postado em 21/12/2010 08:00
Estudos realizados por analistas de mercado mostram que, em 2010, as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) estiveram mais atreladas aos interesses do presidente da instituição, Henrique Meirelles, do que a aspectos técnicos. Mesmo com todos os índices de inflação disparando e com as expectativas do mercado se deteriorando, o Copom manteve a taxa básica de juros (Selic) em 8,75% ao ano em sua reunião de março, quando Meirelles ainda acalentava o sonho de ser o candidato a vice na chapa presidencial liderada pela petista Dilma Rousseff. Assim que foi descartado, patrocinou uma paulada nos juros de 0,75 ponto em abril.Mas como Meirelles acalentava uma vaga no governo de Dilma Rousseff, caso eleita, o Copom interrompeu, de forma abrupta, a alta dos juros aos primeiros sinais de retração da produção industrial. Passou, a partir daí, a dar sinais erráticos ao mercado, inclusive considerando a inflação corrente (do mês) em vez das projeções futuras (prospectivas), como sempre indicou aos analistas. Na última reunião deste ano, com a inflação em disparada, o Copom preferiu manter a Selic em 10,75%. Meirelles, como se sabe, esperava continuar à frente do BC no governo Dilma ou comandar um ministério. Mais uma vez, foi preterido. Sem argumentos sólidos para a sua decisão, o Comitê optou por uma linguagem ambígua na ata em que explicou a estabilidade dos juros.
;Meirelles fala tanto em autonomia do Copom, mas, neste ano, especificamente, conduziu as ações do Comitê de acordo com os seus interesses políticos;, disse um dos mais importantes assessores do ministro da Fazenda, Guido Mantega. ;O que mais impressiona é que, nos últimos dias, o presidente do BC tratou de difundir a imagem de que foi um herói, que resistiu a todas as pressões políticas para manter a autonomia do Copom. Só não livrou o Comitê de seus próprios interesses;, acrescentou.
Conveniência
Entre os analistas, a visão é a mesma. ;É difícil deixar de dizer que a atuação do BC foi política em 2010;, afirmou Eduardo Otero, sócio da Progredir Investimentos. ;Por causa dessa posição política, a instituição foi obrigada a rever suas decisões. Foi o que se viu de março para abril, quando a Selic passou de 8,75% para 9,50%;, frisou. ;Não sei se foi política a condução da política monetária. Mas a estratégia não foi eficiente. A comunicação do BC foi falha;, constatou Flávio Serrano, economista do Espírito Santo Investment Bank. ;Nos últimos anos, não houve tanto ruído. Em uma ou outra reunião, tudo bem. Mas igual a este ano eu nunca vi;, emendou.
Tanto foi assim que, enquanto o BC descrevia cenários leves e benignos para a inflação, o mercado piorara as suas expectativas para os preços. No Boletim
Focus, divulgado ontem pela instituição, os mais de 100 especialistas ouvidos apostaram, pela 14; vez seguida, que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fecharás 2010 perto do teto da meta, hoje em 6,5%. A mediana das projeções chegou a 5,88%. Durante mais de três meses, a autoridade monetária insistiu que a inflação convergiria para o centro da meta. Apenas na última ata do Copom, divulgada na semana passada, o BC admitiu que havia se enganado.
Juros inibem Tesouro
Gabriel Caprioli
A certeza do mercado de que o Banco Central (BC) terá que elevar a taxa básica de juros (Selic) no início do ano para conter a inflação levou o Tesouro Nacional a reduzir a oferta de títulos do governo no mês passado. Em novembro, a emissão de papéis em leilões públicos somou R$ 19,4 bilhões, menor volume desde maio, quando foram vendidos R$ 13,4 bilhões. A atuação mais tímida foi uma resposta da instituição ao aumento dos juros médios cobrados pelos investidores como remuneração pela compra dos ativos.
A cobrança de um ;prêmio maior;, como o movimento é conhecido no jargão do mercado, ocorre porque a expectativa de aumento na taxa básica eleva os juros de contratos futuros, embutidos nos Depósitos Interfinanceiros (DI). É sobre esse referencial que são calculados os preços de títulos do governo. Em 4 de novembro, a taxa do leilão de Letras do Tesouro Nacional (LTN) com vencimento em 2013 foi de 11,84%. Na última operação do mês, dia 25, os investidores exigiram encargos de 12,34% pelo mesmo papel.
De acordo com o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Fernando Garrido, diante da pressão feita pelos investidores por taxas mais altas, o Tesouro resolveu recusar algumas ofertas e vender menos papéis. ;O Tesouro mantém a estratégia de atuar de forma mais conservadora (emitindo menos) em momentos de maior adversidade;, disse. Como arma, a instituição utiliza seu caixa, que suporta, segundo Garrido, até seis meses de vencimentos com pouca necessidade de rolagem da dívida.
Apesar de baixo, o volume de emissões de papéis em novembro superou os vencimentos, ampliando o endividamento do governo em 1,3% e chegando à soma de R$ 1,66 trilhão. O valor ainda está dentro do limite previsto para o avanço da dívida no ano, que vai de R$ 1,60 trilhão a R$ 1,73 trilhão.
Parada técnica
A fatia desse bolo na mão de estrangeiros se manteve no mesmo nível, em termos nominais, no mês passado (R$ 155,3 bilhões), mas caiu pela segunda vez consecutiva em proporção ao total da dívida. Em outubro, 10,19% dos papéis brasileiros eram detidos por investidores não residentes. Em novembro, esse percentual baixou para 10,03%.
A falta de apetite foi causada, na avaliação do Tesouro, pelo aumento da alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 4% para 6%, cobrada na entrada de capital estrangeiro no país. ;Depois do aumento do IOF, os investidores entraram numa espécie de parada técnica;, avaliou Garrido. Para ele, o movimento não é permanente. ;Considerando os indicadores macroeconômicos, o Brasil continua sendo muito atraente para os aplicadores de médio e longo prazo. Em algum momento, eles devem voltar ao mercado.;