação de 6,06% no ano que vem.
;Está todo mundo muito nervoso no mercado. Com certeza, o Tesouro Nacional terá que pagar mais caro para rolar a dívida pública. Os investidores exigirão prêmios cada vez maiores para carregar os papéis;, disse um analista de um grande banco estrangeiro. Para ele, o pessimismo só se reverterá quando os investidores tiverem a certeza de que a substituição de Henrique Meirelles por Tombini à frente do BC não implicará em mudanças na política monetária nem em leniência com a inflação.(LP)
PESO NO BOLSO
Brasileiros verão os preços dispararem às vésperas de o novo governo tomar posse
IPC-S - (Em %)
Alimentação - 1,98
Habitação - 0,30
Vestuário - 1
Saúde e cuidados pessoais - 0,23
Educação, leitura e recreação - 0,20
Transportes - 0,68
Despesas diversas - 0,25
IPC-S - 0,85
IPCA-15 - (Em %)
Alimentação e bebidas - 2,11
Habitação - 0,58
Artigos de residência - 0,21
Vestuário - 1,17
Transporte - 0,47
Saúde e cuidados pessoais - 0,24
Despesas pessoais - 0,75
Educação - 0,02
Comunicação - 0,43
IPCA-15 - 0,86
Fontes: IBGE, FGV, Bradesco e Concórdia