postado em 06/01/2011 08:00
Diante da enorme pressão do setor produtivo, reproduzida no governo pelo ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, a presidente Dilma Rousseff bateu ontem o martelo e o Banco Central deverá anunciar, ainda hoje, mais medidas para conter a supervalorização do real frente ao dólar. A decisão de agir agora, antes que o derretimento da moeda norte-americana provoque mais estragos nas contas externas do país, reduzindo as exportações, foi fechada em uma longa reunião de Dilma com o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Uma das possíveis ações listadas pelo governo é o controle na entrada e na saída de recursos estrangeiros do país, a chamada quarentena.Antes de dar o aval para as medidas na área cambial, Dilma conversou com o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci. O intuito foi evitar ;loucuras; que possam, mais à frente, trazer danos maiores à economia do que os ganhos de curto prazo. Palocci é visto como referência pelos investidores, tanto no país quanto no exterior. Também ficou acertado que todas as ações terão caráter temporário, até que a guerra cambial que atormenta o mundo se amenize. ;O governo fará correções de rota, como fez o Chile nesta semana, ao anunciar uma forte intervenção no mercado de câmbio para conter o excesso de valorização do peso;, disse um dos assessores mais próximos de Dilma.
Segundo ele, o Palácio do Planalto considerou positivo o comportamento do dólar ontem, que encerrou as negociações em alta de 0,66%, a segunda seguida, cotado a R$ 1,675. ;Mas sabemos que é pouco, pois, abaixo de R$ 1,70, as nossas exportações ficam muito prejudicadas, o setor produtivo perde;, destacou o mesmo assessor. Para ele, não deverá haver surpresas no mercado, se confirmada uma intervenção mais pesada no câmbio, como o controle do fluxo de capitais. Esse tipo de medida já foi avalizado pelo G-20, o grupo que inclui as 19 nações mais ricas do mundo e a União Europeia.
Juros altos
A avaliação dentro do governo é de que as ações já tomadas pelo Ministério da Fazenda, como o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para 6%, incidente sobre os dólares que circulam no país, e a forte presença do BC comprando as sobras de recursos ; foram US$ 41,4 bilhões somente em 2010 ; evitaram que a cotação da moeda norte-americana caísse para R$ 1,50. ;Mas, diante da guerra cambial que existe no mundo, com cada país desvalorizando a sua moeda para ganhar espaço no comércio internacional, o Brasil precisa ser mais incisivo;, destacou um técnico da Fazenda.
Há, ainda, a possibilidade de o BC agir para reduzir as apostas dos bancos e dos estrangeiros na queda do dólar. Essas apostas são feitas nos mercados futuro e à vista de câmbio e passam de US$ 15 bilhões. ;Não duvidem se o BC exigir mais capital do sistema financeiro para bancar tais operações. Já se aumentou o IOF nas transações fechadas na BM, mas a guerra contra o dólar continua elevadíssima;, frisou um assessor do Planalto.
Ele lembrou que o governo brasileiro sabe que, mesmo mais duras, as intervenções do câmbio dependem do contexto mundial para ter efeitos mais rápidos. Não à toa, é grande a torcida para que a economia dos Estados Unidos recupere o fôlego logo. Assim, o Federal Reserve (Fed), o BC norte-americano, poderá aumentar as taxas de juros, que hoje estão próximas de zero, voltando a atrair capitais para aquele país.
As economias emergentes, entre elas o Brasil, têm recebido muito investimento especulativo devido ao diferencial de juros ; a taxa básica brasileira, por sinal, deverá passar de 10,75% para 11,25% no próximo 19 de janeiro, para tentar conter a inflação. Os investidores pegam dinheiro emprestado nas economias ricas, onde os juros são baixíssimos, e aplicam no Brasil, ganhando duas vezes: primeiro, com as taxas elevadas; segundo, quando retiram o dinheiro do país se aproveitam das cotações mais baixas do que quando entraram. ;O governo não pode ficar impassível, inerte, em relação a essa situação. O momento de agir é agora;, disse um funcionário do BC. ;Nesse contexto, é importante que o Ministério da Fazenda também contenha os gastos, para que a inflação caia e o BC possa voltar a reduzir a taxa Selic;, complementou.
EUA e China discutem moeda
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, discutirá questões econômicas globais e a valorização da moeda chinesa com o presidente da China, Hu Jintao, em Washington. ;A China tem um papel extremamente importante na economia global e deve tomar medidas para reequilibrar a sua divisa. O presidente continuará reiterando isso durante a visita do presidente Hu Jintao;, disse o porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs.
A conversa entre os líderes dos dois países que protagonizam a guerra cambial está marcada para o fim deste mês.
Compras de US$ 41,4 bi
O Banco Central atuou agressivamente para conter o derretimento do dólar em 2010. Comprou os US$ 24,3 bilhões que ingressaram no país e mais US$ 17,1 bilhões de instituições financeiras. Ao todo, retirou US$ 41,4 bilhões de circulação do mercado ; volume 72% superior às aquisições de 2009. Apesar de todo o esforço, a empreitada não teve sucesso: a moeda norte-americana encerrou o ano passado com desvalorização de 4,4%, cotada a R$ 1,666, o que evidenciou a dificuldade do governo de encontrar defesa em meio à guerra cambial. A preocupação da presidente Dilma Rousseff é tanta que Alexandre Tombini mal assumiu o comando da política monetária e está realizando dois leilões de compras diários para reduzir a liquidez do mercado.
Com as aquisições do BC no ano passado, as reservas internacionais do país alcançaram US$ 288,5 bilhões ; volume 20,9% maior do que o verificado no fim de 2009. ;Em termos anuais, foi a atuação mais forte que já houve;, afirmou Silvio Campos Neto, economista-chefe do Banco Schahin. ;O BC está fazendo o papel que lhe é esperado. Atua nos momentos certos para enxugar o excesso de dólares em circulação no mercado. A moeda em curso no Brasil é o real;, ponderou Jankiel Santos, economista-chefe do Espírito Santo Investiment Bank.
Em todo o governo Luiz Inácio Lula da Silva, US$ 202,7 bilhões ingressaram no país. Na gestão de Fernando Henrique Cardoso a situação foi inversa: houve fuga de US$ 26,2 bilhões. Na avaliação de especialistas, de lá para cá, o Brasil tornou-se uma economia sólida, estável e, depois da crise financeira mundial de 2008 ; que ainda exerce efeitos negativos sobre economias maduras ;, transformou-se em um local de boas oportunidades para investimentos e ganhos.
De todos os recursos que ingressaram no Brasil em 2010, a maioria veio pelo setor financeiro. A diferença entre as remessas para o exterior e a entrada de recursos deixou um saldo de US$ 26 bilhões ; maior cifra desde 1982, quando o autoridade monetária passou a levantar esses dados. ;Esses recursos só dão respaldo para as perspectivas positivas de uma dinâmica favorável para a economia brasileira;, avaliou Santos. (VM)